Contrato fictício ocultou repasse a Delfim, afirma ex-executivo

Fausto Macedo, Julia Affonso, Ricardo Brandt e Fabio Serapião
29/06/2016
 
 

Flávio Barra, da Andrade Gutierrez, diz em delação que empreiteira pagou valores a empresas ligadas ao ex-ministro

Um dos responsáveis pelo projeto da construção da usina de Belo Monte, em nome da Andrade Gutierrez, o ex-executivo Flávio Barra afirmou à Procuradoria Geral da República que os repasses de propinas para o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto foram feitos por meio de contratos fictícios.

“A Andrade Gutierrez fez o repasse de sua parte, proporcionalmente à sua participação no consórcio, a Delfim Netto, por meio de transferências a partir de contratos fictícios, à LS, empresa de consultoria de Luiz Apolônio, sobrinho e representante de Delfim Netto, e à Aspen, empresa de consultoria de Delfim”, afirmou Barra, em depoimento no último dia 24. O ex-executivo da empreiteira fez delação premiada.

O ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques de Azevedo, também delator da Lava Jato, foi o primeiro a relatar um repasse de R$ 15 milhões a Delfim, a pedido do ex-ministro da Fazenda (governo Lula) e da Casa Civil (governo Dilma Rousseff) Antonio Palocci.

Os valores, segundo os ex-executivos, seriam pela participação de Delfim na formação do Consórcio Construtor - formado por pequenas empresas em parceria com estatais - vencedor do leilão da usina de Belo Monte, em 2010.

O ex-presidente da Andrade Gutierrez afirmou em fevereiro - e Barra confirmou neste mês - que a empreiteira repassou propina para o PT e o PMDB na obra da usina, principalmente por meio de doações eleitorais oficiais aos partidos políticos e em campanhas eleitorais. O leilão para construção e operação de Belo Monte foi realizado entre 2010 e 2011. Um dos consórcios era integrado pela Andrade Gutierrez. Segundo Azevedo, 1% do contrato das obras da usina envolveu propina.

Aos procuradores da força-tarefa da Lava Jato, Barra disse que “repassou às demais empresas integrantes do Consórcio Construtor a necessidade de atender à demanda de valores destinados a Delfim Netto. Inclusive apresentando Luiz Apolônio aos representantes das empresas.”

Delfim foi ministro da Fazenda (1967/1974) e criador do “milagre econômico” da ditadura militar. Durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, foi seu principal conselheiro econômico. Nas delações da Andrade Gutierrez, Delfim e o pecuarista José Carlos Bumlai - amigo de Lula - foram apontados como os responsáveis pela formação do consórcio vencedor do leilão da usina de Belo Monte.

Cobrança. Barra relatou que chegou a ser procurado por José Carlos Bumlai e seu filho. Os dois, segundo o ex-executivo da Andrade Gutierrez, pediram ajuda para cobrar valores das outras empreiteiras envolvidas no projeto da usina.

Consultoria. A defesa de Delfim Netto informou ontem que só vai se manifestar depois que tiver acesso ao teor das citações feitas pelos delatores ao ex-ministro. Delfim já informou que prestou serviços de consultoria e que não houve irregularidades nos pagamentos.

Antonio Palocci nega ter participado de qualquer negociação envolvendo a montagem do consórcio da obra de Belo Monte e afirma ser “totalmente mentirosa” qualquer insinuação de que teria solicitado contrapartida financeira para beneficiar partidos políticos. “No ano de 2010, Palocci exercia mandato de deputado federal e não tinha nenhuma participação nas decisões governamentais sobre o setor elétrico”, reafirmou a defesa do ex-ministro.

O empresário Luiz Apolônio não foi localizado ontem pela reportagem para comentar a declaração do ex-executivo da Andrade Gutierrez Flávio Barra.

‘Proporção’

“A Andrade Gutierrez fez o repasse de sua parte, proporcionalmente à sua participação no consórcio, a Delfim Netto, por meio de transferência a partir de contratos fictícios”

Flávio Barra

EX-EXECUTIVO DA ANDRADE GUTIERREZ EM DEPOIMENTO À PROCURADORIA