O Estado de São Paulo, n. 44761, 06/05/2016. Política, p. A5

Teori alega risco de obstrução das investigações

Isadora Peron

Gustavo Aguiar

O ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, usou duas linhas de raciocínio para conceder liminar pelo afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do mandato de deputado federal e, consequentemente, da presidência da Câmara.

Relator da Lava Jato na Corte, ele defendeu que a permanência Cunha na presidência da Câmara e exercendo a função de deputado representaria risco às investigações em curso contra ele no STF. O ministro também argumentou que alguém que já é réu não pode permanecer na linha sucessória da Presidência da República.

A liminar concedida pelo ministro acatou um pedido feito em dezembro do ano passado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Na peça, ele listava 11 razões para que Cunha fosse afastado do cargo.

“Está claro, pelos elementos trazidos, que há indícios de que o requerido, na sua condição de parlamentar e, mais ainda, de Presidente da Câmara dos Deputados, tem meios e é capaz de efetivamente obstruir a investigação, a colheita de provas, intimidar testemunhas e impedir, ainda que indiretamente, o regular trâmite da ação penal em curso no Supremo Tribunal Federal, assim como das diversas investigações existentes nos inquéritos regularmente instaurados”, afirmou Teori.

 

Urgente. O ministro também defendeu que a saída de Cunha se tornava urgente diante da possibilidade de o Senado aprovar o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Senado. A votação está marcada para a próxima semana. Se Dilma for afastada, o vice Michel Temer assume a Presidência e Cunha passaria a ser o primeiro na linha sucessória.

“Não há a menor dúvida de que o investigado não possui condições pessoais mínimas para exercer, neste momento, na sua plenitude, as responsabilidades do cargo de Presidente da Câmara dos Deputados, pois ele não se qualifica para o encargo de substituição da Presidência da República, já que figura na condição de réu”, escreveu Teori.

 

‘Independentes’. Em um despacho de 73 páginas, o ministro afirmou que a decisão de afastar Cunha era "excepcionalíssima", mas defendeu que não se tratava de uma interferência no Poder Legislativo. “Os poderes da República são independentes entre si, mas jamais poderão ser independentes da Constituição”, disse.

Na peça, Teori lembrou que Cunha foi transformado em réu em março pelo STF, sob a acusação de integrar o esquema de corrupção da Petrobrás. Por unanimidade, os ministros entenderam que peemedebista recebeu US$ 5 milhões em propina de contratos de navios-sonda.

 

O ministro também lembrou que ele é alvo de outras linhas de investigação na Corte. Cunha responde a outra denúncia além de três inquéritos. Há ainda três outros pedidos de investigação contra o peemedebista que esperam a autorização do Supremo para serem iniciados. Em um deles, Cunha é apontado como um dos líderes de uma célula criminosa que atuava em Furnas, num esquema semelhante ao que está sendo investigado na Petrobrás.

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Fachin vê requisitos para prisão preventiva

No julgamento de ontem que decidiu afastar Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e suspender seu mandato como deputado, o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin disse ver elementos para prender o congressista.

O ministro admitiu, no entanto, que a Corte ainda precisará enfrentar a aplicação da norma que restringe a prisão preventiva de autoridades com imunidade parlamentar apenas a casos em flagrante.

“No que diz respeito à adequação ao afastamento, poderemos verticalizar em oportunidade diversa o espectro da lei sobre imunidade parlamentar para também examinar hipótese de cabimento de prisão preventiva. Mas o que está sobre a mesa é a medida cautelar que implica na respectiva suspensão. Na declaração de voto que vou juntar vejo presente todos esses requisitos” afirmou o ministro.

Embora tenha sido afastado pelo Supremo, Cunha não perde as prerrogativas do cargo eletivo, já que a cassação do cargo eletivo só pode ser feita pelo plenário da Câmara. Por isso, o peemedebista mantém o foro privilegiado e só pode ser preso em flagrante.

Durante o julgamento, o ministro Marco Aurélio criticou o uso da proteção prevista em lei para proteger o cargo em benefício pessoal. “A imunidade parlamentar visa o exercício do cargo. Costumo dizer que o cargo é para servir os semelhantes, e não para esse ou aquele, inadvertidamente ou não, mas se sentindo inalcançável, se beneficiar do cargo.”

A suspensão de Cunha não tem prazo definido. O julgamento se baseou em acusações apresentadas à Corte pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de que Cunha vinha usando a presidência da Câmara e o cargo de deputado para obstruir investigações na Lava Jato e o processo contra ele na Câmara que pode cassar definitivamente seu mandato por quebra de decoro parlamentar.

O peemedebista é investigado no Supremo em três inquéritos por envolvimento no esquema de corrupção da Petrobrás. Além disso, há três pedidos da PGR para abertura de novos procedimentos de investigação. Em outro inquérito, Cunha já foi denunciado (acusado formalmente) por manter contas ilegais na Suíça. A denúncia ainda não foi julgada pelo plenário do STF.

 

Cunha também é réu em ação penal na Corte por ter recebido propina em contratos de compra de navios-sonda pela Petrobrás, o que o impede de fazer parte da linha sucessória da presidência da República. / I.P. e G.A.