Título: Um pé dentro da ONU
Autor: Sabadino, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 01/11/2011, Mundo, p. 18

Com o voto de 107 países, entre eles o Brasil, Palestina é aceita como membro pleno da Unesco. Em resposta os EUA cortam sua contribuição à agência

Os palestinos conseguiram ontem um importante reconhecimento no cenário internacional e, mais uma vez, deixaram exposta a divisão entre países que apoiam ou não o seu reconhecimento como Estado soberano. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) aprovou o ingresso da Palestina como membro pleno, com 107 votos a favor, 14 contra e 52 abstenções. A resolução serve como impulso para o pedido de adesão como 194º país-membro da ONU, que deve ir a votação neste mês no Conselho de Segurança. Israel considerou a decisão da Unesco um passo contra a retomada de negociações de paz e ameaçou cortar laços com a organização. Os Estados Unidos, que comandaram o voto contrário, anunciaram imediatamente depois do resultado a suspensão do pagamento de sua cota para a agência.

A entrada na Unesco marca uma nova fase na batalha dos palestinos pelo reconhecimento como soberano, pedido em setembro. O presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmud Abbas, comemorou. "É uma vitória do direito, da justiça e da liberdade. o mundo inteiro se encontra atualmente junto do povo palestino, a favor do estabelecimento do Estado da Palestina o quanto antes."

Estimulada pelo sucesso a AP deve pedir ingresso em outras organizações internacionais enquanto aguarda a decisão do Conselho de Segurança. "Não temos apenas a intenção de procurar outras agências, mas o direito de bater em todas as portas em busca de uma paz justa, até conquistarmos o direito a uma vida digna", afirma o embaixador palestino no Brasil, Ibrahim Al-Zeben. Como membro pleno da Unesco, a AP pode, por exemplo, entrar com um processo para defender locais históricos que estejam nos territórios disputados com os israelenses.

Para Israel, o novo status da Palestina afasta as chances de conversações. "Vemos essa decisão com preocupação e um pouco de tristeza. Os palestinos elegeram o caminho unilateral e não querem uma negociação ou um diálogo com Israel. Eles podem ter um Estado independente, podem ser membros das organizações internacionais, mas como consequência de um acordo de paz conosco", contra-argumenta o embaixador israelense, Rafael Eldad. Em comunicado, seu governo rejeitou a votação e acenou com "rever sua cooperação" com a Unesco.

Os EUA anunciaram prontamente a suspensão de um pagamento de US$ 60 milhões previsto para este mês. A participação americana no orçamento bianual da Unesco pode chegar a US$ 654 milhões e corresponde a 22% do total. "A votação foi prematura e prejudica a meta da comunidade internacional de uma paz abrangente, justa e duradoura", afirmou o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney.

Para Gerald M. Steinberg, professor do Departamento de Estudos Políticos da Universidade Bar Ilan, em Israel, o distanciamento entre palestinos e israelenses deve ficar cada vez maior e os EUA podem ter um papel crucial na divisão diante do cenário internacional. "A estratégia palestina é ganhar o reconhecimento sem um acordo com Israel. Os árabes têm uma maioria automática na ONU. Os EUA precisam decidir qual caminho tomar e liderar outros países, ou então Washington pode perder influência e acabar com a esperança de novas negociações", comentou.

Voto dividido A votação, em Paris, foi saudada por aplausos calorosos que não escondem a divisão internacional. Os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), como esperado, votaram em bloco a favor da Palestina. Tiveram importantes adesões europeias, como as de Bélgica, Espanha e França, que tinha dúvidas até o último momento. Itália e Reino Unido se abstiveram, enquanto a Alemanha acompanhou Washington no voto contrário. Em comunicado divulgado pelo Itamaraty, o governo brasileiro "felicitou" os palestinos.

Viúva de Arafat na mira A Justiça da Tunísia expediu ontem um mandado internacional de prisão contra Suha Arafat, viúva do líder histórico da causa palestina, Yasser Arafat. Segundo a imprensa local, Suha Arafat é acusada de corrupção no caso da Escola Internacional de Cartago, que fundou em 2006 com Leila Trabelsi, ex-primeira-dama da Tunísia. Posteriormente, as duas se desentenderam e, em 14 de agosto de 2007, o então presidente, Zine El-Abidine Ben Ali, retirou da víuva de Arafat a nacionalidade tunisiana e a expulsou do país.