O Estado de São Paulo, n. 44794, 08/06/2016. Política, p. A7
Por: Isadora Peron / Gustavo Aguiar
O pedido de prisão dos principais nomes da cúpula do PMDB feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, causou incômodo entre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Os requerimentos contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL); o senador e presidente interino do partido, Romero Jucá (RR); o ex-presidente da República José Sarney (AP) e o presidente da Câmara afastado, Eduardo Cunha (RJ), chegaram ao gabinete do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato na Corte, há pelo menos três semanas.
O entendimento nos bastidores da Corte é de que Teori já podia ter tomado uma decisão monocrática e levado a questão a plenário para os demais ministros referendarem. Foi assim que procedeu quando decidiu autorizar a prisão de Delcídio Amaral (sem partido-MS) em novembro e o afastamento de Cunha do mandato de deputado no início de maio.
A complexidade dos casos e o impacto de determinar a prisão de parlamentares no atual momento político do País, no entanto, fizeram o relator da Lava Jato hesitar em tomar uma decisão sozinho. Ele chegou a consultar seus pares sobre a questão e, por isso, já teria previsto que os pedidos sigilosos contra os quatro peemedebistas vazariam mais cedo ou mais tarde.
A principal preocupação do ministro é de que a decisão de prender nomes importantes do PMDB durante o processo do impeachment da presidente Dilma Rousseff no Senado poderia ser entendida como uma interferência no processo e uma maneira de desestabilizar o governo do presidente em exercício, Michel Temer.
Desde semana passada, já circulava em Brasília informações de que Teori estava debruçado sobre questões importantes, que poderiam influenciar o andamento do processo de impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, no Senado.
O vazamento, no entanto, incomodou integrantes da Corte. Reservadamente, um ministro apontou que a divulgação da existência dos pedidos teria como objetivo pressionar Teori e o Supremo a tomar uma decisão sobre o caso.
Gilmar. A reação mais acalorada veio do ministro Gilmar Mendes, que criticou o vazamento das informações para a imprensa e o classificou como “brincadeira” com o STF a divulgação de processos que, em tese, deveriam tramitar sob o mais rígido sigilo. “É preciso ter muito cuidado com isso, e os responsáveis têm de ser chamados às falas. Não se pode brincar com esse tipo de coisa. ‘Ah, é processo oculto, pede-se sigilo’, mas divulga-se para a imprensa que tem o processo aqui ou o inquérito. Isso é algo grave. Isso é uma brincadeira com o Supremo. É preciso repudiar isso de maneira muito clara.”
Questionado sobre se acreditava que a própria Procuradoria-Geral de Justiça teria tornado pública a informação, o ministro evitou apontar culpados, mas afirmou que “quem está fazendo isso está cometendo crime”. Integrantes da equipe de Janot, no entanto, rechaçam a insinuação de que foram os autores do vazamento.
Acesso
A OAB vai requerer ao Supremo acesso à delação de Sérgio Machado para “garantir o amplo direito de defesa” dos citados pelo ex-presidente da Transpetro.
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Corte na berlinda
Por: Rubens Glezer
O atual estágio da crise política coloca o Supremo Tribunal Federal novamente em situação de tensão com os outros Poderes. Porém, dessa vez é pior: qualquer que seja a decisão a respeito do pedido de prisão provisória de membros da cúpula do PMDB, ela trará graves consequências políticas e jurídicas. Não há saída fácil para o STF.
Sob o ponto de vista jurídico, o precedente da prisão preventiva de Delcídio Amaral coloca pressão sobre os ministros.
Senão decretar as prisões sem boa distinção em relação àquele caso, o STF será acusado de arbitrário e parcial. Se decretar, começa mas questões políticas.
O primeiro problema diz respeito à tensão entre Poderes. Em casos de prisão provisória de parlamentares, a Constituição diz que a respectiva Casa Legislativa (Senado ou Câmara) pode anular a prisão. Se alguma delas votar nesse sentido, perante a população restará a percepção de que o Supremo– e talvez simbolicamente o Judiciário – não detém autoridade para combater a corrupção no Legislativo.
Daí surge o segundo risco político: o fortalecimento da percepção deque o sistema jurídico estaria disposto, ou apto, a punir agentes do PT, mas não de outros partidos como o PMDB. Seja essa percepção verdadeira ou falsa – inclusive por ignorar ou relevar o afastamento de Eduardo Cunha – seu fortalecimento desestabiliza a legitimidade do processo de impeachment e do governo interino.
Talvez a única solução fosse a não decisão; oque explicaria a demora do STF neste caso. Contudo, desde que os pedidos de prisão vieram a público, essa opção traz custos políticos ao Tribunal. O Supremo está na berlinda como nunca antes; assim como a democracia brasileira.
COORD. SUPREMO EM PAUTA FGV DIREITO SP