O Estado de São Paulo, n. 44765, 10/05/2016. Política, p. A8

Governo vai ao STF para ganhar tempo

Vera Rosa

Tânia Monteiro

Gustavo Aguiar

A estratégia do Palácio do Planalto é ganhar tempo, mesmo sabendo da extrema dificuldade para reverter o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Antes de o presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), ter decido revogar a decisão tomada por ele na manhã de ontem, em que anulou a sessão em que a Casa aprovou a abertura do processo, o governo planejava recorrer ao Supremo Tribunal Federal para pedir que Renan Calheiros (PMDB-AL), no comando do Senado, interrompesse a tramitação naquela Casa.

Em cerimônia de criação de universidades, ontem, Dilma foi informada da decisão de Maranhão de suspender a sessão da Câmara do dia 17 de abril, que aprovou o impeachment. A presidente soltou uma gargalhada e pediu calma aos manifestantes, que, no Salão Nobre, gritavam “Não vai ter golpe, vai ter luta” e mal a deixavam falar. “Por favor, tenham cautela. Nós temos uma conjuntura de manhas e artimanhas”, afirmou. “Há ainda uma dura luta pela frente.” Mais tarde, Dilma fez uma reunião de emergência com o chefe da Advocacia-Geral da União(AGU), José Eduardo Cardozo, e com os ministros Jaques Wagner (Gabinete Pessoal da Presidência) e Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo), além do assessor especial Giles Azevedo.

Ela observou que não era hora de comemorar publicamente a decisão da Câmara para não alimentar expectativas que podem não se confirmar. Auxiliares de Dilma disseram ao Estado que ela ficou muito irritada com Renan, por ter ignorado o despacho de Waldir Maranhão, e fez chegar ao senador sua indignação.

Cardozo admitiu ter se reunido com Maranhão, no fim de semana, mas negou pressão política sobre o parlamentar. “Numa nova votação na Câmara, com o devido respeito ao rito e direito de defesa, acredito que há como reverter ( o impeachment)”,disse.

Para o ministro, é “ilusão” achar que, como impeachment, um eventual governo Michel Temer terá legitimidade. “A melhor forma de se sair dessa situação é a busca de um amplo pacto, que não passe por violar a Constituição”, afirmou.

A tática do governo e do PT, ao tentar ganhar tempo, também consiste em desgastar Temer, cobrando o julgamento do impeachment dele pela Câmara.

“A Câmara poderia aproveitar para também discutir as pedaladas do vice”, afirmou o coordenador do Setorial Jurídico do PT, Marco Aurélio Carvalho.

 

Reconsideração. O chefe da AGU observou que, se não houver correção de “falhas”, o processo contra Dilma pode terminar anulado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Cardozo lembrou que, ao proferir seu despacho, Maranhão acatou recurso apresentado pela AGU ao então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em 25 de abril, que se recusou a analisá- lo. Na quinta-feira, Cunha foi afastado do cargo.

Questionado sobre a manobra do governo para salvar Dilma, Cardozo repudiou o termo.

“Manobra, para mim, é não decidir sobre um pedido que fere o direito de defesa”, rebateu.

 

Dilma, por sua vez, disse haver dois tipos de golpe: o quente, com armas, e o frio, “que usa argumentos aparentemente legais para derrubar uma presidenta legitimamente eleita”.