Delator: propina paga a deputado também foi depositada no Uruguai
Jailton de Carvalho
10/06/2016
Cleto prestou os depoimentos após fazer um acordo de delação premiada, que ainda não foi homologado pelo ministro Teori Zavascki, relator da LavaJato no Supremo Tribunal Federal (STF). A delação pode complicar de vez a situação de Cunha e do doleiro Lúcio Bolonha Funaro. Num dos depoimentos, Cleto aponta Funaro como um dos operadores do dinheiro de propina destinado a Cunha ao longo dos anos.
CUNHA E O DOLEIRO
Teori deve decidir nos próximos dias se homologa a delação de Cleto, já concluída, e se decreta a prisão de Cunha, já pedida pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Pelas investigações da LavaJato, Funaro pagou por um Land Rover Freelander e um Hyundai Tucson, que estão em nome da C3 Produções Artísticas, empresa de Cunha e da mulher Claudia Cruz. Cunha e Funaro aparecem juntos também em investigação da Comissão de Valores Mobiliários sobre desvios de recursos do Prece, o fundo de pensão dos funcionários da Cedae (Companhia de Água e Esgoto do Rio de Janeiro).
Cunha é acusado ainda de usar a Câmara para atender interesses de Funaro contra o Grupo Schahin, num negócio de R$ 1 bilhão.
Cleto conhece bem as relações entre Cunha e Funaro, a quem era ligado até decidir fazer acordo de delação. Cunha foi o responsável pela indicação de Cleto para uma das vice-presidências da Caixa. Antes de ir para a Caixa, Cleto trabalhou com Funaro em São Paulo.
Na delação, Cleto conta detalhes sobre a movimentação das propinas pagas a Cunha. Ele disse que o dinheiro destinado ao deputado passou por contas em vários países, entre eles Suíça e Uruguai.
Cleto também confirmou as denúncias dos empresários Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior, donos da Carioca Engenharia. Depois de fazerem acordo de delação premiada, os dois confessaram o pagamento de R$ 52 milhões em propina para Cunha, em troca da liberação de recursos do FI do FGTS para financiar obras imobiliárias de OAS, Odebrecht e Carioca Engenharia no Porto Maravilha, no Rio. Os empresários falaram sobre as contas. Cleto teria dado os detalhes da movimentação.
OPERAÇÃO CATILINÁRIAS
Cleto e Cunha foram alvos da Operação Catilinárias, feita pela Procuradoria-Geral da República e pela Polícia Federal em 15 de dezembro passado. A pedido de Rodrigo Janot, e com autorização de Zavascki, a PF apreendeu documentos na residência oficial de Cunha e na Caixa Econômica, onde Cleto trabalhou por mais de quatro anos. Dias antes da busca, Cleto tinha sido demitido do cargo pela então presidente, Dilma Rousseff, em reação à decisão de Cunha de dar seguimento ao pedido de impeachment contra ela.
No mês passado, quando surgiram rumores sobre a delação de Fábio Cleto, emissários de Funaro teriam procurado a Lava-Jato para examinar a possibilidade de o doleiro também fazer acordo de delação. Mas, num certo momento, o doleiro teria mudado de ideia.
Funaro contratou o advogado Antônio Mariz, o mesmo responsável pela defesa do presidente interino, Michel Temer, e passou a dizer que não há hipótese de fazer acordo com o Ministério Público. Procurado pelo GLOBO, Funaro disse que só Mariz falará sobre as acusações do ex-vice-presidente da Caixa. O jornal tentou, mas não conseguiu falar com Mariz.
O advogado Adriano Salles Vanni, responsável pela defesa de Cleto, disse que não fala sobre o assunto até deliberação do STF. Procurada pelo GLOBO, a defesa de Cunha disse que não vai comentar por não ter tido acesso aos autos, e negou que o deputado tenha cometido irregularidade.
Funaro está na mira dos investigadores da Lava-Jato desde a primeira fase da operação. Ele chegou a ser investigado por suspeita de tentar manipular delações negociadas com a advogada Beatriz Catta-Preta. Foi ela quem conduziu as principais delações no início da Lava-Jato, entre elas a do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa.
O globo, n. 30258 , 10/06/2016. País, p. 4.