O Estado de São Paulo, n. 44775, 20/05/2016. Política, p. A8

CUNHA EXPÕE DIVISÃO DA BASE DE TEMER

Depoimento de deputado afastado da Câmara no Conselho de Ética coloca em lados opostos PSDB, DEM e PPS e partidos do Centrão
Por: Julia Lindner/ Valmar Hupsel Filho/ Daiene Cardoso

 

Julia Lindner

Valmar Hupsel Filho

Daiene Cardoso / BRASÍLIA

 

O depoimento do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no Conselho de Ética ontem expôs a divisão na base aliada do governo Michel Temer em relação ao destino do parlamentar fluminense.

De um lado, enquanto PSDB, DEM e PPS defendiam uma punição severa ao peemedebista, partidos do Centrão – PP, PR, PSD, PTB e PSC – faziam uma defesa enfática de que ele não mentiu à CPI da Petrobrás ao dizer que não tinha contas no exterior, base da representação que pede a cassação do seu mandato.

Um dos primeiros a confrontar Cunha foi Nelson Marchezan Júnior (PSDB-RS). O tucano pediu que o peemedebista renunciasse ao cargo e parasse de influenciar o novo governo, sob a pena de ser preso por ordem do Supremo Tribunal Federal.

Rejeitando a tese de que Cunha transferiu patrimônio e não tinha autonomia sobre um trust do qual é beneficiário, Marchezan provocou dizendo que “se o trust fosse uma mulher, seria maravilhosa”. “Deve ser uma paixão cega, por colocar tanto volume de recursos e não controlá-lo.” “Trust não é uma mulher bonita, ele foi criado na Convenção de Haia, tem trilhões de dólares pelo mundo. A palavra quer dizer confiança, ele é transparente”, rebateu Cunha.

Disposto a pressionar o peemedebista, Marchezan questionou a origem do depósito de R$ 5milhõesque teriam sido enviados ao trust na Suíça e que, segundo ele, não foram declarados no Brasil. “Parece a todos nós uma simulação, tudo leva a crer que a trust é simulação para esconder recursos de origem não lícita”, acusou o tucano. O também tucano Betinho Gomes (PE) acusou Cunha de ter contas no exterior e omiti-las.Ele pregou a cassação do peemedebista. “Temos elementos suficientes para confirmar uma posição severa (contra o peemedebista)”, declarou.

 

Tropa de choque. Os tradicionais aliados de Cunha se mantiveram na linha de frente da defesa do deputado. Recém incorporado ao colegiado e com a missão de votar a favor do peemedebista, André Fufuca (PP-MA), comparou o caso do deputado afastado ao do atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

Fufuca lembrou que Meirelles foi acusado em 2005 de evasão de divisas por ter um trust, mas ocaso foi posteriormente arquivado pelo então procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza. “Tem gente aqui que critica, mas defende outras pessoas que também usufruíram disso. Falo isso, pois o trust é assegurado e protegido por um dos principais juristas, Francisco Rezek, inclusive ele assegurou a questão da especificidade do trust. Quem não conhece a história está condenado a repeti-la”, pregou Fufuca. Um dos que usaram o tempo para elogiar o depoimento do deputado afastado e defender a licitude do trust foi Laerte Bessa (PR-DF). “Queria agradecer Eduardo Cunha por estar presente e enfrentar esse corpo de jurados que está aqui. Eu digo que foi muito lícito as suas falas, o seu comportamento e as explicações que foram colocadas”, declarou.

 

Divergências. Além da posição em relação a Cunha, a base de Temer tem se dividido também em relação a outros temas. Anteontem, o Centrão emplacou André Moura(PSC-SE) como líder do governo em uma disputa contra o Rodrigo Maia (DEMRJ), apoiado pela antiga oposição ao governo do PT. Ambos também divergem sobre a situação do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PPMA).

O Centrão defende sua manutenção no cargo. A antiga oposição quer novas eleições.

O destino político de Cunha está nas mãos dos partidos que compõem a nova base governista. Atualmente, a base de sustentação do deputado na Câmara são os partidos do Centrão – um bloco com 225 parlamentares de 13 siglas (PP, PR, PSD, PRB, PSC, PTB, Solidariedade, PHS, PROS, PSL, PTN, PEN e PT do B).O grupo é hoje o maior bloco parlamentar da Casa.

Já a antiga oposição ao governo Dilma, composta por PSDB, DEM, PPS e PSB, tem 117 deputados.Além deles, defendem a cassação do peemedebista PT, PC do B, PSOL e Rede, que somam 79 votos na Casa.