Planos de saúde vão cobrir exames de zika para grupos de risco

Luiz Ernesto Magalhães e Renan França

07/06/2016

 

 

Gestantes e recém-nascidos de mães com suspeita da doença terão direito a testes

 

Os planos de saúde vão ser obrigados a cobrir despesas com exames para detectar a presença do vírus zika no sangue de gestantes, bebês filhos de mães com suspeita da doença e recém-nascidos com má-formação congênita causada pelo micro-organismo. A decisão está numa resolução da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), publicada ontem no Diário Oficial da União, alterando a lista de casos de cobertura obrigatória pelos planos. A medida entra em vigor no dia 7 de julho.

— Depois que tivemos uma epidemia, organizamos um grupo técnico para enfrentar a situação. Não fizemos antes porque estávamos preparando a rede particular para se articular e também para saber qual seria a população-alvo para fazer esse tipo de exame — disse Karla Coelho, diretora de Normas e Habilitação de Produtos da ANS. — Em 30 dias, a norma já estará valendo. Essa discussão ocorre desde o ano passado. As operadoras participaram dos debates e vão precisar cumprir a regra. Se isso não ocorrer, poderão ser multadas. Basta que o usuário informe a ANS.

No Rio, os preços dos exames para diagnosticar a doença variam bastante entre os laboratórios. No caso do teste PCR, por exemplo, empregado para diagnósticos na fase mais aguda da doença, a diferença ultrapassa os 100%. Na rede Richet, o exame saía ontem por R$ 400. Na Labs D’Or, custava R$ 550, enquanto no Sérgio Franco eram cobrados R$ 980.

No caso dos exames do tipo IGM (capazes de detectar o vírus ainda no estágio inicial) e IGG (confirma se o paciente teve ou não contato com o zika em algum momento da vida), os preços iam de R$ 200 (Richet), passavam por R$ 209 (Sérgio Franco) e chegavam R$ 262,50 (Labs D’Or).

 

NÚMERO DE CASOS EXPLODIU ESTE ANO

O número de registros da doença explodiu este ano. Apenas na capital, de 1º de janeiro até 30 de maio, foram notificados 26.579 casos. O mês com maior quantidade — 7.232 — foi fevereiro. Em maio, o volume de notificações caiu bastante, para apenas 702.

A decisão da ANS foi elogiada com ressalvas pelo infectologista Edimilson Migowski, presidente do Instituto Vital Brazil. Para ele, a medida poderia ter sido estendida aos casos mais graves da doença, que exijam internações, ou quando houver suspeita de que o vírus zika foi responsável por complicações, como a síndrome de Guillain-Barré:

— No Brasil, são feitos cerca de dois milhões de partos por ano. Desse total, estima-se que 25% das gestantes (500 mil) tenham planos de saúde. Devido ao perigo de complicações, as grávidas formam um grupo de alto risco. Essa decisão de incluir os exames é realmente um bom benefício. Pelo custo, talvez não seja viável estender essa norma a todos. Mas acredito que, em casos de complicações da doença, os exames devam ser cobertos — disse o especialista.

 

PRESIDENTE DE SINDICATO FAZ CRÍTICAS

Já o presidente do Sindicato dos Médicos do Rio, Jorge Darze, criticou a decisão da ANS. Para ele, a medida deveria atender todos os usuários de planos:

— As grávidas de fato estão mais expostas a complicações. Mas limitar a gratuidade a faixas da população é uma visão míope do governo — disse Darze.

Morador de Santa Teresa, o representante comercial Cássio Ricardo Rodrigues, de 31 anos, lamentou que a medida da ANS não alcance toda a população. Em outubro do ano passado, ele teve zika e foi atendido num hospital particular no Centro.

— O médico me avaliou. O diagnóstico foi clínico, ele sequer pediu exames para confirmar a doença ou me informou que poderia ter conseguido um diagnóstico em laboratório, caso pagasse — disse.

O diretor da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Antonio Carlos Abbatepaolo, afirmou que as operadoras vão cumprir a norma:

— É uma mudança grande. A gente entende o momento da saúde brasileira. Vai haver impacto no custo, mas as operadoras têm sensibilidade para atender seu beneficiário.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que também representa algumas operadoras de planos de saúde, afirmou, por meio de nota, que “as determinações do órgão regulador serão cumpridas”.

Para o advogado Rodrigo Araújo, especialista em direito do consumidor na área da saúde, qualquer inclusão de exames no rol da ANS é boa. Para ele, agora é preciso adotar medidas a fim de evitar que os planos se recusem a fazer o diagnóstico de doenças fora da lista oficial:

— Por um lado, é bom ver que a agência está atenta ao avanço da medicina. Por outro, agora é preciso haver avanços nos casos em que planos de saúde negam diagnósticos de doenças fora do rol da agência. Esse tipo de procedimento pode provocar perda de vidas.

 

 

O globo, n. 30255, 07/06/2016. País, p. 9.