O Estado de São Paulo, n. 44791, 05/06/2016. Política, p. A7

Concessões de Temer estimulam cobiça na Câmara

Indicação do governo interino de que não pretende comprar briga com categorias motiva demandas dos deputados por cargos e emendas

Por: Erich Decat

 

As concessões feitas pelo governo de Michel Temer neste início de gestão interina motivaram a base aliada na Câmara a ampliar demandas por cargos e emendas parlamentares. As movimentações dos deputados ocorrem em meio aos sinais dados pela cúpula do governo de que pretende evitar qualquer tipo de atrito com setores organizados da sociedade e categorias como o funcionalismo público.

Entre os gestos da cúpula do governo lembrados pelos parlamentares estão o recuo dos cortes orçamentários do programa Minha Casa Minha Vida e o aumento concedido aos servidores, que deverá ter um impacto de cerca de R$ 58 bilhões aos cofres públicos até 2018. Tentando pegar carona no ímpeto conciliatório do governo, deputados têm enviado recados ao Palácio do Planalto indicando que trégua e a boa vontade na Casa nos últimos dias, demonstrada nas tranquilas aprovações da revisão da meta fiscal e da emenda constitucional da Desvinculação das Receitas da União (DRU), vai até a votação definitiva do impeachment, prevista para ocorrer até agosto.

 

Demitidos. Líderes da base de Temer afirmam que uma das principais queixas está na demora para nomear os comissionados que no governo Dilma Rousseff se colocaram a favor do impeachment e por isso foram demitidos pela petista. De acordo com cálculos de um peemedebista, que esteve no início da semana passada no Planalto para tratar do tema, ao menos 100 cargos comissionados, divididos entre o Ministério da Agricultura, Minas e Energia, Previdência e Ibama, se encontram nessa situação.

A promessa do governo interino, conforme líderes que perderam os cargos no governo Dilma, era de que “tudo seria resolvido” na primeira semana da gestão Temer, o que não ocorreu.

Outro foco de apreensão de integrantes da base aliada é o prazo para se empenhar as emendas parlamentares. Segundo relatos, desde a mudança de governo, ocorrida há quase um mês, a execução das emendas está congelada. Os recursos são normalmente aplicados nos redutos eleitorais do parlamentares. A maior preocupação de integrantes da base está no fato de que a Lei Eleitoral proíbe a execução de obras e serviços com recursos das emendas nos três meses que antecedem as disputas. Com a realização das eleições municipais em outubro, dentro do calendário legal, o governo terá até o fim deste mês para atender às reivindicações dos integrantes da base.

 

‘Dentro do possível’. O cumprimento deste prazo é considerado, contudo, como pouco provável pelo ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves. A pasta é um dos principais destinos das emendas. “Não sei se tudo vai ser liberado antes das municipais. Temos uma estrutura muito pequena, mas vamos atender agora dentro do possível”, afirmou o ministro ao [BOLD]Estado[/BOLD]. Segundo ele, o valor estimado em emendas aplicadas na pasta gira tem torno de R$ 80 milhões.

Diante da possibilidade de atrasos na liberação de recursos, integrantes da cúpula do PP, um dos principais partidos de sustentação do governo, procuraram na quinta-feira passada o ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria Geral do Governo) para tratar do tema. Segundo relatos, o ministro se comprometeu a avaliar um possível cronograma de liberação das emendas após se reunir com representantes do Ministério da Fazenda. Enquanto isso, representantes da base aliada seguem a orientação de não dar sinais de “ruídos” com o Palácio do Planalto e manter as reivindicações de maneira reservada. O receio de parte dos aliados é de que ao pressionar publicamente Temer estará sendo colocado em xeque a governabilidade do presidente em exercício, o que poderia abrir espaços para o retorno da presidente afastada Dilma Rousseff.

 

Elogio

O presidente em exercício Michel Temer fez um elogio público aos parlamentares na quinta-feira passada. Disse que é uma "felicidade" ver a Câmara e o Senado trabalharem "ativamente".

Órgãos relacionados:

_______________________________________________________________________________________________________

Com voto decisivo, Tia Eron é cortejada por ‘cunhistas’

PERFIL - Tia Eron (PRB-BA), deputada federal

Por: Daiene Cardoso

 

Deputada de primeiro mandato, a baiana Tia Eron (PRB) ganhou notoriedade nos últimos dias por estar no centro da disputa no Conselho de Ética entre aliados do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e os que defendem sua cassação.

Sob bombardeio dos dois lados, Eronildes Vasconcelos completou na quinta-feira 44 anos. Aos 8, passou a frequentar, ao lado da mãe, a Igreja Universal do Reino de Deus e fez de sua atuação na igreja a base para a carreira política, iniciada no antigo PFL (hoje DEM). O nome político “Tia Eron” surgiu da época em que lecionava na Escola Bíblica Infantil para os filhos dos fiéis da igreja enquanto os pais assistiam ao culto. Em quatro mandatos como vereadora em Salvador, Tia Eron atuou longe dos holofotes, mas ainda assim conseguia se reeleger com votações expressivas graças ao envolvimento com a igreja evangélica.

Um dos projetos de autoria da então vereadora foi a “Lei Antibaixaria”, que proíbe o uso de recursos públicos para contratação de artistas que exponham mulheres ao constrangimento em suas músicas ou coreografias.

Em Brasília, Tia Eron chegou se impondo como negra, mulher, nordestina, viúva e mãe de dois filhos. Eleita pelo PRB com mais de 116 mil votos, Eron declarou à Justiça Eleitoral um patrimônio de R$ 270,6 mil e um gasto de campanha de R$ 177 mil, financiado por doações vindas de pessoas físicas e do diretório nacional do PRB.

 

Causas. No Congresso, encampou projetos como o que institui a prioridade para mulheres responsáveis pelo núcleo familiar na tomada de microcrédito e a proposta que estabelece que a suplência de uma deputada seja exercida por mulher. Em seu currículo, a deputada vangloria-se de ter relatado o projeto que obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) a fazer gratuitamente cirurgia reparadora em mulheres vítimas de violência doméstica. Entre suas propostas de combate ao preconceito racial, Tia Eron apresentou um projeto que atribui à Polícia Federal a apuração de crimes relacionados à discriminação ou preconceito de cor, etnia, religião ou nacionalidade.

Mas foi na bancada evangélica que a deputada foi recebida como reforço de peso. Em seu primeiro voto como deputada empossada, seguiu o bloco e ajudou a eleger Eduardo Cunha presidente da Câmara. Como membro da bancada evangélica, Tia Eron assinou o projeto que susta o direito de travestis e transexuais de usarem no âmbito da administração pública o nome social. Ela votou favorável à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.

O desempenho alçou a deputada ao posto de presidente estadual do partido.

Mas os colegas de Congresso passaram a notá-la efetivamente quando assumiu a vaga deixada por Fausto Pinato (PP-SP) no Conselho de Ética da Câmara. Seu apoio à eleição de Cunha e os elogios à gestão do peemedebista como presidente da Casa geraram dúvidas de que havia uma manobra em curso para favorecer o deputado. Ela não esconde as pressões, principalmente do eleitorado pedindo a cassação do peemedebista, e garante que sabe lidar com os “apelos” dos colegas de Casa. “Você está diante de uma mulher que tem coragem para caramba”, disse.

Órgãos relacionados: