Título: Inquérito aberto no Supremo
Autor: Abreu, Diego; Tolentino, Lucas
Fonte: Correio Braziliense, 26/10/2011, Política, p. 2

Ministra Cármen Lúcia acata pedido da Procuradoria-Geral da República e autoriza a investigação contra o ministro Orlando Silva, em relação às denúncias de desvio de verbas do Programa Segundo Tempo

Alvo de acusações de que teria recebido dinheiro desviado de programas do Ministério do Esporte, Orlando Silva passou à condição de primeiro ministro do governo da presidente Dilma Rousseff a ser investigado em inquérito aberto durante o exercício do cargo. A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ontem a abertura de investigação na qual a Procuradoria-Geral da República (PGR) irá apurar o suposto envolvimento de Orlando Silva e do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, com desvios no Programa Segundo Tempo.

O pedido de investigação havia sido protocolado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, na última sexta-feira. Na petição, ele solicitava a realização de seis diligências. A ministra acatou somente três pontos. Ela negou, inicialmente, que a PGR interrogue Orlando Silva e Agnelo, além de pessoas ligadas às entidades que firmaram convênios com o ministério, e o dirigente do PCdoB Fredo Ebling. A relatora do inquérito afirmou que avaliará esses pedidos em um segundo momento.

No despacho, Cármen Lúcia determinou que o ministério envie ao Supremo em até 10 dias a relação de convênios firmados com o Programa Segundo Tempo e, ainda, os documentos relativos aos acordos com três entidades suspeitas de desvio de verbas. A ministra concedeu o mesmo prazo para que o Tribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral da União (CGU) comuniquem se estão investigando irregularidades na pasta e, caso estejam, que encaminhem os processos ao STF.

Já o Superior Tribunal de Justiça (STJ) terá 48 horas para remeter ao Supremo o inquérito no qual Agnelo é citado como beneficiário de um suposto esquema de desvio de recursos públicos no ministério. O governador do DF comandou a pasta do Esporte entre 2003 e 2006, sendo sucedido por Orlando Silva.

Na investigação que tramita no STJ, a Federação Brasiliense de Kung-Fu (Febrak) é apontada como responsável pelo desvio de dinheiro público. A entidade é presidida pelo policial militar João Dias Ferreira, o autor das denúncias contra o ministro.

Cármen Lúcia avisou que depois que receber toda a documentação requisitada, ela enviará os autos para a PGR. Caberá a Gurgel especificar "dentre as diligências ainda não deferidas quais persistem como necessárias". O procurador também avaliará se há conexão entre as investigações que tramitam no STJ e as acusações contra o ministro, "Não autorizei os depoimentos requisitados, uma vez que essas pessoas já podem ter sido ouvidas", afirmou a ministra.

"Recortes de jornal" Somente após o procurador-geral da República emitir parecer sobre o caso, o que deve demorar pelo menos 15 dias, devido aos prazos, é que a relatora decidirá entre concentrar ou não no Supremo as investigações relativas ao ministro e ao governador. "O fato de começar as investigações não significa que vão ter prosseguimento. Depende do que a Procuradoria-Geral da República vai encontrar a partir de agora", ponderou Cármen Lúcia. "Não dá para dizer ainda que o Agnelo será investigado aqui (no STF)", acrescentou.

Ontem à tarde, o advogado de Orlando Silva, Antonio Carlos de Almeida Castro, se encontrou com a ministra Cármen Lúcia. "Fui dizer para a ministra, em nome do ministro (Orlando), que ele é o maior interessado na investigação", disse. Segundo o advogado, nenhuma prova foi apresentada até agora. "Para a minha surpresa, o procurador juntou apenas quatro representações de deputados da oposição e recortes de jornal."

Em entrevista após a audiência da Lei da Geral da Copa na Câmara, Orlando Silva ressaltou que partiu dele próprio o pedido de investigação. "Quem pediu que fosse feita a apuração de todos os fatos registrados naquela reportagem fui eu. Eu propus. Com toda a responsabilidade que tenho, para mim não há nenhum fato que altere a minha condição de inocente", frisou. A reportagem citada é da revista Veja, na qual o PM João Dias faz acusações contra o ministro.

O governador Agnelo Queiroz disse concordar com a decisão do Supremo de abrir o inquérito. "Ela (Cármen Lúcia) está separando os inquéritos e tomando algumas informações do STJ e do Ministério Público. Esse é o procedimento correto e muito importante para fazer a investigação com tranquilidade", afirmou, durante cerimônia de assinatura de protocolo de procedimentos no Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT).

Agnelo ressaltou, no entanto, que se tratam de casos distintos. "São dois inquéritos de natureza completamente diferente. O que gerou o nosso foi uma investigação feita pela Polícia Civil, que não tinha competência e passou para o âmbito federal. Foi uma denúncia que um mercenário fez na época e estourou na campanha", declarou o governador. "A natureza do inquérito daqui não tem nada a ver com a natureza do que está sendo instalado no Ministério do Esporte."

Próximos passos Confira como vai prosseguir a investigação conduzida pela Procuradoria-Geral da República no inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem 48 horas para remeter ao STF o inquérito que investiga supostos desvios no Ministério do Esporte, no qual o policial militar João Dias, responsável pelas denúncias contra o ministro Orlando Silva, e o governador Agnelo Queiroz são citados como beneficiários do esquema.

O Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) têm 10 dias para informar ao STF se foram instaurados procedimentos relativos a desvios de recursos públicos do Programa Segundo Tempo. Em caso positivo, os órgãos terão que fornecer cópia integral dos processos.

O Ministério do Esporte terá também 10 dias para fornecer cópia ao Supremo dos procedimentos relativos aos convênios celebrados pela pasta com a Federação Brasiliense de Kung-Fu (Febrak), Instituto Contato e a ONG Pra Frente Brasil. Ministério também terá de enviar a relação dos convênios celebrados no âmbito do Segundo Tempo, com os nomes dos responsáveis, objetos, data de vigência e situação da prestação de contas.

Com as informações em mãos, a ministra Cármen Lúcia, relatora do inquérito, enviará a papelada ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para que ele especifique se são necessárias novas diligências.

Caberá à PGR investigar se o ministro cometeu irregularidades. Caso haja indícios suficientes de que Orlando Silva e Agnelo cometeram desvios, o procurador-geral pedirá abertura de ação penal. Caso não apareçam indícios contra ambos, o inquérito poderá ser arquivado.

Há o risco, porém, de as investigações serem remetidas para o STJ, caso o ministro seja demitido do cargo. Nesse caso, ele perderia o foro privilegiado de ser processado pela Suprema Corte.