Brasil terá que ser aceito para entrar na negociação de acordo para serviços

22/06/2016

O ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, recebeu o sinal verde do presidente interino, Michel Temer, para o Brasil entrar na negociação em curso de novo acordo para liberalizar o setor de serviços (Tisa, na sigla em inglês), em Genebra. Mas o país vai ter que "combinar com os russos" - nesse caso, com os americanos - e não será fácil, conforme o Valorapurou em diferentes entrevistas na cena comercial.

O ministro Marcos Pereira: país está atrasado para aderir à negociação e agora precisa ser aceito por seus pares

Primeiro, não se entra unilateralmente na negociação de um mercado que gira US$ 4 trilhões ao ano. Na prática, ela é fechada. O Brasil, se quiser aderir, precisa se submeter a uma pré-negociação com os 23 membros (a União Europeia representa 28 países) que estão dentro. Segundo, o elemento-chave é mostrar que pode combinar com o grupo "like-minded" (países com posição semelhante) sobre o nível de ambição liberalizadora requerido, que é bastante elevado.

Em todo caso, os Estados Unidos tendem a não aceitar novos membros na chamada "fase um" da negociação, porque quer concluí-la até novembro, ainda no governo do presidente Barack Obama. Para Washington, a entrada de um novo membro poderia atrasar as barganhas, com eventual pedido de abertura de algum ponto já negociado.

O que talvez possa ajudar o Brasil, na fase atual, é que a União Europeia tem sido mais aberta que os Estados Unidos sobre entrada de novos membros. E agora também Cingapura sinaliza interesse em aderir.

A questão é como justificar dois novos membros - Brasil e Cingapura -, mantendo a exclusão da China. Enquanto a União Europeia apoia a entrada de Pequim, os EUA insistem em bloquear a segunda maior economia do planeta e maior nação negociante, na soma de exportações e importações.

Washington acha que a China pode reduzir o nivel de ambição do acordo. Se outro novo membro entrar, será complicado explicar aos chineses porque eles continuam sendo rejeitados.

Quem conhece o Brasil sabe também que uma adesão ao Tisa precisa passar pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), onde as discussões podem prosperar. Em Genebra, importantes negociadores não esconderam o aspecto positivo do anúncio do ministro da Indústria, pela sinalização de reviravolta na política comercial brasileira. No entanto, eles mantêm a prudência, justamente pelos obstáculos para uma adesão.

A próxima rodada de negociação está marcada para os dias de 8 a 18 de julho, com a ideia de acelerar ao máximo um futuro entendimento até o fim do ano.

Certos negociadores com assento no Tisa dizem que o acordo, depois de fechado, estará aberto à entrada de outros países. A ideia é abrir para os outros membros da OMC mais tarde. O acordo procura ser muito próximo da estrutura do Acordo Geral de Comércio de Serviços.

A entrada do Brasil nesse cenário seria particularmente apreciada, inclusive para atrair outros países em desenvolvimento, e porque o país "tem muitas oportunidades". A questão é como o governo brasileiro pode justificar entrar num acordo de tal dimensão, já negociado pelos Estados Unidos, União Europeia e Japão.

O Tisa tem uma estrutura ambiciosa para liberalização no setor de serviços. Mas prevê válvulas de escape para acomodar exceções generosas para cada país. É difícil imaginar, por exemplo, os EUA fazendo algum compromisso adicional importante no setor. O formato da negociação é por lista negativa. Ou seja, o setor que não se colocar na lista, como exceção à liberalização, não será incluído nunca mais.

Há também o marco regulatório, que muitos países consideram especialmente importante. Os países que negociam o Tisa representam 70% do mercado de serviços, estimado em US$ 44 trilhões. O comércio internacional do setor alcança US$ 4 trilhões por ano, em média. Eles são: Austrália, Canadá, Chile, Hong Kong (China), Colômbia, Coreia do Sul, Costa Rica, Estados Unidos, Islândia, Israel, Japão, Liechtenstein, Ilhas Maurício, México, Noruega, Nova Zelândia, Paquistão, Panamá, Peru, Suíça, Taiwan,Turquia e UE.

 

Valor econômico, v. 16, n. 4031, 22/06/2016. Brasil, p. A2