O globo, n. 30231, 14/05/2016. País, p. 3

Menos quatro mil cargos

Por: Catarina Alencastro/ Fernanda Krakovics/ Eduardo Barretto
 
 
CATARINA ALENCASTRO, FERNANDA KRAKOVICS
E EDUARDO BARRETTO
opais@oglobo.com.br
 
-BRASÍLIA- Na tentativa de sinalizar o compromisso do governo Michel Temer com a redução do gasto público, o ministro do Planejamento, Romero Jucá, anunciou ontem, após a primeira reunião ministerial, a meta de cortar, até fim do ano, quatro mil cargos comissionados, que são preenchidos sem concurso público. O Executivo federal tem 21.446 comissionados. Os ministros também foram orientados pelo presidente interino a preencher no máximo 75% dessas vagas nas pastas. A nova gestão não soube informar qual será o impacto dessas medidas nas contas públicas.

— Queremos em 31 de dezembro de 2016 ter diminuído 4 mil postos desse tipo de gratificação ou contratação. Isso representa o dobro do que o governo anterior havia anunciado e não havia cumprido. Haverá um esforço dos ministros de dar o exemplo. Isso não resolve a questão do gasto público e da meta de déficit, mas é um posicionamento que o governo deve tomar como exemplo para a sociedade — disse Jucá, em entrevista ao lado de Eliseu Padilha (Casa Civil) e Ricardo Barros (Saúde).

O ministro do Planejamento afirmou ainda que projetos de lei para reajuste salarial de servidores públicos encaminhados ao Congresso pelo governo anterior, e que já tramitam em regime de urgência, serão mantidos. Já propostas de aumento encaminhadas pela gestão Dilma Rousseff dias antes de seu afastamento ainda serão analisadas pela nova equipe econômica.

 

“SOB PENA DE NÃO HAVER COMO PAGAR SALÁRIOS”

Pelas palavras de Eliseu Padilha, o governo já admite que o pagamento da folha pode ficar comprometido se não houver redução de gastos públicos ainda este ano.

— Nós vivemos a maior crise econômica da História do Brasil. Portanto, nós temos que ter medidas que correspondam a isso. E o partido que estivesse hoje no governo ou a ideologia que hoje tivesse que orientar o governo teria que tomar essas medidas, sob pena de, até o final do ano, não haver condições de pagar salários — disse Padilha, em tom ameaçador.

O ministro da Casa Civil lembrou a todos os ministros que Temer, neste momento, considera sua gestão como provisória e que é preciso estar atento a isso. Mas disse acreditar que o governo Temer será efetivado ao fim do processo de impeachment — que ainda será julgado pelo Senado, em até 180 dias.

— Temos de ter consciência de que este é o único caminho que vai fazer com que o Estado brasileiro possa voltar a ser o de sempre. Temos a convicção de que faremos um trabalho que vai nos assegurar que o governo, que é provisório, tornese definitivo antes dos 180 dias — disse Padilha.

Jucá também disse que o modelo econômico será “menos ideológico”, em contraposição à política da presidente afastada Dilma Rousseff e à dos 13 anos do PT na Presidência. Ele citou, entre as medidas, a unificação do ICMS dos estados (projeto que tramita no Congresso) e a adoção de parcerias público-privadas.

Já Padilha disse que a votação do impeachment na Câmara e no Senado, com mais de dois terços dos votos em ambos os casos, é demonstração teórica de que o novo governo tem apoio necessário no Congresso para aprovar medidas.

— Existe uma série de ações para a consolidação de novo modelo econômico, mais equilibrado, mais testável, menos ideológico, menos intervencionista e menos centralizador — disse Jucá.

 

BENEFÍCIOS DUPLICADOS SERÃO ELIMINADOS

Sobre os programas sociais, Jucá afirmou que alguns deles estão funcionando mal, e que serão feitos cruzamentos e análises para acabar com eventuais desvios que tenham ocorrido. Segundo ele, a ideia é eliminar recebimentos duplicados de benefícios. Ele citou Bolsa Família, Pronatec, ProUni e Minha Casa Minha Vida como programas que apresentam resultado e que, portanto, serão mantidos.

Na primeira reunião ministerial, Temer pediu aos seus ministros que façam levantamentos dos programas com verbas no Orçamento e levem, já na próxima semana, os dados para os ministérios do Planejamento e da Fazenda. A ordem é priorizar tudo que seja possível entregar o mais rapidamente possível, além de terminar obras e demais ações que estejam em estágio avançado de execução. O presidente deixou claro, no encontro, que não importa o fato de serem programas do governo anterior.

Temer destacou a necessidade de cumprir acordos com o Congresso, especialmente pelas batalhas que terá de enfrentar também na sociedade para aprovar as reformas e medidas impopulares. A dificuldade de comunicação e a de articulação política foram alguns dos maiores problemas de Dilma com a base no Congresso. Isso vale para os acertos com pleitos de outros setores da economia e da sociedade.

Com estilo diferente do de Dilma, Temer fez um pedido: que todos deem atenção especial aos parlamentares. Que os recebam, ouçam, e cuidem para que se sintam atendidos. A erosão do apoio parlamentar de Dilma passou justamente pela falta de cuidado com que ela tratou os políticos, e esse erro, Temer não quer cometer, como disse um participante da reunião:

— Temos que dar o exemplo. Não podemos continuar a não dar respostas.

Sobre a recuperação de setores da economia contaminados pela crise, Temer chamou a atenção especialmente para a necessidade de dar atenção ao agronegócio e à agricultura familiar. O maior gargalo é a infraestrutura, área à qual o governo interino também quer dar atenção.

— Temos que estar atentos e cuidar bem do setor agrícola para que ele não entre em crise como os demais setores — alertou Temer. (Colaboraram Júnia Gama e Simone Iglesias).