Tucano é escolhido como líder no Senado

01/06/2016

Isabela Bonfim

Igor Gadelha

 

O presidente em exercício Michel Temer buscou ontem ampliar o apoio de sua base aliada no Congresso Nacional após perder dois ministros flagrados em áudios que demonstravam interesse em frear a Operação Lava Jato e ver crescer as articulações do PT sobre senadores para votar contra o impeachment.

No primeiro movimento, logo pela manhã, indicou para líder do governo no Senado o tucano Aloysio Nunes (PSDB-SP). O objetivo da nomeação foi amarrar o PSDB à base aliada. Na leitura dos próprios tucanos, a indicação reforça os laços de Temer com o partido, que passa a ser, efetivamente, parte do governo.

“Aloysio aceitou essa convocação com o primeiro objetivo de aproximar o governo Michel Temer da agenda proposta pelo PSDB, que passa por reformas estruturantes extremamente profundas”, disse o presidente do PSDB, Aécio Neves (MG).

Aécio minimizou as crises do governo Temer e afirmou que o PSDB “não espera facilidades” e que o partido recebeu um “convite para se unir contra as dificuldades criadas pelo PT”.

Antes da escolha de Aloysio, entretanto, Temer buscou nomes de outras legendas, como a senadora Ana Amélia (PP-RS), que recusou o convite. Simone Tebet (PMDB-MS) também foi sondada.

Com tom agressivo, Aloysio publicou um vídeo em suas redes sociais confirmando que aceitou o convite para travar a batalha pelo impeachment de Dilma. “Não quero que Dilma volte. Não quero que o PT volte. Para que possamos evitar esse grande mal, precisamos nos esforçar muito”, disse no vídeo.

Nos últimos dias, a presidente afastada Dilma Rousseff tem investido na negociação com senadores indecisos sobre seu afastamento definitivo, cuja votação deve ocorrer no dia 2 de agosto.

Já em seu primeiro discurso como líder no Senado, Aloysio foi mais ameno e evitou críticas à oposição. Ele afirmou seu compromisso com a Lava Jato e minimizou tentativas de parar a investigação. Apesar dessa fala recorrente, o senador é investigado no Supremo Tribunal Superior em um inquérito que foi aberto após delação premiada do dono da UTC, Ricardo Pessoa. A investigação apura caixa 2 de campanha eleitoral. Ele nega envolvimento.

 

‘Otimismo’. Em outro movimento, Temer se deslocou até a residência do líder do PSD na Câmara, Rogério Rosso (DF), para uma reunião com lideranças da base na Câmara. Ali, pediu empenho na defesa de seu governo no Congresso Nacional. O peemedebista orientou as lideranças a ressaltarem nessa defesa a “herança maldita” que sua administração diz ter recebido dos governos do PT. “(Ele passou uma mensagem) de otimismo, de continuar nessa batida, de mostrar de forma clara no debate no Congresso Nacional que somos um governo de 20 dias”, afirmou o ministro Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo), presente no encontro.

Geddel defendeu que a base aliada precisa reforçar em discursos os R$ 170 bilhões de déficit nas contas públicas, inflação de dois dígitos e desemprego de quase 12 milhões de pessoas.

Temer também pediu aos líderes aliados a aprovação das medidas econômicas que pretende enviar ao Congresso como forma de demonstração da força do governo, mesmo com possíveis “contratempos” que possam surgir. Em especial, nesta semana, pediu apoio à prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU), mecanismo que desobriga entes federados a gastar um porcentual com educação e saúde. /COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

 

 

‘Oradores’ .

Em reunião com líderes de partidos da base, Temer citou que viu ali “grandes oradores” capazes de responder à altura a acusações de petistas.

 

‘Contribuição’

“Aceitei ser líder do governo no Senado, que é o lugar onde vai se dar a batalha pelo afastamento definitivo da presidente, para que eu possa contribuir com o bom desfecho desse processo. Não quero que Dilma volte”

Aloysio Nunes (PSDB-SP)

LÍDER DO GOVERNO NO SENADO

 

PARA LEMBRAR

Da guerrilha à gestão Temer

Entrevistado em março de 1999 sobre o primeiro assalto do qual participou – como guerrilheiro da Ação Libertadora Nacional (ALN, de Carlos Marighela), o então deputado federal Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), hoje líder do governo Temer no Senado, tinha a memória afiada para o relembrar, 31 anos depois. “Foi uma expropriação impecável”, disse, em linguagem da época, referindo-se a uma das primeiras ações armadas de vulto contra a ditadura militar: o bem-sucedido assalto ao trem pagador Santos-Jundiaí, em 10 de agosto de 1968. Três homens armados renderam o condutor e levaram três malotes com NCr$ 108 milhões, moeda da época, dinheiro suficiente para o pagamento de todos os funcionários da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Um dos homens puxou o freio de emergência e todos saltaram, correndo para dois Fuscas que os esperavam, um deles dirigido por Aloysio Nunes. Coube ao então advogado de 23 anos a tarefa de recolher e transportar um dos cinco guerrilheiros que entraram no trem e todas as armas usadas na ação. “O planejamento foi rigoroso, exigiu muitas viagens no trem, e possibilitou uma ação perfeita, sem o disparo de um tiro”, lembrou. Aloysio (ou Mateus, um de seus codinomes) foi parar nos cartazes dos “terroristas procurados”. Paulista de São José do Rio Preto, começou a militância em 1963 ao entrar na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro logo depois do golpe de 64 – “foi como se o mundo tivesse desabado” – na esperança de contribuir para a resistência que não houve. Experimentou uma primeira rápida prisão de dois dias no mês de abril e depois integrou-se à dissidência marighelista que levaria ao rompimento com o PCB e à criação da ALN. Em1968, já advogado, Aloysio entrou no primeiro grupo de ação armada da ALN. Era eficiente na logística, no trabalho de levantamento e de infraestrutura para ações armadas. Um processo nas costas, com risco de prisão preventiva, a possibilidade de que a polícia descobrisse algo sobre as expropriações e uma boa desenvoltura no francês foram razões suficientes para Marighela despachá-lo a Paris. Viajou com passaporte falso, em novembro de 68. Aloysio foi um dos principais articuladores da ALN na Europa, seja ganhando apoio de intelectuais como Jean- Paul Sartre, seja denunciando as torturas do regime militar ou fazendo a ponte no vai e vem de militantes e dirigentes da organização, entre eles Joaquim Câmara Toledo, o número 2 da ALN. Foi passeando com Aloysio que Toledo soube do assassinato de Marighela (em 4/11/69, São Paulo), pelas páginas do Le Figaro. Ele próprio também seria assassinado em outubro de 70. “Esses assassinatos foram bárbaros, cruéis e me marcam até hoje”, afirmou. Encantado com o Partido Comunista Francês, “um partido de massa”, Aloysio nele ingressou em 1971, passo que o levou de volta, meses depois, ao Partido Comunista Brasileiro. Foi nessa condição que retornou ao Brasil em 1979 com a anistia. Filiou-se ao MDB, onde começou sua vida parlamentar. / LUIZ MAKLOUF CARVALHO

 

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Escolha fecha ‘rota de fuga’ e cola aliado em Temer

01/06/2016

Pedro Venceslau

 

Ao escolher o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) como líder do governo no Senado, o presidente em exercício Michel Temer colou nos tucanos o selo de aliados orgânicos da nova administração federal.

Durante o processo de formação do novo Ministério e mesmo depois da posse do peemedebista, os tucanos, que emplacaram três pastas importantes, insistiram na tese de que “não indicaram nomes”. Ao rejeitar a paternidade das nomeações de José Serra no Itamaraty, Alexandre de Moraes na Justiça e Bruno Araújo nas Cidades, o PSDB procurou manter um distanciamento regulamentar do Palácio do Planalto.

A legenda prometeu apoio congressual, mas deixou uma rota de fuga desobstruída para a eventualidade de votar pontualmente contra o governo e até mesmo desembarcar de cabeça erguida em caso de naufrágio. Não foi por acaso que o presidente do PSDB, Aécio Neves, adotou como mote em seus discursos e entrevistas a afirmação peremptória de que o partido “não é beneficiário do impeachment”.

Quando a equipe econômica de Temer começou a ventilar a possibilidade de recriar a CPMF, o líder do PSDB na Câmara, deputado Antonio Imbassahy (BA), se apressou em dizer que o governo não poderia contar com os tucanos para a adotar a medida.

Para aliados de Temer, nesse momento ficou evidente a fragilidade do acordo. Com Aloysio na liderança, o risco de rebelião foi debelado, pelo menos por ora. Para selar a escolha, três senadores peemedebistas que estavam cotados foram tirados de cena: Waldemir Moka (MS), Simone Tebet (MS) e Raimundo Lira (PB).

 

O Estado de São Paulo, n. 44787, 01/06/2016. Política, p. A6