O Estado de São Paulo, n. 44768, 13/05/2016. Política, p. A14

Dilma mantém salário e direito a transporte aéreo

Isabela Bonfim

Passava das 6 horas de ontem quando o Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), encerrou a sessão que afastou a presidente Dilma Rousseff. Entretanto, o peemedebista deixou uma última cartada de apoio à petista e enumerou uma série de direitos, como salário integral e transporte aéreo, durante os 180 dias de afastamento, ou até o julgamento final do processo de impeachment. Citando a Constituição, Renan informou que, apesar de afastada, a presidente mantém no período prerrogativas do cargo. Dessa forma, Dilma se cerca de aparatos que fortalecem seu status de presidente afastada, e não de “ex-presidente”.

O primeiro é ou soda residência oficial. A presidente não precisará deixar o Palácio da Alvorada e terá acesso à Granja do Torto. Com isso, o presidente em exercício, Michel Temer, continuará no Palácio do Jaburu. Outra questão que chama atenção é o salário. Na iminência do afastamento de Dilma foi levantado que, com base na Lei do Impeachment, o salário da presidente deveria ser cortado pela metade, ou seja, a R$ 15,4 mil. A assessoria técnica do Senado, entretanto, informou que a medida é inconstitucional.

Renan se amparou na legislação mais atual, menos descritiva, e garantiu a remuneração integral à Dilma, de R$ 30,9 mil. Além disso, a presidente terá para o seu apoio toda a equipe a serviço do Gabinete Pessoal da Presidência, devidamente remunerada.Quando afastado, o ex-presidente Fernando Collor também pôde montar sua equipe de apoio, com servidores, secretárias e motoristas.

 

Estrutura. Pela determinação de Renan, ficam garantidos à presidente os serviços de segurança pessoal e assistência de saúde. Dilma terá assessores, seguranças pessoais, veículo do governo e batedores à disposição. Outra medida polêmica é o uso de avião da Força Aérea Brasileira, já que, suspensa de suas funções, a presidente não faria viagens oficiais. No documento apresentado por Renan, entretanto, ele prevê a manutenção de transporte “aéreo e terrestre” para ela. Divergências. Os posicionamentos definidos por Renan não eram consenso entre os senadores. Enquanto governistas argumentam que, além de direito, é necessário manter o aparato de apoio à presidente até por questão de segurança para seu deslocamento cotidiano, a oposição questionava se a definição desses parâmetros caberia ao Presidente do SenadoHá quem defenda que a decisão do que permanece sob o direito de Dilma caberia ao Supremo Tribunal Federal. Aliados de Temer, por outro lado, defendem que o uso do aparato do Poder Executivo cabe somente a ele, de forma que apenas o chefe deste poder, no caso o presidente em exercício, é quem poderia determinar o que será ou não concedido à presidente agora afastada.

 

Equipe de TV é atacada por militantes

Militantes localizados em frente ao Palácio do Planalto agrediram uma equipe da GloboNews que filmava a saída da presidente afastada, Dilma Rousseff. O incidente aconteceu quando o cinegrafista Wesley Araruna e o repórter Marcelo Cosme registravam o momento em que Dilma se dirigia para fazer seu discurso, no pé da rampa do Palácio do Planalto. Mulheres com camisas do PT e de outros movimentos sociais gritaram com o repórter e com o cinegrafista, chamando a TV Globo de “golpista”. Militantes empurraram o repórter e o cinegrafista, mandando que eles se retirassem do local. Alguns militantes tentaram puxar o microfone do repórter, para tentar impedi-lo de gravar.

 

Os profissionais tiveram de deixar o local, próximo de onde Dilma falou, e se dirigiram para uma área mais reservada.

 

Cardozo continua na defesa da presidente afastada

 

O ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, disse que vai continuar na liderança da defesa jurídica da presidente afastada Dilma Rousseff, nesta próxima etapa do processo. Cardozo, que ainda permanecia no Palácio do Planalto após Dilma e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixarem o local, disse que o Conselho de Ética da Presidência da República o liberou de um período de quarentena para atuar na causa do impeachment, porque Cardozo já estava trabalhando na causa. “Não há conflito de interesse. Permanecerei na defesa, em conjunto com outros advogados”, comentou.

 

Nos próximos meses, a defesa de Dilma vai buscar novos caminhos para provar que a presidente afastada não cometeu crime de responsabilidade. Uma das possibilidades será questionar a “justa causa” do processo, etapa jurídica que, segundo Cardozo, não foi abordada até agora. / ANDRÉ BORGES e VERA ROSA

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No último dia, isolamento e barreira policial

Tânia Monteiro

Leonencio Nossa

 

Dilma Rousseff viveu na manhã de ontem momentos tensos no trajeto entre os Palácios da Alvorada e do Planalto, onde assinaria a notificação de seu afastamento da Presidência. Às 9h40, ela deixou a residência oficial do Alvorada num comboio de cinco carros. Na altura de um viaduto que dava acesso ao Eixo Monumental e à Praça dos Três Poderes, a comitiva foi parada numa barreira policial. Guardas mandaram o grupo seguir por outra via que levaria aos fundos do palácio. “Aqui ninguém passa”, disse em tom elevado um policial militar do Distrito Federal na barreira, diante dos motoristas do comboio presidencial. Mesmo informado de que a presidente estava num dos carros, o PM não recuou. Houve incredulidade e bate-boca. Um motorista relatou à reportagem que percebeu espanto, irritação e depois tristeza por parte da presidente. Dentro do carro, parada na barreira, Dilma demonstrou, agora, nervosismo. O comboio, então, recuou dando voltas pela Vila Planalto até que recebesse autorização. Após, dez minutos, os motoristas do comboio foram avisados de que estavam “autorizados” a passar. Dilma, ainda no exercício da Presidência, chegou ao palácio às 10h20, atrasada para receber a notificação.

O isolamento, uma constante no mandato de cinco anos e quatro meses de Dilma, foi uma marca dos momentos vividos por ela no Alvorada antes da decisão do Senado. Quando Renan Calheiros (PMDB-AL) apresentou o resultado da votação, Dilma, no Alvorada, só contava com a presença da mãe, dona Dilma Jane, de 92 anos, que enfrenta problemas de saúde. Alguns minutos depois, ouviu-se o barulho de fogos de artifício na região do Lago Sul e Lago Norte. A segurança tinha sido informada na véspera que Dilma não daria a habitual pedalada.

 

Das 5h30 até a votação do impeachment, nenhum carro de autoridade entrou ou saiu do Alvorada. Depois, por volta das 9h, a presidente recebeu a visita de Nilma Lino Gomes, ministra de Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Naquele momento, no Palácio do Jaburu, residência oficial de Michel Temer, também não havia movimentação. O vice deu ordens para que a segurança liberasse a entrada de parlamentares às 9h.