Correio braziliense, n. 19352, 20/05/2016. Brasil, p. 5

STF suspende pílula do câncer

Eduardo Militão

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem suspender a lei que autorizou o uso da polêmica “pílula do câncer”. A Lei 13.269/2016, aprovada pelo Congresso e sancionada pela presidente suspensa Dilma Rousseff, permitiu o uso da fosfoetanolamina sintética pelos pacientes, mas foi criticada por entidades médicas, que sustentam que não há evidências científicas de sua eficácia no tratamento. A decisão foi tomada de maneira temporária, e será analisada pelo plenário em outra ocasião, mas não há previsão de julgamento.

Seis ministros concordaram com o argumento da Associação Médica Brasileira (AMB), que ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade na Corte, por entender que não há garantias da ausência de riscos aos usuários do medicamento. Existe um problema adicional para o relator, Marco Aurélio Mello, e para Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowsk, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Teori Zavascki. Eles entenderam que a ação do Congresso desrespeitou a área de atuação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que foi contra a liberação do medicamento antes dos testes.

De acordo com o criador da “fosfo”, o químico aposentado da Universidade de São Paulo (USP) Gilberto Chierice, a pílula não mata as células cancerígenas, apenas as destaca entre as outras no corpo humano. Identificadas, elas passam a ser atacadas pelo sistema imunológico do próprio corpo. Ele diz que a quimioterapia pode atrapalhar o tratamento. “Se você detona o sistema imunológico da pessoa, os resultados não são bons, porque a ação da fosfo necessita que o sistema imunológico esteja intacto”, disse ele entrevista em agosto do ano passado. “Se existir uma quimioterapia que não destrua o sistema imunológico, perfeito, pode ser combinado.”

 

“Enganadas”

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio Mello destacou a ausência de testes científicos para garantir a eficácia e segurança do remédio. “A pesquisa científica é a garantia de que as pessoas não serão enganadas com medicamentos pouco ou nada eficazes”, afirmou o relator. Ele ainda disse que não caberia ao Congresso aprovar uma lei para viabilizar a distribuição de pílulas.

Barroso disse que a lei “transmite aos cidadãos brasileiros a mensagem de que o Estado endossa e incentiva” o uso da fosfoetanolamina. O ministro comentou que pacientes podem ficar expostos a “tratamentos que causem danos” ou que lhes causem “ilusão”. “O que se busca é garantir que as expectativas de melhora com o uso de substâncias medicamentais sejam fundadas em evidências científicas e clínicas, sem expor os pacientes a maiores riscos de danos à saúde ou a tratamentos inócuos”, afirmou o ministro.

O ministro Teori disse que os congressistas assumiram uma posição de administradores e integrantes do Executivo ao criarem a lei. A ministra Rosa Weber destacou a importância do julgamento. “Eu me senti sensibilizada por essa questão que, em última análise, em certos casos, é retirar a última esperança de quem tem tão pouca esperança”, avaliou. Ela chegou a pensar em pedir vista do caso, mas votou para que só os pacientes terminais pudessem tomar a pílula do câncer.

 

Frase

"O que se busca é garantir que as expectativas de melhora com o uso de substâncias medicamentais sejam fundadas em evidências científicas e clínicas, sem expor os pacientes a maiores riscos de danos à saúde ou a tratamentos inócuos”

 

Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo