O Estado de São Paulo, n. 44783, 28/05/2016. Política, p. A7

Repúdio a 'golpe' faz FHC cancelar debate

Ex-presidente ataca ‘mentes radicais’ e desiste de palestra na Associação de Estudos Latino-Americanos, nos EUA, após críticas de intelectuais

Por: Altamiro Silva Junior

 

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso cancelou a participação que faria hoje em um evento em Nova York da Associação de Estudos Latino-Americanos (Lasa). Um grupo de intelectuais ligados a universidades brasileiras havia se manifestado contra a participação do ex-presidente devido ao posicionamento favorável do tucano ao processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff.

A Lasa, que completa 50 anos, realizará um debate sobre o desenvolvimento da democracia na América Latina e ainda terá um jantar de gala. A entidade reúne profissionais e instituições dedicadas a estudos da região e tem cerca de 12 mil sócios, quase 60% deles fora dos Estados Unidos.

Em uma carta enviada à Lasa, a qual a reportagem teve acesso, FHC afirma que neste momento não quer “dar pretexto a mentes radicais, guiadas por paixões partidárias” e, por isso, agradece o convite, mas lamenta não poder participar do evento. Havia a previsão de que protestos contra a participação do tucano no evento pudessem ocorrer. “Eu peço apenas a compreensão de que neste momento da vida, aos 85 anos de idade, eu não gostaria de dar pretexto para mentes radicais, guiadas por paixões partidárias, para me usar em uma luta imaginária ‘contra o golpe’, um golpe que nunca existiu”, diz trecho da carta.

Na página do evento na internet, ainda com o nome do ex-presidente entre os participantes, há também menção a outros líderes que estarão no encontro, como o ex-presidente do Chile Ricardo Lagos.

 

Intelectuais. Em uma carta enviada à entidade em abril, intelectuais estrangeiros e brasileiros, de universidades como a de Brasília (UnB), Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Estadual Paulista (Unesp), pedem que a Lasa cancele o evento com Fernando Henrique porque ele e seu partido, o PSDB, aderiram ao “golpe”. “Respeitamos a contribuição passada de FHC para o pensamento internacional. Contudo, este convite vem em um momento inapropriado”, afirma o texto, destacando o contexto de “fragilidade da democracia brasileira” por causa da turbulência política.

A Lasa divulgou em seguida que, além do pedido para cancelar a participação no evento do ex-presidente brasileiro, recebeu solicitações de seus membros para manter o convite ao tucano. Em um comunicado, a instituição justifica a manutenção do convite afirmando que “jamais desqualificaria um acadêmico respeitável” de participar de seus eventos baseado em sua posição política. Alguns membros da entidade aprovaram uma moção contra o impeachment de Dilma Rousseff, que ainda precisa ser votada pela associação.

 

Honoris causa. Anteontem, FHC recebeu o título de doutor honoris causa pela Universidade Harvard. Além do ex-presidente brasileiro, outras oito personalidades, como o cineasta Steven Spielberg, receberam o título pela instituição.

 

Carta

“Eu peço apenas a compreensão de que neste momento da vida, aos 85 anos de idade, eu não gostaria de dar pretexto para mentes radicais, guiadas por paixões partidárias”

Fernando Henrique Cardoso

EX-PRESIDENTE, EM CARTA À LASA

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Para Marina, eleição de 2014 foi ‘fraudada’ e Dilma cometeu crime

Ex-ministra volta a defender cassação da chapa eleita e diz que Dilma cometeu crime de responsabilidade
Por: Gabriela Lara

 

A ex-ministra Marina Silva (Rede) afirmou que as recentes revelações com base em gravações feitas pelo presidente da Transpetro Sérgio Machado mostram que PT e PMDB “convergem” no esforço de enfraquecer a Operação Lava Jato.

Em entrevista concedida ontem na capital gaúcha, ela também voltou a defender a cassação da chapa da presidente da República afastada, Dilma Rousseff, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por entender que há elementos trazidos pela própria Lava Jato que indicam que a eleição de 2014 “foi fraudada” pelo uso de dinheiro oriundo do esquema de corrupção em contratos da Petrobrás.

Embora defenda novas eleições, Marina disse que “ainda não sabe” se concorrerá à Presidência pela terceira vez. “As revelações feitas de conversas de parte da cúpula do PT e agora de parte da cúpula do PMDB demonstram que qualquer pessoa que tenha conhecimento mínimo do que está ocorrendo da política brasileira sabe que o ponto em que eles (PT e PMDB) se encontram e convergem na mesma profundidade, na mesma proporção, é no arrefecimento da Lava Jato”, disse.

De acordo com Marina, o impeachment não pode ser classificado como golpe porque está previsto na Constituição e porque, segundo ela, houve crime de responsabilidade cometido por Dilma. “Mais de R$ 60 bilhões foram usados em operações de crédito sem autorização do Congresso, sem que nós tivéssemos lastro necessário para essas operações”, relatou.

Para a fundadora da Rede Sustentabilidade, no entanto, embora seja um processo legal o impeachment não alcança a finalidade desejada de “passar o Brasil a limpo”, uma vez que mantém o PMDB no poder, na figura do agora presidente em exercício Michel Temer. “As cúpulas desses partidos indicaram juntas as diretorias da Petrobrás. Havia uma coordenação para a distribuição dos recursos da propina, e esses segmentos estavam operando politicamente para o enfraquecimento da Lava Jato.”

Órgãos relacionados:

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Áudios mostram ligação do MBL com partidos

 

Integrantes do Movimento Brasil Livre, um dos principais grupos que organizaram manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff, aparecem em áudios comentando o apoio financeiro de partidos políticos aos atos pelo afastamento da petista. Nas gravações, obtidas pelo portal UOL, são citadas negociações com PMDB, PSDB, SD e DEM.

Desde o início dos protestos, o MBL se apresentava como um movimento apartidário e sem ligações financeiras com legendas políticas.

De acordo com o UOL, em uma gravação de fevereiro de 2016, Renan Santos, um dos três coordenadores nacionais do MBL, dizem mensagem a um colega que tinha fechado com partidos políticos para divulgar os protestos do dia 13 de março usando as “máquinas deles também”.

Em resposta ao portal, Renan Santos confirmou a autenticidade do áudio e disse que o comitê do impeachment contava com lideranças de diversos partidos, como DEM, PSDB, SD e PMDB.

Renan foi filiado ao PSDB entre os anos 2010 e 2015.

A reportagem afirma ainda que o movimento negociou com a Juventude do PSDB ajuda financeira a suas caravanas, como pagamento de lanches e aluguel de ônibus. Ao UOL, o secretário de Mobilização da Juventude do PSDB do Rio de Janeiro, Ygor Oliveira, confirma a autenticidade da gravação, mas diz que a parceria com o MBL não foi concretizada.