O governo ‘Demer’

27/06/2016

José Roberto de Toledo

 

A desaprovação a Michel Temer é equivalente à de Dilma Rousseff, segundo pesquisa inédita do instituto Ipsos, divulgada aqui com exclusividade: 70% desaprovam a conduta do interino, contra 75% que desaprovam a da afastada. A desaprovação dele vem crescendo, e a dela, caindo. A pico negativo de Dilma no Ipsos foi em setembro: 90% de desaprovação. O histórico de Temer foi de 61% de desaprovação em fevereiro (quando ainda era apenas vice-presidente), para 67% em maio e 70% agora. A margem de erro é de três pontos porcentuais.

Há uma diferença entre a avaliação da pessoa de Temer e a de seu governo. Desde que assumiu a Presidência, o interino tornou-se mais famoso: a taxa dos que não opinavam sobre ele por desconhecê-lo caiu de 33% em fevereiro para 11% agora. Isso explica em parte por que sua desaprovação cresceu, assim como é o motivo de sua aprovação ter subido de 6% para 19% no mesmo período. Em relação ao governo, porém, aconteceu o contrário.

Desde que Dilma foi afastada, a taxa dos brasileiros que não sabem opinar sobre o governo pulou de 2% para 22%. Cresceu também a proporção daqueles que julgam a gestão do País como regular (foi de 21% para 29%). Já as avaliações positivas e negativas se moveram para baixo. A taxa de ótimo e bom oscilou de 9% para 6%, enquanto a de ruim e péssimo despencou de 69% para 43%. Pode-se interpretar essa queda como um voto de confiança no governo interino ou, mais provavelmente, como uma expectativa cautelosa até que ele mostre a que veio.

Quando Dilma e Temer tomaram posse, ela como presidente e ele como vice, o movimento da opinião pública já era crítico. Em janeiro de 2015, 42% avaliavam o governo como ruim ou péssimo e 29% como regular. São taxas praticamente iguais às de agora. A diferença é que, em 2015, 28% diziam ser um governo ótimo e bom, contra apenas 6% agora. A perda de aprovação ocorreu sob Dilma - com vales de 4% ótimo/bom - e Temer ainda não a recuperou.

A primeira pesquisa sobre a sua gestão mostra que o interino terá que fazer algo muito positivo para se diferenciar da antecessora. O principal objetivo de Temer e seu staff é a condenação de Dilma pelo Senado e o seu afastamento definitivo. Essa condição até pode ser necessária, mas a pesquisa do Ipsos mostra que dificilmente será suficiente - ao menos do ponto de vista da opinião pública.

A taxa dos que acreditam que o rumo do País está errado não diminuiu após a posse de Temer: oscilou de 88% para 89% entre maio e junho. Os que acham o contrário - que o Brasil está indo na direção certa - eram 7% em abril, chegaram a 12% em maio e agora estão em 11%. O tamanho da mudança de opinião diante de um evento tão dramático quanto a troca de presidente é quase marginal: um ganho de apenas quatro pontos porcentuais.

Há outras respostas que mostram o quão difícil é a missão de Temer para se tornar popular. O tema em que a atuação do interino é mais criticada é justamente aquele que Temer se propôs a reformar: a Previdência Social. A taxa dos que reprovam o que ele fez até agora nesse assunto é praticamente o dobro dos que aprovam: 44% a 23%. O terço restante não soube responder.

A desaprovação de Temer é igualmente alta - no patamar dos 40% - no que diz respeito ao Minha Casa Minha Vida (43%), ao combate ao desemprego (44%), ao Bolsa Família (43%), ao déficit público (41%), à crise política (42%), à inflação (40%) e à corrupção (40%). Na opinião pública, a gestão de Temer é quase uma extensão do administração Dilma, uma espécie de governo "Demer".

Parte é culpa de Temer. Mas é também porque a desaprovação aos políticos é geral: 56% desaprovam Marina Silva; 63%, Aécio Neves; 68%, Lula; 55%, Geraldo Alckmin e José Serra.

 

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Aliados de Dilma acusam Senado de ‘desinteresse’

 
27/06/2016                                                                                     

Isabela Bonfim

Julia Lindner

 

Com parlamentares dando sinais de desinteresse após 11 reuniões para ouvir testemunhas, o Senado deve encerrar na quarta-feira a fase probatória do processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. Aliados da petista reclamam que os senadores da base do presidente em exercício Michel Temer têm agido com descaso no processo, o que teria se intensificado durante os depoimentos.

Em uma das sessões, o senador Álvaro Dias (PV-PR), favorável ao impeachment, afirmou que o processo é “protelatório”. Ele chegou a dizer que os votos já estavam definidos e que a comissão é uma “formalidade”. Também houve grande número de ausências - por duas vezes, o quórum da comissão caiu quase a ponto de a reunião ser suspensa. Para haver sessão, são necessários pelo menos cinco senadores.

Coordenada pela senadora Simone Tebet (PMDB-MS), a base aliada de Temer abriu mão de fazer perguntas às testemunhas e chegou a aprovar a dispensa de testemunhas de acusação. “Esse é o único processo que eu conheço em que a acusação abre mão de produzir provas.

Mas eles não podem interrogar as testemunhas, porque estariam produzindo provas contra eles mesmos”, disse a senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), membro da tropa de choque de Dilma na comissão.

Senadores da base questionam a quantidade de depoentes trazidos pela defesa - ao todo, 40. Os aliados do presidente em exercício argumentam que muitas testemunhas eram desnecessárias e foram trazidas apenas com o intuito de dar mais semanas a Dilma.

“A fase de depoimentos foi cansativa e improdutiva em grande parte. Isso porque muitas testemunhas foram escolhidas pela defesa sem nenhum conhecimento, com caráter procrastinador”, afirmou o líder do Democratas, Ronaldo Caiado (GO).

 

Desinteresse. Para Vanessa, porém, há desinteresse. “Eles (a oposição) não têm nenhum pudor de dizer que já está definido, que é uma formalidade. Não fazem perguntas porque não se interessam pelas respostas. Estão usando o processo de impeachment para validar uma decisão que já foi tomada lá atrás.”

Ao longo das três semanas de depoimentos, a tropa de choque de Dilma também demonstrou desgaste e chegou a negociar, por duas vezes, um acordo de procedimento para liberar as testemunhas mais rapidamente.

Nos bastidores, os petistas assumem a dificuldade de reverter votos na comissão e acreditam que o placar pode estar definido: 15 a 5 a favor do afastamento, como na primeira fase.

 

O Estado de São Paulo, n. 44813, 27/06/2016. Política, p. A6