O Estado de São Paulo, n. 44762, 07/05/2016. Política, p. A10

'Vou ficar aqui lutando', afirma Dilma

Gilberto Amendola 

Em visita às obras da segunda estação de bombeamento do Eixo Norte da integração do Rio São Francisco, no município de Cabrobó (PE), a presidente Dilma Rousseff disse que o impeachment é uma forma disfarçada de eleição indireta. “Quem vai votar na redução ou na perda dos direitos? Esse é um golpe contra a democracia e os direitos sociais”, falou a presidente.

Perto do mítico Rio São Francisco, Dilma voltou a garantir que não renuncia. “Eles sempre quiseram que eu renunciasse. Vocês sabem por quê? Porque eles querem esconder tudo embaixo do tapete. Eu não vou para baixo do tapete. Eu vou ficar aqui lutando”, afirmou.

O discurso teve como tema principal os programas sociais do governo e as ameaças que eles estariam sofrendo num eventual governo Temer. “Eles dizem que querem focar nos 5% mais pobres da população, porque acham que a crise tem de ser enfrentada cortando os programas sociais. Ora, hoje o Bolsa Família atende 47 milhões de pessoas. Os 5% de que eles falam são apenas 10 milhões. Os outros que se virem”, calculou.

Dilma voltou a repetir que o impeachment é golpe porque ela não teria cometido crime de responsabilidade: “Não sou eu que tenho contas no exterior, não sou eu que estou sendo acusada de receber propinas”.

 

Origem. Sobre a obras de transposição, Dilma afirmou que vai ficar “de coração partido” se não estiver na região quando a água começar a correr nas torneiras. “As obras do São Francisco estão sendo propostas desde o tempo de D.Pedro II. Mas por que só agora decidiram fazer? Simples, um governo é feito de escolhas, e nós escolhemos fazer a integração do São Francisco. Escolhemos porque fomos eleitos com o voto de vocês e temos compromisso com o povo desse País”, disse, lembrando a origem nordestina e humilde do ex-presidente Lula.

O discurso foi acompanhado por centenas de agricultores - muitos foram trazidos ao evento com a ajuda de sindicatos e movimentos socias. “Essa obra é muito importante para a agricultura. Ela está mudando a nossa vida”, disse Silvaneide Costa, 46 anos.

Sobre o impeachment da presidente, agricultores demostraram receio de que o projeto do São Francisco seja interrompido. “Você confia nesse Temer? Eu é que não, meu filho”, falou Lucimar Davi Silva, 54 anos.

Se Dilma foi recebida com festa, o mesmo não se pode dizer de políticos locais, como os governadores da Paraíba, Ricardo Coutinho, e o do Ceará, Camilo Santana, que foram vaiados. A ausência mais comentada foi a do governador de Pernambuco, Paulo Câmara, tratado por muitos ali como responsável por diversos votos de deputados da bancada pernambucana favoráveis ao impeachment.

A transposição é a maior obra de infraestrutura hídrica do País. Ela se estende por 477 km em seus dois eixos (norte e leste). A estimativa do governo é de que o projeto traga segurança hídrica para aproximadamente 12 milhões de pessoas de 390 municípios dos Estados de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba.

 

Atraso. O projeto, iniciado em 2007, já consumiu cerca de R$ 8,2 bilhões, praticamente o dobro da previsão inicial. Mesmo com atraso, a transposição é considerada um marco na gestão petista na região.

Em abril, o projeto alcançou 86% de avanço físico e, de acordo com o cronograma oficial, deve ser 100% entregue ainda este ano. Dos 27 reservatórios, 15 foram concluídos e estão aptos a receber a água do rio.

 

Antes da viagem ao Nordeste, e no dia da votação do relatório de impeachment na comissão do Senado, Dilma aproveitou cerimônia no Palácio do Planalto, para atacar o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o Michel Temer. “Não vamos nos iludir. Todos aqueles que são beneficiários desse processo, como, por exemplo, aqueles que estão usurpando o poder, infelizmente o vice-presidente da República, são cúmplices de um processo extremamente grave”, disse./ COLABORARAM CARLA ARAÚJO E TÂNIA MONTEIRO