O Estado de São Paulo, n. 44795, 09/06/2016. Política, p. A6

Conselho critica ação do Planalto para salvar Cunha

Presidente do colegiado, José Carlos Araújo, afirma que percebeu ‘jogo de cartas marcadas’ para favorecer o deputado afastado

Por: Daiene Cardoso / Elizabeth Lopes / Igor Gadelha

 

Integrantes do Conselho de Ética reagiram ontem, 08, contra as ações do Palácio do Planalto sobre o PRB para pressionar a deputada Tia Eron (PRB-BA) a votar contra o pedido de cassação do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Em entrevista à Rádio Estadão, o presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PR-BA), disse que adiou a sessão de votação do parecer do relator Marcos Rogério (DEM-RO) quando percebeu que havia um “jogo de cartas marcadas” para favorecer Cunha. “O problema não é a vitória ou a derrota (de Cunha nessa votação), eu estou dirigindo o conselho para votar, agora o que não é certo é ter um jogo de cartas marcadas. Senti naquele momento que o governo entrou no jogo e decidia a favor de Eduardo Cunha”, afirmou Araújo.

O deputado disse que o adiamento é previsto no Regimento Interno e classificou sua atitude de “manobra do bem”. Ele espera que Tia Eron, voto decisivo para definir o futuro político de Cunha na Casa, reflita e vote na sessão remarcada para a próxima terça-feira. “Que Tia Eron repense e o próprio governo (Michel Temer) também repense porque este não é um assunto de governo, é assunto da Câmara dos Deputados, um problema de ética e decoro, o governo não tem que se envolver”.

O relator também condenou publicamente as pressões sobre a deputada. “Não dá para compreender que o governo queira se meter numa briga que é da Casa. Não acredito que o presidente (em exercício) Michel Temer tenha qualquer tipo de envolvimento nessa matéria. Ele tem problemas maiores, acho que não se daria ao trabalho de se envolver.”

 

Quebra de decoro. Rogério disse que não vai alterar seu parecer e manterá a recomendação de perda de mandato, rejeitando assim a proposta do deputado João Carlos Bacelar (PR-BA) para suspender Cunha por três meses. Rogério disse que tanto ele quanto Bacelar concordam que houve quebra de decoro parlamentar. Ele, no entanto, considera que as provas demonstram que Cunha omitiu informação relevante da Câmara para ocultar as contas na Suíça. “Não poderia sugerir uma pena mais branda. Aliados de Cunha já dão como certo o voto de Tia Eron no conselho contra a cassação de Cunha. Segundo um membro da “tropa de choque” de Cunha, os líderes da Universal do Reino de Deus, igreja que a deputada frequenta, tiveram papel central para fazê-la “votar com ele”. Os dirigentes do PRB ligados à igreja negam a pressão. “A choque os votos no conselho estão consolidados. Na minha leitura, ela votava(contra o parecer do relator) ontem (anteontem)”, disse Bacelar.

 

Russomanno. Preocupado com a possibilidade do voto de Tia Eron prejudicar sua campanha à Prefeitura de São Paulo, o deputado Celso Russomanno pediu uma reunião com a bancada do PRB, mas ouviu que seu partido não vai interferir.

Russomanno procurou o presidente licenciado da legenda, ministro Marcos Pereira, e ouviu dele que a parlamentar terá liberdade para votar como quiser. Para Russomanno, há uma “pressão absurda” sobre ela. “As provas são contundentes.

Não tem como não cassar Eduardo Cunha”, disse. Tia Eron afirmou que não renunciará à vaga, não antecipará sua decisão e votará na próxima semana. A pressão mais evidente contra ela veio das redes sociais. Em um dia, as páginas da deputada registraram 30 mil intervenções, incluindo comentários racistas. Sua equipe jurídica estuda ações contra declarações criticando ela por ser nordestina, mulher e negra.

O placar no conselho atualmente é de 10 votos contra a cassação de Cunha e 9 votos a favor. Caso Tia Eron decida votar contra o peemedebista, ela empatará o placar, dando a Araújo a oportunidade de desempatar contra Cunha. Caso contrário, o parecer pela cassação será derrotado por 11 a 9.

 

‘Cartas marcadas’

“O problema não é a vitória ou a derrota (de Cunha na votação), o que não é certo é ter um jogo de cartas marcadas. Senti que o governo entrou no jogo e decidia a favor de Cunha”

José Carlos Araújo (PR-BA)

PRESIDENTE DO CONSELHO DE ÉTICA

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PR tenta alterar votação trocando três em comissão

Por: Daiene Cardoso

 

Prática comum nos últimos meses no Conselho de Ética, a troca de membros atingiu agora Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. De olho na consulta do presidente interino da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), que pode alterar o rito de votação do processo de cassação do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o PR mudou seus representantes ontem no colegiado.

Jorginho Mello (SC) e Paulo Freire (SP) deixaram as titularidades e foram para a suplência.

Já os suplentes Laerte Bessa (DF) e Wellington Roberto (PB) passaram a ocupar as vagas de titulares. De licença-maternidade, a deputada Clarissa Garotinho(RJ), que era suplente, foi substituída pelo deputado João Carlos Bacelar (BA).

Bessa, Wellington e Bacelar são membros do conselho e integram a tropa de choque de Cunha. São eles que vão votar o parecer do deputado Arthur Lira (PP-AL) sobre a consulta de Maranhão, que só será lido na CCJ hoje. A proposta que pode alterar a votação do processo disciplinar enfrenta obstrução na comissão. O PSOL informou que fará um voto em separado.

 

Alterações. Nos últimos meses, o conselho passou por 16 mudanças, entre titulares e suplentes. As trocas causaram surpresa e revolta na CCJ. Substituído sem aviso prévio, Jorginho Mello disse que foi trocado porque não votaria à favor do parecer de Lira. “Lamento isso. Eu quero comunicara os senhores deputados que botem as barbas de molho. Essa substituição tem endereço certo.”

Em solidariedade a Jorginho, o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) disse que “o Congresso brasileiro nunca esteve tão baixo.” O petista Wadih Damous (RJ) chamou a mudança de “manobra espúria” e disse que, se o parlamento não tomar providências, o Supremo Tribunal Federal e o Ministério Público agirão. Até o deputado Paulo Maluf (PP-SP) reagiu às mudanças. “A maioria dessa Câmara não se dobra ao dinheiro, mas infelizmente alguns poucos se dobram ao trustes”, afirmou.

A cúpula da CCJ disse que alterações no quadro são comuns e que é prerrogativa do líder partidário, que não precisa justificá-las. “Acho que é regimental, mas não é indicável neste momento”, disse Osmar Serraglio (PMDB-PR), presidente da comissão. Em nota, o líder do PR, Aelton Freitas (MG), só justificou a mudança de Jorginho Mello. “Trata-se de prerrogativa do líder do partido, sempre adotada quando a maioria da bancada reitera insatisfação com a atuação de seu representante.” / D.C.

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Pressão de líderes obriga Maranhão a deixar o plenário

Presidente interino da Câmara deixa mesa diretora, diz que voltaria e não aparece após protesto de deputados

Por: Igor Gadelha

 

Em sua primeira tentativa de comandar uma votação desde que assumiu a presidência interina da Câmara, o deputado Waldir Maranhão (PP-MA) não aguentou a pressão e decidiu deixar a sessão plenária de ontem.

O parlamentar cedeu à pressão feita por líderes do PPS, DEM, PSDB e PSB, que exigiram que ele deixasse o comando dos trabalhos no plenário para votar a proposta de emenda à Constituição (PEC) que prorroga a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2023.

Maranhão deixou o plenário antes de a votação começar, afirmando que iria para seu gabinete, mas voltaria a comandar a sessão, o que não ocorreu. “Vou só ali no meu gabinete, mas volto”, disse. O deputado decidiu presidir a sessão plenária depois de mais de uma semana sumido da Câmara.

 

Protestos. Desde que assumiu o comando da sessão de votação, ele foi alvo de protesto de deputados da antiga oposição à presidente afastada Dilma Rousseff. “Com ele aqui não iremos votar”, afirmou o líder do DEM, deputado Pauderney Avelino (AM). O líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA), também cobrou a saída de Maranhão. “Todos nós queremos votar a DRU. Queremos votar, mas para que isso aconteça é necessário a renúncia de vossa excelência da condução dos trabalho.”

Imbassahy, Pauderney e os líderes do PPS, Rubens Bueno (PR), e do PSB, Paulo Folleto (ES), pedem apoio de outros deputados para pôr em pauta requerimento para tramitação de urgência de projeto de resolução que declara vago o cargo de presidente da Câmara. Para que o requerimento seja apresentado, os partidos precisam de assinaturas de líderes que representem 171 deputados.

Desde que assumiu o comando interino da Casa, Maranhão presidiu duas sessões, mas não houve votações em nenhuma delas. / I.G.

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