O Estado de São Paulo, n. 44758, 03/05/2016. Política, p. A9

Procurador vê 'contabilidade destrutiva'

Isabela Bonfim

Luísa Martins

Em sessão dedicada a ouvir convidados da oposição, especialistas defenderam a ilegalidade das ações fiscais autorizadas pela presidente Dilma Rousseff na Comissão Especial do impeachment no Senado. Nome mais aguardado do dia, o procurador Júlio Marcelo de Oliveira acusou a presidente de fazer “contabilidade destrutiva”. Ele também adiantou que defenderá que o Ministério Público recomende ao Tribunal de Contas da União (TCU) a rejeição das contas da presidente de 2015.

Oliveira é procurador do Ministério Público no TCU e foi o responsável pelo parecer técnico que denunciou as chamadas pedaladas fiscais e créditos suplementares, base do pedido de impeachment de Dilma.

“Todo esse ambiente é resultado de contabilidade destrutiva e de fraudes fiscais. Em matéria de conta pública, criatividade é nome para fraude, é contabilidade destrutiva. Pedaladas fiscais são expressões de eufemismo, práticas gravíssimas e outras nem tão graves na vala comum, como se fossem a mesma coisa. Fatos graves que ocorreram na Nação nos últimos anos”, afirmou.

Em sua explanação, Oliveira apresentou um relato de como os créditos suplementares e pedaladas se combinam para, primeiro tornar o orçamento mais livre e, depois, para conseguir a verba necessária para executar mais gastos. Ele acusou o governo de fraudar o decreto de contingenciamento, ao ignorar dados oficiais que mostravam que a meta fiscal não poderia ser cumprida, e, em seguida, desviar dinheiro que deveria ser pago aos bancos públicos. O objetivo seria a reeleição da presidente.

“Para manter o gasto público elevado, o governo frauda o decreto de contingenciamento. O orçamento ficou mais livre para realizar um nível de despesa maior. Mas não bastava, era preciso ter dinheiro para executar essa despesa. E o dinheiro vem exatamente do uso dos bancos públicos”, disse.

 

Parecer. Oliveira também afirmou que vai recomendar, novamente, por meio de parecer técnico do Ministério Público de Contas, que o TCU rejeite as contas de Dilma de 2015. De acordo com ele, o governo manteve as práticas fiscais que foram condenadas pelo tribunal na análise das contas de 2014. O ministro do TCU José Múcio Monteiro pretende marcar para 15 de junho a apreciação das contas do ano passado do governo federal.

O Ministério Público de Contas tem o poder de denunciar práticas fiscais que considere irregulares ao TCU. Mas somente o tribunal pode apresentar e votar um parecer para ser enviado ao Congresso. No ano passado, a corte enviou parecer pela reprovação das contas de 2014 após decisão unânime dos ministros.

Além de Oliveira, também participaram da audiência o professor de direito José Maurício Conti, da Universidade de São Paulo (USP), e o presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado (IIEDE), Fábio Medina Osório.

Conti defendeu que o governo editou créditos suplementares de maneira ilegal. Em sua opinião, mesmo que o governo tenha conseguido alterar a meta fiscal em dezembro de 2015, os créditos foram abertos nos meses de julho e agosto. Para ele, a legalidade da ação deve ser analisada com base no momento da edição dos decretos e não pelo resultado final de 2015.

Já o professor Osório fez breve explanação pedindo que o Senado não ceda ao “discurso do golpe”. “O surrado discurso do golpe não deve ser acolhido. A má gestão pública de um governante pode ser valorada por Vossas Excelências”, disse diretamente aos senadores, em referência aos argumentos dos apoiadores de Dilma Rousseff e da própria presidente, que também acusa que há um golpe em curso.

Entre outros argumentos, os governistas questionaram que as práticas fiscais denunciadas pelos convidados não foram realizadas em 2015, período de análise do processo de impeachment, e voltaram a pedir a limitação do objeto de análise do processo. Na sessão de hoje a comissão ouvirá convidados da defesa.

 

Resultado

“Todo esse ambiente é resultado de contabilidade destrutiva e de fraudes fiscais. Em matéria de conta pública, criatividade é nome para fraude, é contabilidade destrutiva”

Júlio Marcelo de Oliveira

 

PROCURADOR DO TCU