Bolsonaro vira réu por ofensa a deputada 

Gustavo Aguiar e Isadora Peron

22/06/2016

 

 

STF aceita denúncia contra o parlamentar pelo episódio em que ele disse na tribuna que Maria do Rosário ‘não merece’ ser estuprada

O Supremo Tribunal Federal decidiu ontem tornar réu o deputado Jair Bolsonaro (PSCRJ) por injúria e incitação pública ao estupro. O caso refere-se ao episódio em que o parlamentar afirmou, na tribuna da Câmara, em 2014, que não estupraria a deputada Maria do Rosário (PT-RS) “porque ela não merece”.

O caso foi julgado na 1.ª Turma do STF, formada por cinco ministros. O colegiado firmou posição contrária a Bolsonaro por quatro votos a um. Foram aceitos dois processos–uma denúncia por incitação ao estupro e uma queixa-crime para processá-lo por injúria. Se condenado, Bolsonaro pode ser preso por até seis meses e pagar multa.

A denúncia foi oferecida em dezembro de 2014 pela vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko. A acusação da procuradora foi motivada por uma entrevista que Bolsonaro deu ao jornal Zero Hora no dia seguinte às declarações na Câmara, em que reiterou a afirmação contra Maria do Rosário.

O relator do caso, ministro Luiz Fux, afirmou que as declarações do deputado são “reprováveis” e “geram indignação”.

Ele considerou que Bolsonaro não pode ser protegido pela prerrogativa de imunidade parlamentar, já que o que ele disse não tem nenhuma relação com a atividade na Câmara.

“A frase do parlamentar tem potencial para estimular a perspectiva da superioridade masculina em relação às mulheres, além de prejudicar a compreensão contra as consequências dessa postura. O resultado de incitação foi alcançado porque várias manifestações públicas reiteraram essa manifestação”, disse Fux. O ministro citou frases de apoiadores de Bolsonaro que, na internet, saíram em sua defesa. As manifestações foram colhidas pela defesa da deputada.

Acompanharam o relator os ministros Luiz Edson Fachin, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio Mello. Ele afirmou que, embora não subscrevesse as palavras de Bolsonaro, receber a denúncia por causa de uma “desavença” entre parlamentares “é um passo muito largo”.

“Não posso considerar as brincadeiras feitas em redes sociais, os comentários dos cidadãos que perderam tempo fazendo comentários a respeito do episódio. O que tivemos foi um arroubo de retórica, uma metáfora”, disse Marco Aurélio, que defendeu a imunidade parlamentar de Bolsonaro.

Cultura do estupro. Barroso rebateu as afirmações de Marco Aurélio e afirmou que declarações como a de Bolsonaro contribuem para consolidar a cultura do estupro no Brasil. “Afirmar que não estupraria uma mulher porque ela não merece é uma ofensa à pessoa atacada, mas uma ofensa à condição feminina.

É uma naturalização da violência contra a mulher.” A professora da Fundação Getulio Vargas Eloísa Machado, doutora em direitos humanos, considerou acertada a decisão da Corte. “Qualquer coisa que fuja da função parlamentar deve ser encarada com rigor.” Bolsonaro disse ontem que a decisão do Supremo fere a imunidade parlamentar. “Eu apelo humildemente aos ministros dos STF que votaram para abrir o processo para não me condenar, que reflitam sobre esse caso”, declarou o deputado.