Fracassa 'test drive' de Maranhão, presidente por acaso

Isabel Braga e Maria Lima

09/06/2016

 

Deputados novamente interrompem sessão comandada por substituto de Cunha, monossilábico e alvo de protestos

Alçado à presidência da Câmara em 1993, o ex-deputado Inocêncio de Oliveira tinha um problema que o incomodava quando ia presidir as sessões e dar entrevistas: era gago. Procurou ajuda especializada e, com um tapa na perna, conseguia entabular as falas e exercer bem a presidência da Casa. No comando da Câmara desde o afastamento do presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado Waldir Maranhão (PRMA) vem treinando com aliados há 33 dias para exercer plenamente a presidência. Mas, no seu caso, não houve treinamento que desse jeito.

No seu “test drive" ontem, diante da rebelião da oposição e governo contra seu comando, mostrou que continua monossilábico e alheio ao embate no plenário.

Para desespero dos líderes do governo que pretendiam votar ontem a Desvinculação de Recursos Orçamentários (DRU), o caos foi instalado no plenário, e Maranhão se limitava a balançar a cabeça com olhar perdido e passar a palavra ao próximo orador. Com a revolta de aliados, que se negaram a votar as matérias, o líder do governo André Moura (PSC-SE) o convenceu a ir almoçar e só voltar depois da votação da complicada pauta governista.

Os líderes da base esperavam manter Maranhão afastado da presidência para votar o segundo turno da DRU, que dá mais liberdade ao governo para alterar recursos do Orçamento, e o requerimento de urgência do projeto que trata da lei de responsabilidade dos fundos de pensão. Os líderes do PSDB, Antonio Imbassahy (BA), e do DEM, Pauderney Avelino (AM), reagiram. Irritados, os dois líderes avisaram da tribuna da Casa que, apesar de defenderem a aprovação da DRU, não iriam votar a matéria se Maranhão estivesse na presidência da sessão.

— O deputado Waldir Maranhão veio para tumultuar. Com ele aqui não iremos votar! É importante trazer a normalidade política para a Casa, mas não é com gestos como este que conseguiremos fazer isso — disse Pauderney Avelino.

O líder do DEM defendeu que outros partidos assinem requerimento dos partidos da antiga oposição — PSDB, DEM e PPS — para que seja declarada a vacância do cargo de presidente da Câmara.

— No momento em que decidiu suspender a votação do impeachment, (Maranhão) assinou uma das páginas mais negras dessa Casa. Não reúne condição para dirigir as sessões — afirmou o líder do PSDB, Antonio Imbassahy (BA).

As duas matérias polêmicas acabaram aprovadas após a saída de Maranhão.

— Isso aqui virou uma zona. O Maranhão não fala nada, só balança a cabeça — constatou o líder da minoria, José Guimarães (PT-CE).

O líder do PPS, Rubens Bueno (SP), avisou que o governo enfrentará muitas dificuldades se Maranhão resolver presidir as sessões nas votações das reformas e matérias polêmicas que vêm pela frente enviadas pelo presidente interino, Michel Temer:

— Nota zero. Olha a tragédia que vivemos no Parlamento.

Maranhão, desde que assumiu a interinidade, presidiu duas sessões na Casa, mas em nenhuma houve votações. Ao final da nova tentativa malsucedida, disse que está disposto a continuar ocupando seu lugar.

— Passei no teste. Os protestos fazem parte da democracia. É a vida. Vou continuar — disse, rindo.

 

 

O globo, n. 30257, 09/06/2016. País, p. 7.