O Estado de São Paulo, n. 44781, 26/05/2016. Economia, B1

Governo Temer vai tirar indicados por Dilma dos conselhos de estatais

Tânia Monteiro

Vera Rosa

Erich Decat

O governo do presidente em exercício Michel Temer prepara uma grande reformulação nos conselhos de administração dos bancos públicos e das empresas estatais. Os conselhos – instâncias em que são tomadas as decisões estratégicas das empresas – têm em sua composição muitos representantes do governo da presidente afastada Dilma Rousseff. Em entrevista ao Estado, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, revelou que o objetivo é evitar “o conflito de interesses”.

Na visão do ministro, as pessoas que ocupam esses postos, indicadas pelo governo anterior, certamente contestarão as novas propostas administrativas, da mesma forma como fizeram durante a votação da revisão da meta fiscal, no Congresso, na madrugada de quarta-feira, quando ficou claro o clima de confronto e enfrentamento em relação às posições defendidas por Temer.

Padilha evitou usar o termo “devassa” para classificar a atuação do novo governo nas empresas estatais, no Banco do Brasil, na Caixa Econômica Federal e em outros bancos públicos. “Essa palavra soa mal. Penso que tem de se fazer uma análise, uma auditoria”, disse, acrescentando que “a orientação do presidente Michel é que não haja caça às bruxas”. E emendou: “Nós não estamos procurando pessoas; estamos procurando solução do ponto de vista da gestão”.

Padilha não citou casos específicos nem nomes de conselheiros. Mas, uma busca em dados de empresas controladas pelo governo mostra ao menos sete integrantes do primeiro escalão da gestão Dilma: o ex-ministro Jaques Wagner (Casa Civil) e o assessor especial da Presidência Giles Azevedo, no conselho da hidrelétrica de Itaipu; os ex-ministros Luís Inácio Adams (Advocacia Geral da União) e Waldir Simão (Planejamento), ambos nos conselhos da Brasilprev e da Brasilcap, duas coligadas do Banco do Brasil; os ex-ministros Aloizio Mercadante (Educação) e Edinho Silva, na BB Mafre, empresa de seguros do BB, e Miguel Rossetto (Trabalho), no BNDES. O ex-governador do Rio Grande do Sul Alceu Collares, Maurício Requião, filho do ex-governador do Paraná Roberto Requião, e Roberto Amaral, que ocupou o ministério de Ciência e Tecnologia no governo Lula, também integram o conselho de Itaipu.

Pela Lei das Sociedades Anônimas (S/A), há três formas de retirar conselheiros de administração em empresas de capital aberto: fim do mandato (usualmente de dois anos, com possibilidade de prorrogação), renúncia ou destituição em assembleia geral de acionistas.

Ao defender as mudanças nos Conselhos para se adequarem às novas orientações, o ministro Padilha explicou que irá buscar um alinhamento dos conselheiros. Para ele, a gestão do governo deve ser feita “com pessoas que queiram que a proposta seja adotada e não com quem a conteste diametralmente”. Em seguida, defende rapidez nessas mudanças.

“Em tendo havido uma mudança no governo e uma mudança de orientação do governo, é obvio que estas substituições deveriam ter acontecido ontem”, afirmou. “Como não deu para acontecer ontem, de hoje em diante é obvio que têm de acontecer, porque senão teremos um conflito de interesses dentro do órgão, o que é inadmissível”.

Ao ressaltar a necessidade de substituição dos conselheiros, Eliseu Padilha lembrou o enfrentamento que ficou claro entre o governo anterior e o novo, em todas as esferas. “Haja vista o debate que se estabeleceu ontem na Câmara dos Deputados. Se as pessoas que hoje estão nestes conselhos representam aquela posição que foi expressa no debate de ontem, dentro do Parlamento, é obvio que essas substituições já deveriam até ter sido feitas”, observou o ministro.

Questionado sobre o risco de judicialização, já que a função de conselheiro tem mandato definido, Eliseu Padilha respondeu: “Não vou discutir direito adquirido de ninguém. Vou tomar as providências que entendo defender os interesses do Estado brasileiro. Se isso derivar em alguma demanda judicial, estamos preparados para enfrentá-la.”

Recentemente foi aberto um questionamento jurídico em mudanças determinadas pelo governo na Empresa Brasileira de Comunicação (EBC). Em meio a uma intervenção do Planalto, o presidente Ricardo Melo, eleito para o período de quatro anos pelo conselho da empresa, foi demitido. Melo, que havia sido empossado dois dias antes da saída de Dilma, está recorrendo ao Supremo Tribunal Federal (STF).

O ministro disse que não está definido ainda por qual conselho devem ser iniciadas as mudanças. Disse apenas que algumas já foram feitas e que outras virão. Procurada, a assessoria da presidente afastada Dilma Rousseff não comentou as declarações de Padilha. / COLABOROU MURILO RODRIGUES ALVES

 

PRESTE ATENÇÃO

1.Nos conselhos de empresas controladas pelo governo, existem ao menos sete integrantes do primeiro escalão da gestão Dilma, entre eles o exministro Jaques Wagner (Casa Civil) e o assessor especial da Presidência Giles Azevedo, no conselho da hidrelétrica de Itaipu e o ex-ministros Aloizio Mercadante (Educação) e Edinho Silva, na BB Mafre, empresa de seguros do BB, além de Miguel Rossetto (Trabalho), no BNDES.

 

2.Pela Lei das Sociedades Anônimas (S/A), há três formas de retirar conselheiros de administração em empresas de capital aberto: fim do mandato (usualmente de dois anos, com possibilidade de prorrogação), renúncia ou destituição em assembleia geral de acionistas. Ao defender as mudanças nos conselhos de administração, o ministro Eliseu Padilha disse que buscará um ‘alinhamento dos conselheiros’.

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‘Dilma só volta à Presidência por um acidente de percurso’ 

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse ontem que a presidente afastada, Dilma Rousseff, só voltará a comandar o País se houver um “acidente de percurso” e negou que o novo governo, com apenas duas semanas, já enfrente uma crise política. Padilha defendeu o senador Romero Jucá (PMDB-RR), que foi afastado do Ministério do Planejamento após sugerir, em conversa gravada, um pacto para frear a Lava Jato, e destacou que um governo com mais de dois terços de apoio “não pode ter medo” de oposição. Advogado, o chefe da Casa Civil disse que, sob o ponto de vista legal, é “perfeitamente possível” a absolvição da presidente afastada, mas observou que quem fez o movimento pela saída dela não foi o Congresso, mas, as ruas. A seguir, os principais trechos da entrevista:

 

O governo teve a primeira vitória no Congresso com a aprovação da revisão da meta fiscal. O sr. já tem uma ideia do tamanho da base aliada e com quantos votos o governo pode contar daqui para a frente?

O novo governo vem amparado por dois terços do Congresso e tem que acertar nas medidas econômicas. A crise maior, que fez com que a economia tivesse a queda que teve, decorreu da falta de confiança no Executivo.

 

Mas há medidas amargas pela frente. No momento em que o governo enfrenta uma crise política com a queda do ministro do Planejamento, Romero Jucá, qual é a estratégia para que essa base se mantenha?

O governo não vive crise política. Tem sustentação, tanto que aprovou o que tinha que aprovar. Romero Jucá entendeu que era melhor para o governo, para o Brasil e para ele se afastar do governo. Já condicionando que iria levar o caso ao Ministério Público e, se dissessem que não existe nada de ilícito e de ilegal, por certo gostaria de manter a posição no governo.

 

Há informações de que, em sua delação, o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado fez mais denúncias, que surgirão contra outros peemedebistas, além do presidente do Senado, Renan Calheiros, já citado por ele.

Cada dia com a sua agonia. Com relação a esse fato (envolvendo o senador Jucá) ainda não há uma denúncia.

 

Os desdobramentos da Lava Jato, atingindo nomes de peso do PMDB, não afetam a governabilidade?

Absolutamente não. Nós temos certeza de que o presidente Michel Temer passa ao largo dessa questão da Operação Lava Jato.

 

A presidente Dilma afirmou que as gravações feitas por Sérgio Machado contra Jucá comprovam que houve um caráter golpista no impeachment.

Tenho muita dificuldade em ouvir pessoas que tenham boa formação falar em golpe quando o processo é regido pelo Supremo Tribunal Federal e foi aprovado, até o momento, por mais de dois terços do Congresso.

 

O sr. acredita que Dilma pode voltar ao cargo?

Sob o ponto de vista legal é perfeitamente possível. Sob o ponto de vista fático, a menos que haja um acidente de percurso – não do governo, mas dos interesses da sociedade –, fica muito difícil que se tenha o retorno da presidente Dilma.

 

O governo anunciou que pretende limitar o crescimento com gastos em saúde e educação e já provocou críticas da oposição, que considera as mudanças inconstitucionais. É possível aprovar isso num ano eleitoral?

Temos de fazer mais com menos. Haverá uma guinada político-administrativa. Não há nada inconstitucional. Zero. Não vamos cair num discurso fácil e eleitoreiro porque não haverá corte de absolutamente nada para saúde e educação. O que queremos dizer é: não criem novos gastos.

 

O PT já anunciou que vai obstruir todas as votações...

Quem tem mais de dois terços de apoio no Congresso não tem medo de obstrução, nem de oposição.

 

Mas a reforma da Previdência, por exemplo, é um tema que divide muito o Congresso...

É um tema que anteriormente já dividiu o Congresso porque os atores não foram os formuladores. Aqui não será uma fórmula do governo. Essa reforma é absolutamente inquestionável. O governo quer que seja uma construção coletiva.

 

O sr. diz que o governo comandado por Dilma deixou um rombo de R$ 170,5 bilhões. Mas o PMDB também fazia parte do governo do PT, não?

É piada? O PMDB nunca integrou o núcleo duro do governo. O partido foi colocado como um apoiador periférico, como os outros aliados.

 

Quem errou foi o PMDB?

Quem errou fomos nós de aceitar essa submissão. Eu termino essa questão com uma imagem que, normalmente, eu uso nas aulas da Fundação Ulysses Guimarães. O PMDB consegue contrariar a Lei da Gravidade, que impera no sistema solar. Sendo o maior, girou em torno de menores. No caso, agora, girava em torno de um menor, que é o PT. / T.M,, E.D e V.R

 

Cortes

 

“Não há nada inconstitucional. Zero. Não vamos cair num discurso fácil e eleitoreiro porque não haverá corte de absolutamente nada para saúde e educação.”