Correio braziliense, n. 19344, 12/05/2016. Política, p. 11

Acordo no apagar das luzes

Delegados e peritos acertam reajuste, mas, para valer, Temer terá que negociar aprovação de PL que muda LDO

 

Os servidores públicos que não assinaram acordos salariais até o envio da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) ficarão nas mãos de Michel Temer, independentemente do avanço nas negociações de última hora. Ontem, uma reunião foi convocada pela Secretaria de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho (SEGRT) com três categorias para negociar: Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e analistas de infraestrutura. No entanto, qualquer proposta aceita precisará de uma negociação do novo governo para aprovação do Projeto de Lei nº 1/2016, que permite alteração na LDO.

A reunião com representantes dessas categorias seguiu noite adentro e até o fechamento desta edição haviam assinado acordo delegados e peritos da PF — R$ 3 mil mais 10,8% em janeiro de 2017; 4,75% em 2018 e 4,50% em 2019. Os agentes ainda tentavam melhorar a proposta de R$ 1,8 mil, acrescido dos mesmos percentuais e prazos propostos aos demais.

Em telefonema, a secretária interina da SEGRT, Edina Maria Rocha Lima, propôs aos representantes da AneInfra — que representa os analistas de infraestrutura — um aumento de 27,9% até 2020. O Ministério do Planejamento não informou o que foi negociado com os policiais rodoviários.

A decisão de retomar as negociações foi tomada depois de o diretor-geral da Polícia Federal (PF), delegado Leandro Daiello, em comunicado interno, fazer duras críticas ao governo Dilma Rousseff. A ordem teria partido da própria presidente para que o Planejamento voltasse a tentar entendimento.

 

Comunicado

Em mensagem aos subordinados, Daiello lamenta que o governo petista não prestigia a corporação “que estanca a sangria dos cofres públicos, investiga, combate a corrupção e apura irregularidades sempre fiel ao regramento jurídico e de forma republicana, sai das negociações sem nenhuma sinalização de reconhecimento”.

Para o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fanapef), Luís Antônio de Araújo Boudens, seria essencial firmar o acordo com o governo Dilma, mesmo com a instabilidade política. “Todo o histórico de defasagem e negociação ocorreu nesse governo, era importante que o ciclo fosse encerrado.”

A realidade, no entanto, é que, mesmo fechando valores e percentuais no apagar das luzes da gestão Dilma, nada ficou garantido para essas categorias, que se sentaram à mesa de negociação. E se há dificuldade para fazer valer o que foi acordado ontem, pior é a situação das carreiras que estão com tudo em aberto, como a dos analistas técnicos de políticas sociais, peritos federais agrários do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), servidores do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e diplomatas.

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Comoção na Esplanada

 

A quarta-feira foi marcada por despedidas na Esplanada dos Ministérios. Com a decisão do Senado de afastar a presidente Dilma Rousseff, boa parte dos funcionários que ocupam cargos comissionais, os DAS, pediram exoneração. A  alegação foi a de que não havia por que esperar pela posse de Michel Temer para serem demitidos.

Ao longo do dia, o que mais se viu nos prédios dos ministérios foi gente descendo nos elevadores carregando caixas e bolsas com pertences pessoais. “Houve muito choro”, contou um servidor do Ministério do Planejamento. Segundo ele, também ocorreram manifestações favoráveis à presidente Dilma, mas nada que chegasse a provocar tumultos.

A expectativa é de que a edição de hoje do Diário Oficial da União (DOU) traga um grande número de desligamentos, sobretudo de pessoas que ocupavam DAS com salários mais elevados. As pessoas que ocupavam esses cargos estavam em funções de confiança. Preferiram não criar constrangimentos para os nomeados por Temer.

 

Preocupação

No Ministério da Fazenda, o clima foi de consternação. Na contagem regressiva para deixar o posto, o ministro Nelson Barbosa reuniu toda a equipe no gabinete para se despedir. No discurso, disse que tinha feito o possível dado o momento tão conturbado que o país vive. Muitos não contiveram a emoção.

Barbosa ressaltou, porém, que seu substituto, Henrique Meirelles, tem condições de fazer um bom trabalho e deve seguir na missão de dar andamento às propostas já feitas pela pasta. Uma delas, renegociar as dívidas com os estados. Para quebrar o clima de fim de festa, o ministro abriu uma sessão de fotos.

No Ministério do Trabalho e da Previdência Social, desde cedo, os comissionados trataram de limpar as gavetas. As redes internas da pasta foram inundadas de e-mails de adeus. A maior preocupação dos que estavam indo para casa era com a proposta de Temer de transferir a Previdência para a Fazenda. Muitos disseram que a fusão não daria certo, devido à pesada estrutura que controla o sistema de aposentadoria.

A debandada no Trabalho e na Previdência só não foi grande porque o ministro Miguel Rosseto se recusou a assinar os pedidos de exoneração. Ele recomendou aos ocupantes de cargos em comissão que esperassem pelo novo chefe da pasta. Isso não minimizou a tensão. Dirigentes do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que foram convocados para uma reunião, acreditam que uma “limpeza” está por vir.

Pelos cálculos do Ministério do Planejamento, há, hoje, na Esplanada, mais de 21 mil cargos DAS, dos quais, segundo levantamento da equipe de Michel Temer, pelo menos 10 mil estão ocupados por pessoas indicadas pelo PT, partido da presidente Dilma. Os salários chegam a R$ 13,9 mil.

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