Correio braziliense, n. 19356, 24/05/2016. Política, p. 2

JUCÁ, A PRIMEIRA BAIXA NA GESTÃO DE TEMER

JUCÁ, A PRIMEIRA BAIXA NA GESTÃO DE TEMER
Por: PAULO DE TARSO LYRA, NAIRA TRINDADE E JULIA CHAIB

PAULO DE TARSO LYRA
NAIRA TRINDADE
JULIA CHAIB

 

Em apenas 11 dias, a Lava-Jato derrubou o primeiro ministro do governo interino de Michel Temer. Romero Jucá anunciou ontem que deixará o Ministério do Planejamento para reassumir o mandato de senador após a divulgação de uma conversa dele com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, na qual os dois discutiam estratégias para estancar a “sangria” das investigações do escândalo de corrupção na Petrobras.

Com a queda de Jucá, quem passa a responder pelo ministério é o atual secretário executivo da pasta, Dyogo Oliveira. “Eu pedi ao meu advogado que prepare um documento, e nós estamos dando entrada hoje à tarde (ontem) para que tenhamos a posição do Ministério Público para ver se há algum tipo de irregularidade, de crime na conversa”, afirmou Jucá, em entrevista concedida no Congresso após o governo entregar aoPresidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), o projeto que altera a meta fiscal de 2016.

“Reassumo o Senado para fazer encaminhamento aqui até que o MP se manifeste. Eu sou presidente nacional do PMDB e não quero deixar que qualquer manipulação mal-intencionada atrapalhe o governo”, prosseguiu Jucá. No início da noite, o presidente interino, Michel Temer, divulgou uma nota oficializando a situação. “Registro o trabalho competente e a dedicação do ministro Jucá no correto diagnóstico de nossa crise financeira e na excepcional formulação de medidas a serem apresentadas, brevemente, para a correção do deficit fiscal e da retomada do crescimento econômico”, elogiou Temer. “Conto que Jucá continuará, neste período, auxiliando o governo federal no Congresso de forma decisiva, com sua imensa capacidade política”, prosseguiu o presidente interino.

 

Cobranças

Temer e os ministros mais próximos ficaram profundamente irritados com o vazamento da conversa de Jucá e Sérgio Machado. Pela manhã, Temer chamou o ainda ministro para o Palácio do Jaburu e exigiu que ele apresentasse explicações sobre o caso. Jucá já havia concedido entrevistas negando que a sangria à qual se referia na conversa tivesse relação com a Lava-Jato e, sim, com a crise econômica vivida pelo país.

O processo de fritura de Jucá começava ali. “Ele vai se explicar. Vamos ver se (as explicações) vão convencer a sociedade”, afirmou um interlocutor de Temer, no meio da manhã. Na entrevista coletiva, Jucá repetiu as mesmas argumentações já apresentadas, desafiou a imprensa a apresentar o conteúdo total da conversa, disse que a bolsa de valores estava caindo por medo de ele ser demitido e insistiu que não renunciaria ao cargo.

“Claro que essa situação me deixa incomodado, mas não vejo razões para deixar o ministério. Sei que o cargo é do presidente Temer e, enquanto tiver a confiança dele, permanecerei. Eu não nasci ministro e não vou morrer ministro. Eu sou senador, eleito por três vezes com votações sucessivamente maiores”, declarou Jucá.

Na mesma entrevista, Jucá disse que trabalhou para aprovar a recondução do procurador-geral, Rodrigo Janot, o que demonstrava que não tinha nada contra a Lava-Jato, mesmo sendo um dos investigados pela força-tarefa comandada pelo juiz Sérgio Moro. “Eu sempre disse e repito: a Lava-Jato é um novo paradigma para o país, pois altera a relação entre os políticos, os partidos, os empresários e o financiamento privado de campanhas”, completou Jucá.

As explicações não surtiram efeito. “É claro que Jucá não convenceu. Ele pode até ter ido bem, mas o presidente Temer tem a exata noção de que esta é uma batalha de mídia que não vai parar enquanto ele (Jucá) não deixar o cargo”, reconheceu um auxiliar próximo do presidente interino, tão logo Temer e os ministros mais próximos chegaram ao Congresso para entregar ao Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL), o projeto com a nova meta fiscal.

O encontro no Congresso deu a ideia do nível de tensão em Brasília. Temer foi recebido aos gritos de “golpista” e “traidor” por um grupo de parlamentares do PT. A deputada Moema Gramacho (PT-BA) teve um cartaz rasgado pelos seguranças do Senado enquanto pedia a prisão de Romero Jucá. “Jucá tem que ser preso, como Delcídio foi. Ele foi entregue pelo Senado de bandeja pelo STF e só depois teve direito a própria defesa pelo intermédio de uma delação.” Para Moema, o golpe foi desenhado por Jucá. “Eles queriam tirar a presidente Dilma e depois estancar a sangria da Lava-Jato”, atacou a parlamentar.

A costura para a exoneração de Jucá tinha sido feita ainda no Planalto, antes de a comitiva presidencial chegar ao parlamento. “Não achamos que isso possa vir a atrapalhar a votação da meta fiscal hoje. Mas era importante ‘limparmos o trilho’”, afirmou outro assessor presidencial.

Jucá disse que tomou a atitude para evitar “babaquice e a manipulação” do PT. “Não temos medo de cara feia e de gritaria, principalmente, de gente atrasada, que quebrou o país”, disse o peemedebista. Informado de que o senador Telmário Miranda (PDT-RR) pediria a cassação dele no Conselho de Ética, Jucá rebateu. “O senador Telmário tem que entregar a mulher dele, que está foragida. Ele deveria ter vergonha de estar nesta Casa representando Roraima”, arrematou.

 

Em viagem, Serra antecipa volta

Em Buenos Aires, o chanceler brasileiro, José Serra, comentou a saída de Romero Jucá do Planejamento e comentou sobre os rumores de que poderia ser o substituto do peemedebista no cargo. “Não vou dizer ‘não, não aceitaria’ porque se supõe que isso teria sido cogitado e não creio que esteja sendo cogitado. Mas quero dizer que pretendo implantar aquilo que propus no meu discurso de posse no Itamaraty. É uma tarefa fascinante e creio que estamos ganhando todo o corpo do Itamaraty. Tem muita coisa para fazer.” Na capital argentina, Serra reuniu-se, ao longo do dia, com a ministra das Relações Exteriores argentina, Susana Malcorra; o ministro da economia, Alfonso Prat-Gay; e o presidente Mauricio Macri. No fim da noite, Serra antecipou a volta a Brasília.