Correio braziliense, n. 19336, 04/05/2016. Política, p. 2

Dilma e Lula na mira do procurador-geral

Rodrigo Janot pede ao Supremo Tribunal Federal que petistas sejam investigados por tentativa de obstrução da Justiça. STF também analisará se o ex-presidente vai virar réu por tentar comprar o silêncio de Cerveró

Por: Eduardo Militão

 

A uma semana de o Senado votar a admissibilidade do impeachment, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a abertura de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o advogado-geral da União José Eduardo Cardozo. Caso o STF conceda o aval, os três serão investigados juntos, sob a acusação de tentar obstruir as investigações da Operação Lava-Jato.

Para que a presidente seja formalmente alvo de um processo no STF, o procedimento ainda precisa ser autorizado pelo ministro Teori Zavascki. Não há um prazo predeterminado para que isso ocorra, e o ministro pode tanto decidir sozinho quanto levar o caso para a discussão no plenário. Ontem à noite, segundo o jornal o Estado de S.Paulo, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, se reuniu com o presidente do Supremo, Ricardo Lewandoswki. O motivo não foi divulgado. Depois da audiência, Cardozo foi ao encontro de Dilma.

Janot pediu a investigação contra os petistas com base na delação premiada do senador Delcídio Amaral (sem partido-MS) e do imbróglio causado pela tentativa de Dilma indicar Lula para ministro-chefe da Casa Civil. Para os procuradores envolvidos no caso, a nomeação do ex-presidente para o ministério fez parte de um “cenário” em que foram identificadas diversas tentativas de atrapalhar as investigações criminais da Lava-Jato, que apura o esquema de corrupção na Petrobras.

A decisão de Janot de pedir uma investigação contra Dilma ocorre no momento em que o Senado se prepara para votar o pedido de impeachment da presidente. Se o processo for aprovado pela maioria do plenário, Dilma ficará afastada do cargo por até 180 dias e o vice, Michel Temer, assumirá a Presidência em seu lugar. Dilma, no entanto, continua com foro privilegiado até a análise final do seu processo pelos senadores.  Por isso, a competência sobre os casos que envolvem a petista permanece do Supremo.

 

Denúncia

Em mais um desdobramento da Lava-Jato, Janot também denunciou Lula ao Supremo. A acusação foi feita porque o Ministério Público entende que o ex-presidente participou da “compra” do silêncio do ex-diretor de Internacional da Petrobras Nestor Cerveró. Se o Supremo receber a denúncia, o petista vira réu na Operação Lava-Jato, assim como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Paralelamente, a Procuradoria-Geral da República (PGR) ainda arrolou Lula e mais 30 pessoas em um pedido para serem investigados no Inquérito nº 3989, o chamado “quadrilhão”, que apura se uma organização criminosa formada por empresários e políticos montou um grande esquema de desvio de dinheiro na Petrobras e em outras estatais.

No Inquérito nº 4.170, que tramita de modo oculto no Supremo, o Ministério Público denunciou não só Lula, mas também o pecuarista José Carlos Bumlai, já em prisão domiciliar, e o filho Maurício Bumlai. A acusação foi incluída este ano em aditamento da denúncia contra o senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS), o seu chefe de gabinete Diogo Ferreira; o banqueiro André Esteves, do BTG Pactual; e o advogado Edson Ribeiro. Depois da colaboração premiada do parlamentar, a PGR encontrou fatos novos sobre o caso e ampliou o número de denunciados.

Ao pedir que Lula seja investigado no “quadrilhão”, Janot disse que certamente ele participava do esquema. “Essa organização criminosa jamais poderia ter funcionado por tantos anos e de uma forma tão ampla e agressiva no âmbito do governo federal sem que o ex-presidente Lula dela participasse”, afirmou o procurador-geral da República.

O Instituto Lula reagiu. Em nota, disse que a peça “indica apenas suposições e hipóteses sem qualquer valor de prova” e é “uma antecipação de juízo, ofensiva e inaceitável, com base unicamente na palavra de um criminoso”.

Em 7 de dezembro, a PGR havia denunciado Delcídio, Esteves, Ferreira e Rodrigues por tentarem silenciar Cerveró. Eles haviam sido presos em 25 de novembro depois que Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor, gravou reunião em que o senador, seu assessor e o advogado combinavam com ele uma rota de fuga para o réu da Lava-Jato que, àquela altura, tentava fechar uma delação premiada. A tentativa não deu certo. Nestor Cerveró realmente fechou o acordo, o quarteto foi preso por ordem do STF e denunciado em dezembro.

Na cadeia, Delcídio também fechou uma colaboração premiada. E afirmou que Lula foi quem ordenou a ele, em reunião no instituto que leva seu nome, a procurar Bumlai e obter dinheiro para pagar Cerveró. O ex-diretor recebeu R$ 250 mil, segundo o senador. Uma gravação de áudio no telefone de Ferreira mostra Maurício Bumlai orientando o assessor de Delcídio a entrar num carro no aeroporto. Ferreira, que também fez delação, disse que lá eram pegos os valores da família Bumlai e entregues ao advogado do ex-dirigente da Petrobras.

“Tais fatos deram origem à prisão de todos os envolvidos e à propositura da Ação Penal n° 4170/STF”, explicou Janot, em uma manifestação no inquérito do “quadrilhão”. Com as novas informações, o petista, o pecuarista e o filho foram denunciados. “A partir das investigações ganharam novos contornos e se constatou que Luiz Inácio Lula da Silva, José Carlos Bumlai e Maurício Bumlai atuaram na compra do silêncio de Nestor Cerveró para proteger outros interesses, além daqueles inerentes a Delcídio e a André Esteves, dando ensejo ao aditamento da denúncia anteriormente oferecida nos autos 4.170/STF.”

 

Grande esquema

Se o pedido de incluir as 31 pessoas na investigação for aceito, o que é praxe, a apuração passará a ter 69 investigados. O Inquérito nº 3.989 quer saber se um grupo de políticos promoveu indicações políticas em estatais, notadamente na Petrobras, a fim de obter propinas de fornecedoras das empresas, como as grandes empreiteiras.

O Ministério Público pediu que as delações premiadas de Delcídio, de Cerveró e dos executivos da Andrade Gutierrez fossem anexadas ao processo. Também foi solicitado que as apurações sejam prorrogadas por mais cinco meses.

 

180 DIAS

Período que a presidente Dilma será afastada temporariamente do cargo se o Senado aceitar a admissibilidade do pedido de impeachment

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