O Estado de São Paulo, n. 44779, 24/05/2016. Política, A7

PT vai usar crise para tentar anular impeachment

Vera Rosa

O PT vai usar a primeira crise do governo Michel Temer para tentar anular o processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff. Mesmo com o afastamento rápido do ex-ministro Romero Jucá – depois que veio à tona um diálogo no qual o senador diz ser preciso mudar o governo para “estancar essa sangria”, numa referência à Operação Lava Jato –, senadores do PT farão de tudo para paralisar a comissão do impeachment.

Embora até o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva considere difícil Dilma retornar ao Palácio do Planalto, após o julgamento final no Senado – previsto para ocorrer entre agosto e setembro–,os problemas no início da gestão Temer animaram o PT. Sob comando de Lula, será reforçada a ofensiva para reverter seis votos de senadores que votaram pela deposição da presidente.

A ideia é bater na tecla de que o processo foi “contaminado” por desvios de finalidade.

“Se alguém ainda não tinha certeza de que há um golpe em curso, baseado no desvio de poder e na fraude, as declarações fortemente incriminatórias de Jucá sobre os reais objetivos do impeachment e sobre quem está por trás dele eliminam qualquer dúvida”, afirmou Dilma, à noite, na abertura de um congresso de trabalhadores na agricultura familiar.

Aplaudida pela plateia, formada por cerca de 700 pessoas, a presidente afastada disse que a gravação de um diálogo entre Jucá e o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado “escancara” o modus operandi do que chamou de “consórcio golpista”.

Sob gritos de “Fora Temer” e “Não vai ter golpe”, Dilma declarou que continuará lutando para defender o seu mandato e criticou o ministério montado pelo presidente em exercício.

“Os brasileiros não elegeram um governo só de homens, brancos, ricos e velhos.” Dilma passou o dia em reunião com antigos auxiliares, no Palácio da Alvorada. Antes do almoço, chamou o ex-ministro da Secretaria de Governo Ricardo Berzoinie pediu que ele desse o tom da reação petista ao escândalo envolvendo Jucá.

“Exigimos a demissão de Romero Jucá e a investigação da relação de Temer com esse diálogo”, disse Berzoini. Em sua conta no Twitter, o presidente do PT, Rui Falcão, escreveu que a “Operação Lava Jato acabou por se tornar instrumento da escalada golpista”.

Dirigentes e ex-ministros do PT foram informados de que Machado fechou delação premiada com o Ministério Público e também teria denunciado Renan e o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP). Renan disse ontem que, por causa da antecipação da sessão do Congresso que analisará a revisão da meta fiscal – marcada para hoje – a reunião da comissão do impeachment foi adiada para amanhã.

“Não tomei conhecimento de delação”, desconversou ele. No diálogo com Jucá, ocorrido semanas antes da votação do impeachment na Câmara, Machado falou sobre o esquema de corrupção na Petrobrás. “Jucá foi o grande articulador do impeachment no Senado e, agora, aparece dizendo que a montagem do governo Temer previa um pacto para encerrar investigações da Lava Jato”, destacou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).“É claro que o impeachment está contaminado.” A estratégia de Dilma e do comando petista será bater na tecla de que Jucá representa, no Senado, o mesmo que Eduardo Cunha (PMDB-RJ) foi na Câmara.

Cunha deu o pontapé inicial para o impeachment e acabou afastado do comando da Casa por decisão do Supremo Tribunal Federal. Réu na Lava Jato, ele é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. / COLABORARAM CARLA ARAÚJO e ISABELA BONFIM

 

Panelaço

 

Moradores de vários bairros do Rio (regiões central e sul) protestaram contra o governo Temer ontem à noite durante exibição de reportagem sobre a gravação no Jornal Nacional, da TV Globo