O Estado de São Paulo, n. 44769, 14/05/2016. Política, A4

Itamaraty repudia crítica externa ao impeachment

Isabela Bonfim

Ricardo Galhardo

O novo ministro de Relações Exteriores, José Serra (PSDB), manifestou ontem repúdio a declarações de países da América Latina e do secretário-geral da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), Ernesto Samper, contrárias ao processo de impeachment que culminou no afastamento de Dilma Rousseff da Presidência e no início do governo interino de Michel Temer.

No mesmo dia um dos alvos de Serra, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, determinou que o embaixador venezuelano no Brasil, Alberto Castellar, retornasse a Caracas para uma reunião sobre o afastamento de Dilma.

O gesto de Serra marca uma nova posição do Itamaraty sob a gestão do peemedebista e representa um distanciamento de países cujos governos mantêm boas relações com o PT.

Em duas notas, o ministério cita a Unasul e os governos de Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua. No comunicado sobre a Unasul, o Itamaraty diz que Samper qualificou de “maneira equivocada o funcionamento das instituições democráticas do Estado brasileiro”.

“Os argumentos apresentados, além de errôneos, deixam transparecer juízos de valor infundados e preconceitos contra o Estado brasileiro.

Além disso, transmitem a interpretação absurda de que as liberdades democráticas, o sistema representativo, os direitos humanos e sociais e as conquistas da sociedade brasileira se encontrariam em perigo. A realidade é oposta”, afirma o texto.

Segundo a assessoria de imprensa do ministério, as declarações de Samper são incompatíveis com as funções e o mandato que ele exerce na Unasul.

Na outra nota, a pasta “rejeita enfaticamente as manifestações dos governos da Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua, assim como da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), que se permitem opinar e propagar falsidades sobreo processo político interno no Brasil”. “Como qualquer observador isento pode constatar, o processo de impedimento é previsão constitucional; o rito estabelecido na Constituição e na lei foi seguido rigorosamente, com aval e determinação do STF; e o vice-presidente assumiu a presidência por determinação da Constituição Federal, nos termos por ela fixados”, diz o documento.

 

Venezuela. Maduro anunciou a viagem do embaixador a Caracas em rede nacional de rádio e TV ontem. Ele classificou o afastamento de Dilma como uma “canalhada” e manifestou temor de que o processo no Brasil crie uma onda de instabilidade espalhando na região o “vírus do golpismo”.

Diplomatas ouvidos pelo Estado afirmaram que quando um país age dessa forma em relação ao Brasil, o Itamaraty responde com decisão semelhante. Com isso, o Brasil poderá retirar seu embaixador de Caracas. Outros países da América Latina manifestaram preocupação com a situação brasileira.

A chanceler argentina, Suzana Malcora, disse ontem sentir “dor institucional e pessoal pelo que se passa no Brasil”. O chanceler uruguaio, Rodolfo NinNova, afirmou que a situação no Brasil “pode ter algum efeito de mudança na negociação que o Mercosul mantém com a União Europeia para um acordo de livre comércio”.

 

‘Absurdo’

 

“Os argumentos apresentados, além de errôneos, deixam transparecer juízos de valor infundados e preconceitos contra o Estado brasileiro. Transmitem interpretação absurda de que as liberdades democráticas, o sistema representativo, os direitos humanos e sociais e as conquistas da sociedade se encontrariam em perigo”