O Estado de São Paulo, n. 44788, 02/06/2016. Economia, p. B4

PIB cai menos, mas sinais de recuperação ainda são difusos

Por: José Paulo Kupfer

 

Momentos de início de reversão de uma tendência, na economia, são, por definição, difíceis de captar e, por isso, dificultam a tarefa de decifrar a tendência predominante para o futuro.

Quando a trajetória de alta passa a refluir ou na hora em que a atividade econômica se aproxima do fundo do poço e começa a infletir para cima, os sinais ainda são difusos e costumam apontar em direções opostas.

É algo assim que parece mostrar o resultado efetivo da variação do PIB no primeiro trimestre de 2016 quando comparado com o conjunto das projeções dos analistas. A mediana das estimativas apontava recuo de 0,8% e a queda de 0,3% em relação ao quarto trimestre de 2015, apurada pelo IBGE, era o teto dessas estimativas. Em resumo, a economia permanece em queda, mas o ritmo do recuo aparece mais suave do que o previsto, insinuando que o fundo do poço está ficando mais próximo.

Embora já contenha indícios, a queda menos acentuada do PIB, no primeiro trimestre, ainda não parece indicar uma direção segura e sem volta de melhora do comportamento da economia. Mas o sentido da curva, desenhado pelas projeções atualizadas, é o de retrações menos intensas a cada trimestre do resto do ano.

Fatores positivos de uma futura retomada podem ser listados lado a lado com elementos capazes de atrasar esse movimento.

Enquanto inflação em queda abre espaço para cortes nas taxas de juros, desemprego e inadimplência em alta se combinam para frear a demanda.

O resultado do primeiro trimestre reforçou as perspectivas de redução do ritmo de retração da economia. São esperadas revisões a partir de agora, mas não ainda a ponto de alterar em substância as projeções do PIB final de 2016. Se antes um tombo de 4% na atividade era o piso das estimativas, agora pode vir a ser um teto.

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Brasil tem o pior desempenho em um grupo de 31 países

Lista mostra que até mesmo Grécia, Rússia e Ucrânia, que passaram por crises recentes, estão à frente do País

Por: Antonio Pita

 

A queda de 5,4% no PIB do primeiro trimestre na comparação com os primeiros três meses do ano passado fez a economia brasileira amargar o pior desempenho para o período em um ranking de 31 países que já tiveram os dados oficiais divulgados. O resultado do Brasil ficou aquém até mesmo de países que atravessaram graves crises nos últimos anos, como Grécia, e outros que enfrentaram guerras, como Rússia e Ucrânia.

Segundo a agência classificadora de risco de crédito Austin Rating, mesmo países que estiveram no centro da crise financeira internacional de 2008, e passaram por graves crises fiscais, estão em situação melhor que o Brasil. Entre eles, estão Espanha (9º) e Itália (22º), que foram socorridos por pacotes de estímulo da União Europeia. “Não há crise no mundo. Os países voltaram a crescer e o Brasil fez o caminho inverso. Fica bem claro que o País tem um problema estritamente doméstico e depende de suas próprias ações”, avalia Alex Agostini, economista chefe da Austin. “Temos um problema de gestão fiscal que afeta toda a política econômica e gera desconfiança dos agentes econômicos”. Para o economista, a situação ruim da economia brasileira teve início em 2014, após um ciclo de superávits primários e crescimento.

Desde então, o governo da presidente afastada Dilma Rousseff “perdeu a capacidade de negociar” com o Congresso para adotar medidas contra a deterioração econômica. “O governo continuou gastando muito e hoje pagamos um preço caro por esse desarranjo fiscal.” Segundo a Austin, as Filipinas tiveram o melhor desempenho no primeiro trimestre, com crescimento de 6,9% no PIB. Depois aparecem China, Indonésia, Peru e Malásia. A Venezuela, com situação mais delicada que a do Brasil, não divulgou dados.

Também não há dados ainda sobre a África do Sul, que enfrentou crise política no primeiro trimestre e um processo de impeachment em abril. Entre os Brics, é o país com cenário econômico mais próximo do Brasil, que teve desempenho abaixo da média do grupo. “A Rússia, além de viver uma guerra, enfrenta a queda dos preços do petróleo, mas tem situação melhor que a do Brasil. Somos um ponto fora da curva”, diz Agostini.

Órgãos relacionados:

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OCDE vê PIB negativo também em 2017

Para ministro José Serra, entidade está só especulando ‘com umas poucas informações de que dispõe’

Por: Andrei Netto

 

O Brasil está em “recessão profunda”, e a instabilidade política vai continuar a abalar a economia não só em 2016, mas também em 2017. A análise foi publicada ontem, em Paris, pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e é o mais pessimista relatório sobre o Brasil em mais de dez anos. Segundo a entidade, o cenário de pessimismo é causado pelas “incertezas políticas”, pelos sucessivos casos de corrupção e pela consequente queda da confiança de consumidores e investidores. Mas, para o ministro das Relações Exteriores, José Serra, a entidade “está especulando”.

A OCDE prevê que a economia brasileira vá decrescer 4,3% em 2016 e recuar 1,7% em 2017, completando o terceiro ano consecutivo de recessão. Com isso a depressão prevista pela entidade para o intervalo de três anos será de quase 10%. A entidade ressalta ainda que, no ano que vem, o Brasil deve ser o único dentro de um grupo de 44 países – entre os quais grandes emergentes, como China, Rússia e África do Sul–que registrará uma retração do PIB. Diante da avaliação, José Serra, que representou o Brasil na reunião ministerial da entidade, desqualificou o relatório.

Em um documento de uma página e meia intitulado “Observações sobre os comentários da OCDE sobre a economia brasileira”, que apresentou ao secretário-geral da organização, Angel Gurría, Serra afirma que analistas “já estão prevendo um crescimento de cerca de 2% no próximo ano”.

Questionado pela imprensa brasileira sobre as perspectivas de decrescimento feitas pela entidade para 2016 e 2017, o chanceler disse: “A OCDE não afirma coisa nenhuma. Eles estão especulando. Isso é bobagem. Eles estão especulando com relação a umas poucas informações de que dispõem”.

Trajetória. Segundo Serra, a inflação está em trajetória de queda, a agricultura “caminha para um desempenho da ordem de 4%”, há “um aumento da demanda chinesa por produtos alimentares”, “com um potencial de demanda de produtos brasileiros muito intensa”, e a produção de manufaturados “está tendo um excelente desempenho”. “O relatório da OCDE não tem essas ofisticação de análise”, reiterou. “Esses todos são sinais otimistas. Isso não significa que a economia vai bombar no ano que vem. O mais importante não é isso; é sair da trajetória depressiva.”