O Estado de São Paulo, n. 44783, 28/05/2016. Política, p. A6

Ex-deputado liga Lula a esquema na Petrobrás, diz revista

Segundo ‘Veja’, Pedro Corrêa vinculou petista a negociação entre PP e PMDB em diretoria onde houve desvios e impôs nomeação de Costa

Por: Mateus Coutinho / Fausto Macedo

 

O ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE), condenado no mensalão e na Operação Lava Jato, afirmou em proposta de delação premiada na Procuradoria-Geral da República que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva articulou o esquema de corrupção na Petrobrás, segundo reportagem da revista Veja da edição deste fim de semana. Lula teria imposto a nomeação do engenheiro Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Abastecimento da estatal petrolífera, em 2004.

A delação de Pedro Corrêa ainda não foi homologada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo a reportagem, o relato do ex-deputado, preso em 2015 por ordem do juiz federal Sérgio Moro, tem 132 páginas e implica pelo menos 18 políticos, entre deputados, senadores, ministro do Tribunal de Contas da União, ex-ministros e ex-presidentes.

Corrêa admite que recebeu propina de quase 20 órgãos do governo ao longo de sua vida política, tendo começado a captar dinheiro ilícito ainda na década de 1970, em contratos do extinto Inamps, autarquia vinculada ao Ministério da Previdência extinto em 1993. Ele relata casos envolvendo outros delatores, como o senador cassado Delcídio Amaral.

Segundo o ex-deputado, o então presidente da Petrobrás, José Eduardo Dutra, teria dito a Lula que não era da tradição da estatal preencher cargos por indicação política. Mas Lula, afirmou o delator, ordenou a nomeação de Paulo Roberto Costa para a Abastecimento - primeiro bolsão de propinas instalado na Petrobrás, segundo a Lava Jato.

Pedro Corrêa citou o ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) como responsável pela indicação de Delcídio para uma diretoria da Petrobrás no governo FHC. Mencionou, ainda, o presidente afastado da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Jader Barbalho (PMDB-PA) e Valdir Raupp (PMDB-RR), o ministro do TCU que reprovou as contas de Dilma Rousseff, Augusto Nardes, o ex-prefeito Paulo Maluf (PP), de São Paulo, os ex-ministros Alexandre Padilha (Saúde), Alfredo Nascimento (Transportes), Aloizio Mercadante (Casa Civil e Educação), Jaques Wagner (Casa Civil) e José Dirceu (Casa Civil) e também a ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney.

Em um dos depoimentos, de acordo com a revista, parlamentares do PP foram reclamar com Lula sobre o avanço do PMDB no esquema das propinas pagas à diretoria de Abastecimento, cota do PP. Na ocasião, o petista teria dito aos deputados do PP que eles estavam “com as burras cheias de dinheiro” e que também tinha que “atender aos outros aliados”.

Já em relação à presidente afastada Dilma Rousseff, Pedro Corrêa teria afirmado que ela se reuniu com o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa em 2010 e teria pedido “apoio financeiro”.

 

TCU. O ministro Augusto Nardes, do TCU, segundo o delator, teria recebido dinheiro do mensalão quando ainda exercia mandato de deputado pelo PP. Nardes foi o relator das contas de Dilma no tribunal e o primeiro a votar pela rejeição delas pelas chamadas pedaladas fiscais que, posteriormente, foram utilizadas como justificativa para o processo de impeachment aberto no Congresso. O presidente do PSDB Aécio Neves foi citado como suposto destinatário de propina em uma obra da estatal de energia Furnas.

Paulo Maluf aparece pela primeira vez citado na Lava Jato como destinatário de R$ 20 milhões do esquema de corrupção na Petrobrás.

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Após Suíça, Panamá e Hong Kong viram foco

Por: Adriano Ceolin / Isadora Peron

 

Depois do êxito no compartilhamento de investigações com a Suíça, a Operação Lava Jato pretende investir na coleta de informações em Hong Kong e no Panamá. “São praças que passaram a ser atraentes para criminosos”, afirmou ao Estado o procurador Vladimir Aras, chefe da Secretaria de Cooperação Jurídica Internacional da Procuradoria-Geral da República. Desde o início da Lava Jato em 2013, foram firmados 108 pedidos de cooperação com 42 países diferentes.

O caso do Panamá surge como mais promissor. Outros países já solicitaram acesso à íntegra da busca e apreensão feita em abril deste ano no escritório de advocacia Mossack Fonseca - que é especializado na abertura de contas offshore em nome de estrangeiros. O objetivo da PGR é ter acesso aos 12,5 terabytes de informação apreendidos no local.

De forma não oficial, o caso Panama Papers já havia dado uma boa amostra do potencial do material da Mossack. Sob responsabilidade de um consórcio internacional de jornalistas, a investigação dos repórteres confirmou que há 107 offshores ligadas a personagens da Lava Jato.

Integrante da força-tarefa da operação, Aras não quis adiantar quando pedida a transferência de dados da Mossack para o País. Sobre Hong Kong, ele reconhece que poderá haver mais dificuldades. “Mas já sabemos que há brasileiros que optaram por esse mercado asiático”, disse.

Aras tem defendido que a cooperação internacional é um dos pilares da operação que revelou o esquema de corrupção na Petrobrás. Os outros são o uso da delação premiada, da conjugação de técnicas de investigação criminal e civil, a atuação em força-tarefa do Ministério Público com a Polícia Federal e a comunicação com a sociedade. “É tudo isso junto que deixa a Lava Jato de pé.”

Estratégica para o sucesso da operação, a cooperação internacional foi decisiva para as investigações. O caso mais expressivo é o da Suíça, que permitiu a descoberta de contas do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) naquele país e subsídio para o oferecimento de denúncia contra ele no Supremo Tribunal Federal.

A revelação das contas foi decisiva para a apresentação de pedido de cassação contra ele no Conselho de Ética da Câmara. Isso porque, durante depoimento à CPI da Petrobrás, ele disse não ter contas ou offshore fora do País. Em sua defesa, Cunha alega que as contas são trusts sobre as quais ele não tem controle.

Até o fim dos anos 1990, a Suíça mantinha seu sistema financeiro blindado. O país passou a ser cobrado a se abrir principalmente após o atentado terrorista de 11 de setembro de 2001. O principal objetivo é saber o caminho do dinheiro que financiou os ataques.

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Assessoria alega ‘arbitrariedade contra petista’

Por: Carla Araújo

 

A assessoria de imprensa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva informou que os advogados do petista solicitarão acesso à delação premiada do ex-deputado Pedro Corrêa “para tomar as medidas cabíveis diante de mais uma arbitrariedade contra Lula”.

A assessoria lembra que o ex-deputado foi condenado a 20 anos por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro e diz que, para não cumprir a pena, “aceitou negociar com o Ministério Público Federal uma narrativa falsa envolvendo o ex-presidente Lula”. “É repugnante que policiais e promotores transcrevam essa farsa em documento oficial, num formato claramente direcionado a enxovalhar a honra do ex-presidente Lula e de um dos mais respeitáveis políticos brasileiros, o falecido senador José Eduardo Dutra”, diz.

Já a presidente afastada Dilma Rousseff afirmou que nunca se reuniu com o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa, em 2010, para pedir apoio financeiro. Para a presidente, a “suposta delação” de Corrêa é mais uma tentativa de envolver seu nome em “versões fantasiosas”. Segundo Dilma, a afirmação de Corrêa “é absolutamente mentirosa e absurda, sendo desmentida inclusive por outras evidências e depoimentos divulgados ao longo da Operação Lava Jato”.

Aécio negou que teria sido representante do PSDB na partilha de propina em uma obra em Furnas Sua nota, entretanto, não cita o inquérito existente para apurar suposta participação do tucano no esquema de corrupção de Furnas, que está na Procuradoria-Geral da República. O ministro Geddel negou à revista ter indicado Delcídio para cargo na Petrobrás. “Surpreende-me que esse ladrão decrépito tenha citado o meu nome. Não indiquei Delcídio”, afirmou o ministro do governo Temer.

Nardes afirmou que ele e Corrêa sempre foram de grupos contrários dentro do partido. “Ele não me apoiou quando fui indicado para ser ministro e me pressionou muito. Mas eu não aceitei compactuar com o esquema de Paulo Roberto (Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás). É retaliação do Pedro”, disse o ministro.

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  • Aécio Neves

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Supremo proíbe 'processos ocultos' na Corte

Esse tipo de ação nem sequer aparece em sistema, o que dificultava localização de processos envolvendo políticos
Por: Isadora Peron / Carla Araújo / Gustavo Aguiar

 

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, assinou resolução proíbe os “processos ocultos” na Corte. Esse tipo de ação não aparece nem sequer como referência nos dados digitalizados no sistema do tribunal. Até agora, os chamados processos ocultos só podiam ser consultados pelo ministro-relator ou pela Procuradoria-Geral da República.

Com o fim desse tipo de tramitação será possível verificar, inclusive, a existência de investigações contra políticos que hoje estão ocultas no sistema do STF. Os processos devem continuar tramitando sob segredo de Justiça, mas a população poderá saber, ao menos, se há ou não uma investigação envolvendo uma autoridade.

Esse modelo passou a ser usado com mais frequência pela Corte por causa da Operação Lava Jato, pois havia o receio por parte de integrantes do Ministério Público Federal que a publicidade dos processos pudesse atrapalhar o avanço das investigações.

A assessoria do STF informou não haver estimativa do número de processos ocultos em tramitação. Esse levantamento será feito a partir de dados dos gabinetes de cada ministro. Pelos cálculos de técnicos do Supremo, porém, havia mais de 700 processos ocultos que já foram arquivados.

Antes da proibição determinada pelo STF, o mais provável era que a eventual abertura de um processo contra a presidente afastada Dilma Rousseff, por exemplo, tramitasse de maneira oculta. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a instauração de inquérito contra a petista por suposta tentativa de obstruir a Lava Jato.

A justificativa dada pelo presidente do Supremo para editar a resolução que extingue os processos ocultos é que a medida atende aos princípios constitucionais da publicidade, do direito à informação, da transparência e também aos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.

Lewandowski também afirma que a medida visa “melhor disciplinar a classificação e tramitação do crescente número de documentos e feitos de natureza sigilosa” que ingressam na Corte.

Segundo o Estado apurou, Lewandowski conversou com alguns ministros do STF antes de assinar a resolução, que data do dia 25. Interlocutores do presidente do Supremo afirmam que a medida foi vista com bons olhos pelos magistrados, inclusive pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato.

O Supremo destaca que a nova resolução não vai causar prejuízo às investigações criminais, uma vez que as medidas cautelares serão mantidas em sigilo até sua execução, a fim de que a coleta da prova não seja prejudicada. De acordo com o texto, “os requerimentos de busca e apreensão, quebra de sigilo telefônico, fiscal e telemático, interceptação telefônica, dentre outras medidas necessárias no inquérito, serão processados e apreciados, em autos apartados e sob sigilo”.

 

OAB. Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) elogiou a resolução. “A transparência é um valor salutar para a democracia e para o bom funcionamento do Judiciário”, diz o presidente da OAB, Claudio Lamachia.” / I.P., C.A. e GUSTAVO AGUIAR

 

PARA ENTENDER

Ações são as mais ‘fechadas’

Os chamados processos ocultos são bem mais fechados do que os que correm em segredo de Justiça. Nem mesmo o número de registro dessas ações aparece no sistema do Supremo Tribunal Federal. É como se eles simplesmente não existissem para as pessoas comuns. O selo de oculto costumava ser recomendado pela Procuradoria-Geral da República quando o órgão julgava necessário o mais alto grau de sigilo para a investigação de uma autoridade política. Mas, conforme resoluções internas e o regimento da Corte, cabe ao relator definir se um processo será aberto, sigiloso ou oculto. Os procedimentos ocultos só podem ser consultados pelo ministro-relator e pela Procuradoria. Os casos sob segredo de Justiça têm número e o trâmite pode ser visualizado por qualquer cidadão, mas o conteúdo das decisões não pode ser acessado.