O Estado de São Paulo, n. 44788, 02/06/2016. Economia, p. B9

Trabuco se reuniu com grupo do Carf, diz PF

Segundo relatório da polícia, integrante do esquema esteve na sede do banco em 2014

Por: Andreza Matais e Luiza Pollo

 

O relatório da Polícia Federal que indiciou o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, e mais nove pessoas cita diversas vezes uma reunião do executivo com integrantes do esquema de compra de decisões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Em nota, o banco informou que “o presidente da companhia não participou de qualquer reunião com representantes do escritório de assessoria”. Um dos integrantes do esquema menciona uma conversa que teria tido com Trabuco.

O banqueiro teria dito: “Mario, é... , fico feliz de você estar aqui é…,ajudando o banco”. O interlocutor seria Mario da Silva Teixeira Junior, membro externo do conselho de administração do banco. Os trechos do relatório da Polícia Federal foram antecipados pela Coluna do Estadão.

A PF concluiu que houve reunião, além das menções feitas em conversas dos investigados, porque o celular de um dos alvos que estavam sendo monitorados, Eduardo Cerqueira Leite, recebeu uma ligação enquanto estava nas instalações do banco Bradesco no dia 09 de outubro de 2014.

Segundo o relatório de inteligência da PF, a antena que registrou a ligação estava “localizada na Cidade de Deus, em Osasco, justamente no complexo do Banco Bradesco, o que confirma a ida do Eduardo ao local e reunião com os vice-presidentes e com o presidente”.

No relatório, a Polícia Federal cita, ainda, o auditor aposentado Jeferson Salazar. Ele teria classificado a reunião com o Bradesco como “muito boa” e que “estavam todos”. “O vice e o presidente, o ‘Trabu’ (Trabuco), esteve presente cumprimentou a todos e saiu e que Eduardo acha que ‘vai dar samba’”, cita o relatório da PF.

O fato de o Bradesco ter perdido a ação na primeira instância da multa de R$ 3 bilhões aplicada pela Receita Federal significaria, para o grupo criminoso, uma chance de convencer o banco a contratar seus serviços.

“Com esse resultado o que se observou foi que a presidência do Bradesco parece se render às tentativas de cooptação da organização criminosa atuante no Carf”, diz a PF.

No total, a PF indiciou dez pessoas, incluindo Trabuco e os executivos do Bradesco Domingos Figueiredo de Abreu e Luiz Carlos Angelottie.

A conclusão do inquérito já foi encaminhada pela PF ao Ministério Público Federal, que confirmou ter recebido os indiciamentos e pode ou não apresentar denúncia à Justiça Federal.

Os indiciamentos referem se aos crimes de tráfico de influência, corrupção ativa e passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Trabuco foi indiciado por corrupção ativa.

O banco se disse surpreso com os indiciamentos e nega qualquer encontro de Trabuco com o grupo. O Bradesco afirma, ainda, que dois diretores do banco prestaram depoimentos à PF como testemunhas. Eles teriam esclarecido que foram procurados por escritório de assessoria tributária que se ofereceu para advogar uma questão fiscal no ao Carf.

De acordo com eles, não se efetivou qualquer proposta, contratação ou pagamento desses contratos. O banco acrescentou que o processo, “objeto da investigação, foi julgado em desfavor do Bradesco por unanimidade – 6 x 0, e encontra-se, agora, submetido ao Poder Judiciário”. Procurado novamente ontem pela reportagem do Estado, o banco disse que não havia nenhum novo posicionamento.

 

Resposta

O banco afirma que o processo, “objeto da investigação, foi julgado em desfavor do Bradesco por unanimidade – 6 x 0, e encontra se, agora, submetido ao Poder Judiciário”.

 

PARA LEMBRAR

A Operação Zelotes foi iniciada em 2013 com investigações sobre irregularidades no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Ligado ao Ministério da Fazenda, o Carf é uma espécie de “tribunal” que julga recursos de contribuintes contra multas aplicadas pela Receita. De acordo com as investigações, empresas pagariam propina para que integrantes do Carf cancelassem ou reduzissem o valor das penalidades.

Quando a operação foi deflagrada, em março do ano passado, estimava-se que o esquema envolvia multas no valor de R$ 19 bilhões – quase o dobro do que era apurado na Operação Lava Jato. Desde então, nomes conhecidos já apareceram nas investigações. No mês passado, a Polícia Federal indiciou o empresário André Gerdau e mais 18 pessoas na sexta fase da operação. A siderúrgica Gerdau é suspeita de tentar sonegar R$ 1,5 bilhão.

Em abril, a Justiça Federal do Distrito Federal aceitou denúncia contra o dono do grupo Safra, Joseph Safra, também acusado de pagar propina para obter decisões favoráveis no Carf.

Os desdobramentos do caso investigado pela Operação Zelotes também revelaram a ação de lobistas e agentes públicos para a aprovação de medidas provisórias nas gestões Lula e Dilma Rousseff com benefícios fiscais para o setor automotivo. O filho caçula de Lula, Luís Cláudio, aparece nas investigações como beneficiário de pagamentos suspeitos.

Em março, um ano depois de a operação ser deflagrada, saiu a primeira condenação no âmbito da Operação Zelotes O lobista Halysson Silva foi condenado a quatro anos e três meses de prisão em regime semiaberto pelo crime de extorsão.