Correio braziliense, n. 19354, 22/05/2016. Economia, p. 10

GOVERNO TEM OPÇÃO PARA IDADE MÍNIMA

RETRATOS DO BRASIL » Meta do governo é fixar 65 anos (homens) e 63 (mulheres) para aposentadoria, mas pode haver modelo semelhante ao 85/95, começando em 90/100
Por: ANTONIO TEMÓTEO

ANTONIO TEMÓTEO

 

A reforma da Previdência defendida pelo governo de Michel Temer encontrará um difícil caminho pela frente. Além da resistência das centrais sindicais, o Palácio do Planalto já identificou indícios de rebelião no Congresso. Lideranças dos principais partidos que dão sustentação ao peemedebista dizem não estarem convencidas sobre as necessidades de mudança. Alertam que o governo está forçando a mão, pois sequer tem uma proposta pronta.

A maior resistência dos parlamentares está na definição de uma idade mínima para a aposentadoria. O governo fala em 65 anos para homens e 63 para mulheres, mas trabalha com uma alternativa, a soma de idade e tempo de contribuição como o modelo em vigor, o 85/95. A soma de anos, no entanto, seria superior a 90 anos para as mulheres e a 100 anos para os homens. Para técnicos do Ministério da Fazenda, alguma das regras tem que sair, pois o modelo em vigor está falido.

O governo está disposto a negociar. “Não há como ser intransigente em um tema tão polêmico, que provoca tanta comoção”, diz um integrante da equipe econômica. “Sabemos, também, que há muitas discrepâncias no mercado de trabalho. E isso precisa ser levado em consideração”, assinala. Na visão desse técnico, é preciso definir regras de transição que sejam mais suaves com os trabalhadores que estão prestes a se aposentar e mais rígidas com aqueles que estão mais distantes.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, reconhece as dificuldades para levar a reforma da Previdência adiante. Mas ressalta que alguma coisa precisa ser feita rapidamente para conter a forte deterioração do sistema. O deficit deste ano do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) chegará a R$ 146,3 bilhões, o equivalente a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB). É quase o triplo do observado em 2014, quando o rombo ficou em R$ 56,6 bilhões. Não há, no entender do ministro, como o Tesouro Nacional arcar com um aumento tão veloz desse buraco.

 

Garantias

Na opinião do economista Fabio Giambiagi, especialista em Previdência, o governo deve ser rigoroso em suas propostas, se quiser viabilizar o sistema de aposentadorias ao longo do tempo. Ele propõe idade mínima igual para homens e mulheres e regras semelhantes para trabalhadores urbanos e rurais. Caso não haja ambiente político para aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que exige maioria dos votos no Congresso, Giambiagi defende um projeto de lei para aumentar o tempo de contribuição de quem se aposenta por idade e prega mudança nas regras para concessão de pensões.

Rogério Nagamine, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), afirma que a reforma pretendida pelo governo deve atingir todos os trabalhadores que estão no mercado. Ele alerta que, se as mudanças ficarem restritas aqueles que entrarem no sistema depois da aprovação da reforma, haverá necessidade de se fazer ajustes futuramente. Para o especialista a definição de uma idade mínima é a melhor forma de garantir a sustentabilidade do pagamento de benefícios. “O ideal é que se tenha uma idade mínima equânime para homens e mulheres. Muitos países já eliminaram ou estão eliminando a diferenciação para requerimento de aposentadorias”, destaca.

O especialista em previdência Leonardo Rolim, consultor de orçamento da Câmara dos Deputados, ressalta que diversos deputados têm procurado a consultoria de Orçamento da Câmara para obter informações sobre Previdência e para pedir estudos sobre alternativas para enfrentar o problema. “A maioria dos parlamentares tem consciência da dimensão do problema e de que o Congresso tem uma grande responsabilidade com o futuro do país. Mas quer mais informações”, destaca.

 

Três perguntas para Leonardo Rolim, consultor de orçamento da Câmara dos Deputados

Por que a reforma da Previdência é importante?

Em primeiro lugar, porque é a maior despesa da União e vem crescendo muito nos últimos anos em função do envelhecimento da população. Portanto, não dá para se pensar em equilibrar as contas do governo sem controlar o crescimento dos gastos com a Previdência. Em segundo lugar, precisamos garantir às pessoas que estão contribuindo hoje que, no futuro, a aposentadoria será paga. Nosso modelo é de repartição simples, ou seja, é um pacto geracional: os trabalhadores atuais contribuem para pagar os benefícios dos que já se aposentaram. Nosso sistema previdenciário tem diversos problemas. Como o Brasil era um país jovem, conseguíamos pagar a todos. Em 2050, quando as pessoas que entraram no mercado de trabalho em 2015 se aposentarão pelas regras atuais, teremos três vezes o número de idosos de hoje, com um número de pessoas no mercado de trabalho apenas um pouco maior que o atual. Portanto, se não fizermos a reforma, a futura geração não terá como pagar nossas aposentadorias. Nós tomaremos um calote.

 

O senhor é favorável a uma idade mínima de 65 anos para homens e mulheres requererem a aposentadoria?

Sim. As mulheres com 60 anos vivem, em média, quatro anos a mais que os homens. Portanto, não tem nenhum sentido elas se aposentarem mais cedo. A questão da dupla jornada daquelas que são mães deve ser compensada com uma valorização financeira desse trabalho. Alguns países, como a Espanha e o Chile, pagam um adicional na aposentadoria das mulheres por filho que criaram. Entendo também ser importante igualar a idade em 65 anos para todos os regimes, inclusive os servidores públicos e trabalhadores rurais.

 

A reforma deve levar em conta os trabalhadores que já estão no mercado ou somente aqueles que entrarão nos próximos anos?

Se a regra for apenas para os novos trabalhadores terá impacto apenas daqui a três décadas. O país não aguenta até lá. Não dá para imaginar que seja viável manter as pessoas se aposentando por tempo de contribuição, em média, aos 54 anos de idade. A expectativa de vida dos brasileiros aumentou oito anos desde a Constituição de 1988 e vai aumentar mais sete anos até 2050. Não é possível continuarmos até lá com as mesmas regras.