Machado cita 'mensalão' da cúpula do PMDB

Marcelo Godoy , Fausto Macedo , Julia Affonso , Mateus Coutinho , Julia Lindner , Isabela Bonfim

16/06/2016

O delator Sérgio Machado afirmou à Lava Jato que pagou de 2008 a 2014 um mensalão para a cúpula do PMDB. Os pagamentos começaram depois que o senador Edison Lobão (MA) foi nomeado ministro das Minas e Energia, ainda no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Os valores eram de R$ 200 a R$ 300 mil por mês. Além de Lobão, receberiam a propina mensal o presidente do Senador, Renan Calheiros (AL), o senador Romero Jucá (RR) e o ex-presidente José Sarney (MA).

Calheiros, Jucá e Sarney tiveram conversas gravadas por Machado. Nelas, segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, eles tramam a obstrução da Lava Jato. Por isso, ele pediu a prisão dos três, que foi negada pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal.

Machado afirmou que foi procurado individualmente pelos peemedebistas. Em seus relatos sobre a propina para os políticos, ele diz que todos lhe pediam ajuda para que pudessem manter “sua base eleitoral”. Assim teria ocorrido com o ex-presidente Sarney. O primeiro repasse do “fundo da propina” gerenciado por Machado ao então senador foi de R$ 500 mil. Entre 2004 e 2007, os pagamentos aos políticos eram, segundo o delator, “erráticos”. Depois, além do mensalão, os homens da cúpula do PMDB receberiam propina por meio de doações oficiais para campanhas eleitorais em 2010, 2012 e 2014. O dinheiro nesse caso era depositados para o diretório nacional do partido ou para os estaduais.

Assim, Sarney teria recebido R$ 18,5 milhões, dos quais R$ 2,25 teriam sido pagos por meio de doações oficiais. No caso de Jucá, Machado afirma que fazia a entrega do dinheiro pessoalmente - na maioria das vezes, no gabinete do senador. Por mês, o senador receberia R$ 200 mil. Ao todo, Machado diz que pagou R$ 21 milhões a Jucá. O delator diz que se reunia com Renan na casa do presidente do Senado. Ele conta que dava R$ 300 mil por mês, além de doações oficiais para eleições. O senador teria recebido R$ 32 milhões, dos quais R$ 8,2 milhões em doações oficiais.

Machado contou ainda que Lobão queria ter a maior mesada entre os peemedebistas - R$ 500 mil. Machado afirmou ter dito ao então ministro que esse valor era impossível, que o máximo que conseguiria seria R$ 300 mil. O dinheiro seria entregue em um escritório no Rio, para Márcio Lobão, filho do senador. Pelas contas de Machado, Lobão recebeu R$ 24 milhões - R$ 2,75 milhões em doações durante campanhas eleitorais.

Por fim, Machado também relatou pagamentos a mais três senadores do PMDB: Jader Barbalho (PA), que teria ficado com R$ 4,25 milhões; Valdir Raupp (RO), com R$ 850 mil, e Garibaldi Alves (RN), que teria obtido R$ 450 mil para a campanha de seu filho, Walter Alves. Já o ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves (PMDB) teria recebido R$ 1,55 milhão.

‘Estrume’. Renan afirmou que a delação o “cita, mas não prova nada”. Disse ainda que todas as doações foram legais. O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende Sarney, Jucá e Lobão, afirmou que eles “negam peremptoriamente terem recebido qualquer montante” do delator. Sobre Machado, Jader disse: “Eu não leio sobre estrume, que é o que esse criminoso é. Não perco o meu tempo”. Raupp afirmou que nunca pediu doações a Machado. O PMDB informou que “sempre arrecadou recursos seguindo os parâmetros legais”.

Garibaldi negou qualquer irregularidade. Henrique Alves disse repudiar“ a irresponsabilidade e leviandade das declarações desse senhor”. / MARCELO GODOY, FAUSTO MACEDO, JULIA AFFONSO, MATEUS COUTINHO, JULIA LINDNER e ISABELA BONFIM

‘Legais’ “

As doações eleitorais que recebi foram legais e com contas prestadas à Justiça, de modo que eu não tenho nada a temer.”

Renan Calheiros

Presidente do Senado

A DELAÇÃO

● O ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado envolveu o presidente em exercício Michel Temer e mais de 20 políticos em propinas na estatal

Como funcionava o esquema, segundo o delator

1 Políticos

Indicavam pessoas para cargos em estatais e órgãos públicos em troca de vantagens indevidas

OS RECURSOS REPASSADOS A POLÍTICOS ERAM ILÍCITOS, MAS MUITOS REPASSES FORAM FEITOS POR MEIO DE DOAÇÕES OFICIAIS

2 Gestores de estatais

Tinham de, além de administrar a empresa, arrecadar propina para os políticos que os indicaram

PORCENTUAL COBRADO DAS EMPRESAS VARIAVA, SEGUNDO MACHADO, DE 1% A 3% DOS CONTRATOS

3 Empresas

Em troca de contratos e projetos nas estatais e nos órgãos públicos, pagavam vantagens indevidas

O que Machado disse

Michel Temer

(PMDB-SP)

O delator relatou operação de captação de recursos ilícitos, envolvendo o presidente em exercício, para abastecer, em 2012, a campanha do então candidato Gabriel Chalita para a Prefeitura de São Paulo. Machado informou que faria um repasse por meio de uma doação oficial no valor de R$ 1,5 milhão

Renan Calheiros

(PMDB-AL)

Machado afirma que pagou propina ao presidente do Senado, por cerca de 10 anos, de 2004/2005 a 2014, enquanto presidia a estatal por indicação da cúpula do PMDB. Neste período, diz, dos pagamentos ilícitos decorrentes do esquema de corrupção na Transpetro, que somaram R$ 100 milhões ao PMDB, R$ 32 milhões foram para Renan

Edison Lobão

(PMDB-MA)

O senador recebeu, segundo Machado, R$ 24 milhões de propina. O valor representa quase um quarto de todos os recursos que Machado alega ter pago ao PMDB ao longo dos 11 anos em que esteve no comando da subsidiária, que somam, segundo o delator, R$ 100 milhões

José Sarney

(PMDB-AP)

Segundo o delator, o ex-presidente recebeu R$ 18,5 milhões do dinheiro de propina da subsidiária da Petrobrás, durante o período em que ele dirigiu a companhia

Aécio Neves

(PSDB-MG)

Relatou a existência de um esquema de corrupção para eleger o atual presidente da legenda, senador Aécio Neves (MG), à presidência da Câmara em 2000. Aécio, de acordo com Machado, recebeu na época R$ 1 milhão

Outros políticos citados

● Romero Jucá (PMDB-RR), senador

● Jader Barbalho (PMDB-PA), senador

● Valdir Raupp (PMDB-RO), senador

● Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ministro do Turismo

● Garibaldi Alves (PMDB-RN), senador

● Walter Alves (PMDB-RN), ex-deputado

● Agripino Maia, senador (DEM-RN)

● Felipe Maia (DEM-RN), deputado

● Heráclito Fortes (PSB-PI), deputado

● Jandira Feghali (PC do B-RJ), deputada

● Marco Maia (PT-RS), deputado

● Luiz Sérgio (PT-RJ), deputado

● Jorge Bittar (PT-RJ), ex-deputado

● Francisco Dornelles (PP-RJ), governador em exercício do Rio

● Cândido Vaccarezza (PT-SP), ex-deputado federal

● Edson Santos (PT-RJ), ex-deputado federal

● Ideli Salvatti (PT-SC), ex-ministra

● Sérgio Guerra (PSDB-PE), senador (morto em 2014)

● Teotônio Vilela Filho (PSDB-AL), ex-senador

 

 

O Estado de São Paulo, n. 44802, 16/06/2016. Política, p.A5