O Estado de São Paulo, n. 44761, 06/05/2016. Política, p. A8

Para Cunha, Judiciário interveio no Legislativo

Julia Lindner

Valmar Hupsel Filho

O presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sugeriu que a decisão de suspensão de seu mandato, aprovada de forma unânime ontem pelo Supremo Tribunal Federal, foi uma retaliação à sua condução no processo que considerou a admissibilidade do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff.

“É óbvio que é uma perseguição política do PT, que gosta de buscar companhia no banco dos réus”, disse ele em entrevista concedida na residência oficial da presidência da Câmara, logo após a definição no Supremo. Segundo o peemedebista, essa reação já era mais que esperada.

Para Cunha, seu afastamento é uma intervenção do Judiciário no Legislativo. “Isso faz parte de uma intervenção clara e nítida que foi feita no Poder Legislativo, a tal ponto que no próprio voto do ministro Teori ele diz que não tem previsão na Constituição para o afastamento do presidente da Câmara e para a suspensão de mandato”, disse. “Há pouco tempo o senador Delcídio Amaral (sem partido-MS), teve a sua prisão decretada e não foi suspenso o mandato. Ficou preso por obstrução da Justiça e no exercício do mandato”, comparou.

Cunha disse que respeita e vai cumprir a decisão, mas vai contestá-la. Afirmou ainda que não renunciará ao mandato. “Não há nenhuma possibilidade de eu renunciar, não vou renunciar a nada, eu vou recorrer e espero obter sucesso no meu recurso.” Segundo ele, os 11 fatos listados na ação, que foram assimilados pelo relator, são “absolutamente contestáveis e o mérito de contestação não foi devidamente debatido”.

O peemedebista afirmou considerar “estranho” que a ação cautelar tenha caráter de urgência. “Tratou-se de uma ação cautelar ingressada em dezembro. Não havia mais a urgência. Se houvesse urgência, por que levou seis meses para apreciar a liminar?”, questionou. “Estranhamente, só seis meses depois a ação cautelar é apreciada numa madrugada e tem julgamento no mesmo dia”. Segundo ele, não houve tempo para os ministros analisarem o voto de Teori.

 

‘Desavença’. O peemedebista disse que a ação só foi proposta pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com quem disse ter uma desavença pública, após o acolhimento do impeachment. “Foi protocolada pelo procurador-geral da República, o qual é sabido que há uma desavença grande de contendas públicas entre nós e eles, por diversos atos anormais. O procurador, em seguida que eu aceitei a abertura do processo de impeachment, fez uma ação de busca e apreensão e no dia seguinte ajuizou essa ação cautelar. E, estranhamente, essa ação cautelar está sendo analisada depois que o impeachment foi votado.”

Cunha rebateu as críticas da presidente, que disse que a suspensão do mandato ocorreu“ antes tarde do que nunca”. Ele disse que poderá repetir a frase na quarta- feira, 11, após a votação no plenário do Senado do impeachment de Dilma.“ Poderei dizer antes tarde do que nunca que o Brasil vai se livrar do PT”, declarou.

 

Prazos

“Estranhamente, só seis meses depois a ação cautelar é apreciada numa madrugada e tem julgamento no mesmo dia”

Eduardo Cunha

PRESIDENTE AFASTADO DA CÂMARA

 

PONTOS-CHAVE

Em 15 meses, uma gestão bombástica

Presidência da Câmara

Em 1º de fevereiro de 2015, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) derrota o candidato do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e é eleito presidente da Câmara.

 

Pautas conservadoras

Cunha coloca para apreciação na Câmara temas considerados conservadores, como a redução da maioridade penal, além de aprovar projetos da reforma política.

 

Pautas-bomba

No ano passado, em claro confronto com o governo, o presidente da Câmara propõe votação de projetos das pautas-bomba, que elevam os gastos do governo.

 

Impeachment

 

Após deputados do PT declararem que votariam contra Cunha no Conselho de Ética, em dezembro, ele acolhe o pedido de impeachment contra Dilma.