Título: Lá vem o dono da bola e das regras
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 07/11/2011, Política, p. 2

Cercada pela guerra travada nos bastidores com o governo, começa hoje a visita do secretário-geral da Fifa ao Brasil. Jerôme Valcke - que não deve abrir mão de acordos - tem reuniões com parlamentares para discutir a Lei Geral da Copa

A primeira visita do secretário-geral da Fifa, Jerôme Valcke, ao Brasil após o encontro com a presidente Dilma Rousseff em Genebra e a posse do novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, está cercada de silêncio e tensão. Valcke chega hoje a São Paulo para participar de reunião na Assembleia Legislativa do estado sobre obras de mobilidade urbana. Deve visitar o Itaquerão, estádio que abrirá a Copa do Mundo de 2014 e só agora teve as obras iniciadas. Na terça, ele e o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, participam de audiência na Câmara dos Deputados, em Brasília, para discutir a Lei Geral da Copa e seguem logo depois para um almoço — com a presença de Aldo Rebelo e de todos os ministros envolvidos diretamente com a Copa — na casa do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS).

Também será o primeiro encontro após o acirramento na queda de braço entre o governo brasileiro e a entidade máxima do futebol. Os dois lados disputam uma guerra de bastidores em torno da meia-entrada para idosos e estudantes — a Fifa até concordou em ceder no primeiro caso, mas não abre mão no segundo; venda de bebidas alcoolicas nos estádios; pena para quem piratear produtos com a marca Fifa; entre outros pontos.

A agenda pode ser pública, mas as partes envolvidas foram cautelosas ao divulgar o que será tratado nos encontros. Aldo Rebelo pediu para examinar todos os processos em andamento na pasta. Procurado pelo Correio, avisou, pela assessoria, que a "bola está no Congresso, com a votação da Lei Geral da Copa". E que nesse primeiro momento, a prioridade é escolher a sua equipe no ministério. "Se eu estivesse procurando alguém para o primeiro emprego, seria mais fácil. Mas preencher as vagas no ministério requer pessoas mais experientes e isso dá mais trabalho", brincou ele.

Na semana passada, alguns integrantes da Comissão Geral da Copa da Câmara dos Deputados chegaram a sugerir que Aldo também participasse da audiência pública na Casa. A tropa de choque agiu rápido afirmando que, publicamente, as posições do governo sobre a Lei Geral já haviam sido expressas pelo, na época, ministro Orlando Silva, na malfadada audiência realizada na véspera de sua exoneração. Com isso, o atual ministro só terá como agenda oficial ao lado de Valcke o almoço na residência oficial de Marco Maia.

Procurada pelo Correio, a assessoria da Fifa foi lacônica ao afirmar que "Jerôme Valcke, secretário-geral da Fifa, participará de reuniões com o governo brasileiro em Brasília entre 7 e 8 de novembro. Entre outros compromissos, Valcke também se encontrará com o ministro Aldo Rebelo para dar continuidade à preparação conjunta da Copa das Confederações da Fifa 2013 e da Copa do Mundo da Fifa Brasil 2014".

Em entrevista ao jornal Estado de São Paulo, contudo, Valcke foi duro ao dizer que "o Brasil não vai vencer a Fifa". Na mesma entrevista, disse que espera que, a partir de agora, se avance para uma segunda etapa no processo de preparação da Copa. "A mensagem é que já fizemos concessões em várias áreas. Espero que possamos compartilhar o sentimento de que chegou o momento de fazer avançar a preparação e não falar mais de leis e regulamentos, que agora devem ser aprovados e assinados."

A situação não está tão pacificada assim. A presidente Dilma Rousseff tem dado repetidos sinais de que não vai aceitar que a soberania e a legislação nacional sejam desrespeitadas apenas para que a Copa de 2014 seja realizada no Brasil. Disse isso claramente no discurso pronunciado durante a posse de Aldo Rebelo, na última segunda-feira. Aldo entendeu o recado e respondeu às críticas feitas por Valcke. "Não queremos confronto com a Fifa, mas não queremos submissão", declarou Aldo.

Um que tem tentado distensionar as relações é Ricardo Teixeira. Escanteado pela presidente Dilma Rousseff, que não o citou nominalmente entre os presentes na posse de Aldo, o dirigente máximo da CBF, afundado em denúncias de corrupção, entrou na fila de cumprimentos ao novo ministro do Esporte. Ao abraçá-lo, disse-lhe: "Pode contar comigo para tudo o que precisar", ouvindo, como resposta, um protocolar "muito obrigado".

Relator da Lei Geral da Copa no Congresso, o deputado Vicente Cândido (PT-SP), que raramente se furta a conceder entrevistas sobre o parecer que formula, preferiu o silêncio. Disse que muitas matérias sobre a Lei Geral da Copa e os enfrentamentos com a Fifa foram divulgadas nas últimas semanas e preferia aguardar para ver, pessoalmente, os questionamentos e as ponderações que serão feitos pelo secretário-geral da entidade.

O presidente da Comissão Geral, deputado Renan Filho (PMDB-AL), torce para que as dificuldades sejam vencidas o mais rapidamente possível. Ele lembra que a Fifa já concordou com a meia-entrada para os idosos e que, apesar da resistência quanto à extensão do benefício também para os estudantes, avança-se no sentido do estabelecimento de uma cota, que pode ser de 15% a 20%, na carga máxima dos ingressos para ser vendidos com essas características. "A Fifa tem sido aberta as essas questões e não há risco de o Brasil perder (o direito de sediar) a Copa", assegurou. "Vamos assegurar os direitos da Fifa e eles vão respeitar a nossa soberania", apostou Renan Filho.