Valor econômico, v. 17, n. 4002, 11/05/2016. Política, p. A10

Ex-líder do governo, Delcídio perde mandato no Senado por 74 a zero

Por: Cristiane Agostine / Fábio Pupo / Vandson Lima

 

Ex-líder do governo Dilma Rousseff, o senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS) teve seu mandato cassado ontem pelo plenário do Senado por 74 votos a favor e nenhum contra, sob a acusação de quebra de decoro parlamentar. Houve uma abstenção, dosenador João Alberto (PMDB-MA), presidente do Conselho de Ética. Para a cassação ser aprovada, era preciso o voto de 41 senadores.

Delcídio ficará inelegível por oito anos, contados a partir do fim do mandato do senador, em 2019.

Os senadores Maria do Carmo Alves (DEM-SE), Eduardo Braga (PMDB-AM), Rose de Freitas (PMDB-ES) e Jader Barbalho (PMDB-PA) não votaram, nem Delcídio. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não precisou votar porque não houve empate.

Delcídio não participou da sessão, nem mandou um advogado para representá-lo. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), designou o diretor da Consultoria Legislativa Danilo Aguiar para ler um documento enviado pelo senador, com a alegação de que o amplo direito de defesa não foi respeitado. O processo começou em dezembro, quando o Rede Sustentabilidade e o PPS apresentaram no Conselho de Ética uma representação acusando a quebra de decoro, depois que Delcídio havia sido preso, sob acusação de atrapalhar a Operação Lava-Jato. O pedido foi aprovado em março pelo Conselho de Ética.

Renan articulou para que o processo fosse julgado antes da votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff, que começará hoje.

Delcídio ficou preso por dois meses, entre novembro e fevereiro, depois que uma conversa sua com Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró foi gravada e entregue à Justiça. No diálogo com Bernardo, o senador oferecia ajuda à família e traçou um plano de fuga para Nestor Cerveró para evitar a delação premiada dele. Depois da prisão, Delcídio admitiu envolvimento no "petrolão" e fechou acordo de delação premiada.

Ex-petista, o senador estava em seu segundo mandato e era um dos principais interlocutores da bancada petista com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com quem mantinha diálogos frequentes. Delcídio também tinha um bom relacionamento com Dilma e foi escolhido no início de 2015 como líder do governo no Senado, posição que ocupou até ser preso, em novembro.

O parlamentar participou do governo Itamar Franco como ministro de Minas e Energia e na gestão Fernando Henrique Cardoso assumiu a diretoria de gás e energia da Petrobras, trabalhando junto com Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa, delatores da Operação Lava-Jato. Delcídio filiou-se ao PT em 2001 com apoio de Zeca do PT, que governava o Mato Grosso no Sul.

No Senado desde 2003, ganhou projeção ao presidir a CPMI dos Correios em 2005, que apurou o mensalão. Ao mesmo tempo, passou a ser visto com desconfiança por petistas. Em 2006 e 2014 disputou o governo de Mato Grosso do Sul.

Em março deste ano, depois de ser libertado e assinar o acordo de delação premiada, deixou o PT, em meio a críticas ao partido.

Delcídio é o terceiro senador cassado por seus pares em toda a história. Em 2000, Luiz Estevão, então filiado ao PMDB, perdeu o mandato, por 52 votos, acusado de mentir sobre seu envolvimento no desvio de verba federal destinada à construção do prédio do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. Em 2012, Demostenes Torres, ex-filiado ao DEM, foi cassado por 56 votos por atuar em favor do contraventor Carlos Augusto Ramos.

Senadores relacionados:

Órgãos relacionados:

_______________________________________________________________________________________________________

Cassação afeta processo que envolve Lula

Por: Letícia Casado

 

A cassação do mandato de senador de Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) deve mandar uma das investigações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva direto para as mãos do juiz Sergio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato no Paraná. A perda da prerrogativa de foro deve tirar a denúncia contra Delcídio e Lula do âmbito do Supremo Tribunal Federal.

Lula foi incluído em denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da República em dezembro contra Delcídio. De acordo com os investigadores, eles organizaram esquema para comprar o silêncio do ex-diretor de Internacional da Petrobras e evitar com que ele fizesse acordo de delação premiada - o que, se comprovado, caracteriza crime de embaraço à investigação.

Essas tentativas incluíram, segundo a Lava-Jato, pagamentos à família de Cerveró. A PGR denunciou o banqueiro André Esteves como o financiador do esquema. Cerveró fez acordo e, depois, Delcídio também virou delator. O agora ex-senador acusou Lula como mandante do esquema e disse que o pecuarista José Carlos Bumlai e seu filho Maurício financiaram os pagamentos a Cerveró. Todos negam as acusações.

Esse processo deve ser remetido à primeira instância, uma vez que quem "segura o foro" no STF é Delcídio por causa de seu mandato. Mas, no momento em que ele perde o foro privilegiado, a denúncia deixa de pertencer ao Supremo. Não há outros denunciados com foro privilegiado nessa denúncia.

Investigadores da Lava-Jato disseram ao Valor que a expectativa é que a denúncia contra Lula vá para a primeira instância nas próximas semanas. A denúncia ainda precisa ser analisada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no STF, ou pelo juiz da primeira instância para que os acusados passem à condição de réus. Os investigadores dizem que a tendência é que o caso fique mesmo com Moro, já que envolve diretamente a Petrobras e o ex-diretor Cerveró.

Teori poderá decidir monocraticamente e enviar a investigação para a primeira instância ou pedir parecer ao MPF.

Delcídio é alvo de ao menos outros dois inquéritos no STF no âmbito da Lava-Jato. Todos correm em segredo de Justiça. Um dos inquéritos inclui presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) e o senador Jader Barbalho (PMBD-PA). O outro é para investigar fatos que abrangem apenas Delcídio e, portanto, também deve ser remetidos à primeira instância.

Senadores relacionados:

Órgãos relacionados: