O Estado de São Paulo, n. 44788, 02/06/2016. Política, p. A10

Contador diz que Pimentel esteve na casa de Caoa

Trombeta afirma ter visto governador de MG em reunião sobre cota de R$ 3 mi a Bené

Por: Ricardo Brandt / Fausto Macedo/ Julia Affonso/ Mateus Coutinho

 

Delator da Operação Lava Jato, o contador Roberto Trombeta afirmou aos procuradores da República que o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), estava na residência do dono do Grupo Caoa, numa reunião, em agosto de 2014, em que lhe foi solicitada a participação no repasse de R$ 3 milhões, em espécie, para o empresário Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, dono da Gráfica Brasil.

“Chamou a atenção do declarante Roberto Trombeta haver avistado no interior daquela residência a pessoa de Fernando Pimentel, então candidato ao governo de Minas Gerais, não mantendo contato com o mesmo além do visual”, diz o termo de declaração de Trombeta registrado pelos procuradores da República, em Curitiba, nos autos da Lava Jato.

Bené, como é conhecido o amigo de Pimentel, está preso desde abril, como operador de propinas do petista. Os dois foram denunciados na Operação Acrônimo pelo recebimento de valores ilícitos da Caoa. Foi identificado o repasse de R$ 2 milhões para empresas de Bené, que teriam o governador e sua campanha como beneficiários – valor citado por Trombeta como “repasse oficial”.

 

Encontros. Trombeta narrou três encontros com Bené e executivos da Caoa, entre julho e agostode2014,para tratar do repasse dos R$ 3milhões ao amigo de Pimentel. Detalhou ainda datas e circunstâncias de entregas de notas na sede da empresa.

“Em reunião na casa do controlador do Grupo Caoa, dr.Carlos Alberto Oliveira Andrade, convocada pelo presidente, sr.

Maciel Neto, soube o declarante Roberto que a Cao apagaria, diretamente ao senhor Benedito Rodrigues de Oliveira, a importância de R$ 3 milhões em dinheiro”, registram os investigadores.

Essa reunião teria ocorrido em agosto de 2014. “Estes pagamentos seriam feitos semanalmente na sede do Grupo Caoa.” O primeiro dos três encontros narrados pelo delator teria ocorrido em julho. “O declarante Roberto Trombeta foi chamado para uma reunião a pedido do presidente do Grupo Caoa, sr. Antonio Maciel Neto. Nesta reunião foi apresentado a Benedito Oliveira.” O delator diz que o executivo da Caoa “solicitou ajuda” para uma “demanda que posteriormente lhe seria explicada”.

O segundo encontro teria ocorrido em 6 de agosto no escritório de contabilidade de Trombeta, em São Paulo. Foi após esse encontro que Trombeta diz ter ocorrido a reunião na casa do controlador da Caoa, em que ele diz ter visto Pimentel.

O delator disse que, “por motivo de sigilo na empresa”, ele e seu sócio Rodrigo Morales foram incumbidos de destacar um funcionário do escritório de contabilidade para “retirar certa ‘encomenda’ no departamento financeiro (da Caoa) e que a entregasse ao representante” indicado por Bené.

Os valores teriam sido repassados para um emissário de Bené, que ia à sede da Caoa e pegava o dinheiro das mãos de um funcionário do escritório de Trombeta – que se deslocava ao local com essa única função.

 

Repasses. Segundo Trombeta, foram quatro repasses de R$ 500 mil nos dias 22 de agosto, 5, 19 e 25 de setembro. “O restante do valor acordado entre o presidente do Grupo Caoa, sr. Antonio Maciel Neto, e o sr. Benedito Oliveira não foi pago em razão da prisão do sr. Benedito no dia 7 de outubro.” Em outubro de 2014, Bené foi detido com R$ 116 mil em espécie chegando ao aeroporto de Brasília, em um jatinho particular.

Ele acabou sendo liberado. O criminalista Antonio Figueiredo Basto, que defende Roberto Trombeta e seu sócio Rodrigo Morales, disse que não comentaria o caso.

Bené já confessou que atuou em nome de Pimentel em delação premiada, no processo da Operação Acrônimo. Segundo ele, o Grupo Caoa teria feito, ao todo, o repasse de R$ 20 milhões para o governador, entre 2013 e 2014. Pelo menos R$ 7 milhões teriam ido para contas no exterior do petista e o restante abastecido campanhas.

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Petista afirma ‘desconhecer’ teor de delação

Por: Ricardo Brandt / Fausto Macedo/ Julia Affonso / Mateus Coutinho

 

A defesa do governador de Minas, Fernando Pimentel (PT), afirmou desconhecer a informação do delator. “É fundamental registrar que o referido sr. Roberto Trombeta é acusado pelo Ministério Público Federal de mentir e ocultar documentos prometidos por ele na negociação do acordo de delação premiada no âmbito da Operação Lava Jato. Por esta razão, a delação pode ser anulada”, diz o advogado Eugênio Pacelli.

“Como a defesa de Fernando Pimentel, que não é investigado na referida operação, desconhece por completo os assuntos narrados, só pode se basear nas informações repassadas pela reportagem, que não deixa sombra de dúvida: nada do que foi relatado liga Pimentel a essas supostas tratativas. Nada, a não ser a palavra de alguém que é acusado de mentir em sua delação. Nada, além de ‘ter avistado’ alguém que poderia, em sua avaliação, ser Fernando Pimentel em um desses supostos encontros”, afirma o advogado.

Em nota, a Caoa negou as acusações. “A Caoa desconhece a existência e eventual conteúdo das delações premiadas de Roberto Trombeta e seu sócio Rodrigo Morales que lhe faça qualquer menção”, informou. Segundo a empresa, é “curioso que tal suposta informação, coberta por sigilo legal, venha parcialmente ao conhecimento público, sem possibilidade prévia de a empresa saber e contrapor os seus termos”.

A nota afirma que “sempre desenvolveu suas atividades com recursos de origem lícita e privada, dentro e fora do Brasil, e desconhece os negócios e as empresas de Trombeta e Morales no exterior, as quais não fazem ou fizeram parte dos negócios da Caoa”. / R.B.,F.M.,J.A. e M.C.

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Ex-ministro de Lula teria recebido R$ 1mi em esquema com agência

Em delação premiada, Bené diz que atuação de Marcio Fortes resultou na contratação da Propeg pela pasta em 2010

Por: Ricardo Brandt / Fausto Macedo/ Julia Affonso/ Mateus Coutinho

 

O empresário Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, disse em delação premiada que o ex-ministro das Cidades Marcio Fortes (governo Lula) recebeu R$ 1 milhão de esquema que resultou na contratação da agência de publicidade Propeg pela pasta, em 2010.

Segundo Bené, outro ex-ministro da pasta, Mário Negromonte–hoje conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia–,sucessor de Fortes, e o ex-deputado do PP Pedro Corrêa (na época, réu no mensalão) teriam recebido valor equivalente a 10% do contrato de publicidade.

A delação de Bené já foi homologada pelo Superior Tribunal de Justiça, no âmbito da Operação Acrônimo – investigação da Polícia Federal que atribui crime de corrupção ao governador de Minas, Fernando Pimentel (PT), ex-ministro do Desenvolvimento do governo Dilma.Bené disse que por volta de 2010 Negromonte o procurou.

Segundo o delator, ele pretendia “influenciar” licitação da área de publicidade do Ministério das Cidades. O acordo previa que Fortes, que ocupou o cargo entre 2005 e 2011, e um assessor dele, conhecido por “Alcione”, ficariam com parte do valor do contrato, desde que a Propeg fosse escolhida.

A assessoria da agência nega envolvimento com a denúncia. “É falso o enredo por meio do qual se tenta envolver a Propeg em assuntos que são inteiramente estranhos à agência. Jamais, em tempo algum, houve pagamento a políticos por meio da empresa.” Fortes nega “veementemente as acusações” e diz que se coloca à disposição das autoridades para “esclarecimentos que eventualmente forem necessários”.

O criminalista Carlos Fauaze, que defende Mário Negromonte, informou que não vai se manifestar por não ter tido acesso à documentação dos autos do processo. Já o ex-ministro disse que a Propeg é da Bahia, seu Estado, e que ele não precisaria da intermediação de Bené para tratar de qualquer assunto envolvendo a empresa. / R.B., F.M., J.A. e M.C.