Título: O mundo que consumimos
Autor: Blauth, Patrícia; Cidrin, Fabio
Fonte: Correio Braziliense, 15/10/2011, Opinião, p. 23

Bióloga, diretora da Menos Lixo - projetos e educação em resíduos sólidos

Engenheiro agrônomo, coordena o Programa Educação para Sociedades Sustentáveis da ONG ambientalista WWF-Brasil

O que acontece com o lixo depois que sai da nossa casa? De onde vêm as coisas que viram lixo? O que acontece antes que os produtos apareçam no supermercado? Perguntas como essas, não muito comuns no dia a dia, nos ajudam a entender um pouco os impactos relacionados ao consumo. Neste sábado, quando se comemora o Dia do Consumo Consciente, temos (mais) uma oportunidade para refletir sobre nossos hábitos e atitudes.

Sempre que ouvimos falar em consumo consciente, ou consumo responsável, nossa tendência é pensar que isso tem a ver com responsabilidades do consumidor. Isso é verdade, mas apenas em parte. O consumidor tem responsabilidades, sim, mas também toda a cadeia envolvida no ato de consumo — da produção dos bens ao descarte.

Praticar o consumo responsável, em primeiro lugar, é não aceitar que a indústria de bens nos imponha seus valores. Quando assistimos às propagandas na tevê ou em outros veículos, temos a impressão de que só nos realizaremos se tivermos aquele carro e aquele telefone. Temos a impressão de que precisamos consumir muito para sermos muito felizes. Mas, será? Um brinquedo não faz uma criança feliz se ela não puder brincar com seus pais e amigos.

Consumo responsável significa, ainda, uma relação mais amigável com a natureza, considerar de onde saem todos os produtos que usamos. Significa economia de recursos naturais, de energia e de água, menos poluição, mais cuidado com o planeta.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), aprovada no ano passado, estabeleceu o princípio da responsabilidade compartilhada. Isso quer dizer que todos — fabricantes, importadores, distribuidores, comerciantes, titulares dos serviços de limpeza e consumidores — são responsáveis pela "vida" dos produtos.

Portanto, não apenas o consumidor, mas todos os envolvidos devem levar em conta: quais são os processos industriais para produzir determinada mercadoria? No caso de um frango: como é produzida a ração dos animais? Ela envolve desmatamentos? Venenos que contaminam o solo e a água? Como os animais são criados? É justa a relação das indústrias com seus colaboradores? Qual a qualidade do produto que chega ao mercado? Está livre de hormônios e antibióticos? É saudável? A embalagem é realmente necessária? Ela é, pelo menos, reciclável ou reaproveitável? O que ocorre com ela depois que consumimos o frango? O poder público destinará adequadamente esses resíduos?

No WWF-Brasil estamos nos fazendo essas perguntas cada vez mais. No âmbito do Programa Água Brasil, iniciativa do Banco do Brasil, desenvolvemos, com a Fundação Banco do Brasil e a Agência Nacional de Águas, ações voltadas à promoção do consumo responsável e da coleta seletiva para reciclagem e compostagem.

Em cinco cidades de portes diferentes, nas cinco regiões brasileiras — Belo Horizonte (MG), Caxias do Sul (RS), Natal (RN), Pirenópolis (GO) e Rio Branco (AC)—, realizamos experiências que possam ser replicadas nos mais de 5 mil municípios brasileiros. O principal objetivo é a mudança de percepção e comportamento da população, que é chamada a cobrar uma cadeia produtiva sustentável, que se estende da produção à destinação dos resíduos.

Precisamos reduzir resíduos e exigir das autoridades sua correta destinação. A PNRS determina o fim dos lixões em todos os municípios brasileiros e no Distrito Federal em 2012. Brasília não tem aterro sanitário e o serviço de coleta seletiva é incipiente, assim como a participação da população. A capital do país deposita seus resíduos sólidos em lixões, de onde centenas de catadores retiram seu sustento, em condições de trabalho insalubres. Brasília colabora para um número espantoso divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente: o país perde, todos os anos, cerca de R$ 8 bilhões por não reciclar seus resíduos sólidos, sem contabilizar, ainda, os custos com a coleta e o aterramento desses materiais.

Neste Dia do Consumo Consciente, fica nosso convite para que cada um reflita sobre as consequências de seu consumo e sobre o que podemos fazer para construir um mundo mais sustentável. Um mundo que tenha, como disse um lixólogo, mais conteúdo e menos embalagem, mais esporte e menos material esportivo, mais carinho e menos presente, menos brinquedo e mais brincadeira.