Para Teori, é preciso 'remédio amargo' para país 'enfermo'

24/06/2016

No dia em que a Operação Lava-Jato voltou a atingir o PT, o relator da investigação no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Teori Zavascki, discursou no Palácio do Planalto em solenidade organizada pelo presidente interino Michel Temer para prestigiar oJudiciário. Num tom político, Teori, que há pouco rejeitou pedidos de prisão contra caciques do PMDB, disse que o Brasil "está enfermo", que é preciso coragem para administrar "remédios amargos", empenho para reencontrar a "prosperidade econômica" e defendeu a "convergência de esforços" entre os três Poderes para construir "o país que sonhamos". Após o evento, Temer rebateu acusações de que haveria interferência de seu governo na Lava-Jato.

Teori: "Estamos passando, no Brasil, é preciso reconhecer, momentos de grandes dificuldades. O país está enfermo"

"Estamos passando, no Brasil, é preciso reconhecer, momentos de grandes dificuldades. O país está enfermo, às voltas com graves crises de natureza econômica, política e ética. Sem dúvida, é preciso que as enfermidades sejam tratadas, como estão sendo, e que tenhamos a coragem de ministrar os remédios amargos para tanto necessários", disse Teori, que investiga as autoridades implicadas na investigação com foro privilegiado. Na semana passada, ele rejeitou os pedidos de prisão contra o ex-presidente José Sarney, o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL) e o ex-ministro do Planejamento e senador Romero Jucá (RR), todos do PMDB e aliados de Temer.

Teori compareceu à cerimônia no Planalto como representante do presidente do STF, Ricardo Lewandowski, que se ausentou. Teori também foi autor do anteprojeto inicial de regulamentação do mandado de injunção, norma que Temer sancionou ontem e assegura o exercício de direitos constitucionais.

"É preciso empenho para formar os alicerces do reencontro com a prosperidade econômica, com um construtivo ambiente político e com a prevalência dos padrões éticos que a nação exige", completou. Por fim, o ministro lembrou que a lei sancionada derivou de um pacto entre os três poderes. "O seu sucesso nos mostra que a convergência de esforços entre os Poderes do Estado é o caminho virtuoso e seguro para a construção do país que sonhamos".

Durante a tarde, após a solenidade em que recebeu as credenciais dos novos embaixadores, Temer voltou a negar qualquer interferência do seu governo na Lava-Jato. "O que temos dito com muita frequência é que não haverá a menor possibilidade de interferência na Lava-Jato", reiterou. "Ao contrário, o que deve haver sempre é o apoio verbal, e não de ação. Porque se eu induzirum apoio de ação e colocar o Executivo trabalhando nessa matéria, estarei invadindo a competência que, na verdade, é do Judiciário, de um lado, do Ministério Público, do outro, e com apoio da Polícia Federal".

Logo no início da manhã, Temer reuniu os ministros que formam o "núcleo institucional" para discutir mudanças na lei de leniência e a segurança nos Jogos Olímpicos. Temer instituiu nesta semana uma nova coordenação do governo, agora dividido em núcleos: econômico, institucional e político. Temer cobrou do núcleo econômico medidas para reanimar a economia.

Após a reunião do núcleo institucional, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, também rechaçou acusações de petistas de que haveria digital do governo na Operação Custo Brasil, que levou à prisão do ex-ministro do Planejamento Paulo Bernardo.

Questionado pela imprensa se sua visita ao juiz Sergio Moro, em Curitiba, na semana passada, tinha ligação com a operação, Moraes respondeu que desconhecia as críticas, porque "em vez de ficar fazendo fofoca", estava trabalhando desde cedo. "Isso é um desrespeito, por parte de quem fala - sejam petistas ou não -, à Justiça brasileira, ao Ministério Público, e à Polícia

Federal. Não há nenhuma relação com a minha visita institucional de apoio à Lava-Jato", disse o ministro. "O governo anterior jamais apoiou institucionalmente a Lava-Jato, nunca apoiou o combate à corrupção, o governo Temer apoia, e não tem vergonha de dizer isso", afirmou. "Minha visita foi de apoio e oferecimento de infraestrutura e recursos humanos", completou. Por fim, lembrou que os mandados de prisão e de busca e apreensão têm datas anteriores à sua visita a Moro.

A solenidade de ontem foi idealizada por Temer e pelo ministro do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, para demonstrar "sintonia" entre a gestão do interino - que é professor de direito constitucional - e o Judiciário, num momento de turbulência nas relações entre os três Poderes. De um lado os desdobramentos da Lava-Jato, e do outro, a pressão pelo reajuste salarial dos ministros e dos servidores do Judiciário, à qual Temer resiste.

A sanção de Temer à lei que regulamenta o processo do mandado de injunção individual e coletivo deriva de um "pacto republicano" firmado em 2009, na gestão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que Michel Temer era presidente da Câmara dos Deputados e José Sarney presidia o Senado. O ministro Gilmar Mendes, do STF, era o presidente do comitê executivo do pacto.

 

Valor econômico, v. 16, n. 4033, 24/06/2016. Política, p. A5