Título: Para não errar, discrição
Autor: Sabadini, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 07/11/2011, Mundo, p. 14

De olho nas eleições de 2012, quando tentará a reeleição, Barack Obama deve continuar a apostar em uma política externa menos intervencionista que a de seu antecessor, George W. Bush

Enquanto os Estados Unidos tentam se reerguer de uma das maiores crises econômicas de sua história, o resto do mundo passa por transformações profundas. Com problemas internos nos últimos meses, o presidente Barack Obama precisou manter o foco na agenda nacional, e a liderança americana no cenário global ficou em segundo plano. O chefe de Estado desenvolveu uma diplomacia mais conciliadora, sem intervenções radicais e, agora, tenta terminar duas guerras e trazer uma nova voz aos conflitos do mundo árabe. Em plena campanha para reeleição, o governante aposta no sucesso contra o terrorismo e na retirada das tropas do Iraque, mas sofre críticas por não ser mais firme e ativo no Oriente Médio. O democrata, no entanto, deve continuar com uma política externa mais amena até as eleições de 2012.

"Ele deve manter uma atitude de precaução no cenário internacional, evitando qualquer medida dramática ou um papel de liderança mais ativa. O grande objetivo dele é não cometer nenhum erro no plano internacional, o que poderia ter um impacto negativo na sua campanha. Além disso, com uma economia enfraquecida, o presidente precisa focar todo o seu tempo e sua energia nos assuntos domésticos", aponta Mark P. Jones, professor do departamento de Ciência Política da Universidade de Rice, no Texas.

O presidente americano retomou sua atenção às questões internacionais durante um pronunciamento feito no fim de outubro e deu tom ao discurso que deve ser usado durante toda a sua campanha para a reeleição. Ele ressaltou a vitória sobre a Al-Qaeda, com a morte de Osama bin Laden, em maio, e a ação americana na Líbia como "uma grande história" de sucesso. O presidente também lembrou as promessas feitas em 2008, quando ainda era candidato, e anunciou a retirada total das tropas do Iraque até o fim deste ano. "Os Estados Unidos estão em uma posição de força. Após quase nove anos, a guerra da América no Iraque estará acabada", afirmou.

Nos três anos de mandato, Obama conseguiu resolver, gradualmente, a situação das tropas no Iraque e no Afeganistão, um assunto importante para os eleitores e que atinge diretamente o orçamento do governo. A administração do democrata também tentou evitar a inserção em novos conflitos. A exceção foi a Líbia, porém a ação militar foi iniciada com precaução e com a ajuda de aliados como França e Reino Unido. Depois da Primavera Árabe, os americanos ofereceram apoio à transição do Egito e da Tunísia, mantendo uma distância segura. E apesar de condenar as atitudes do governo de Bashar Al-Assad na Síria, absteve-se de uma maior intervenção ou sanção mais forte diante do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).

Irã Nas próximas semanas, Obama também deve participar das discussões sobre o programa nuclear do Irã. Os EUA pediram para que as potências mundiais continuem a pressionar o regime dos aiatolás para a fiscalização de usinas de enriquecimento de urânio e impedir a fabricação de armas no país. O governo americano deve se posicionar com mais firmeza nesta semana, diante da divulgação do relatório da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), e tentar acalmar os ânimos de Israel, que já ameaçou atacar o território iraniano em resposta a qualquer ousadia nuclear (veja matéria na página ao lado). Por causa da aliança com os israelenses, o presidente americano também precisou tomar partido no conflito com os palestinos e, na semana passada, foi contra a entrada da Palestina na Unesco e chegou a retirar a ajuda financeira da agência por causa do reconhecimento.

A população do país parece aprovar a postura menos intervencionista em relação à adotada pelo ex-presidente George W. Bush. Uma pesquisa do jornal The Wall Street Journal, divulgada na semana passada, mostrou que 61% dos americanos aprovam a forma como Obama administra sua política exterior, enquanto apenas 6% da população cita as questões internacionais como sua principal preocupação. Uma outra sondagem feita pelo Pew Research Center apontou que apenas 27% concordavam com a intervenção militar na Líbia. "Hoje, os Estados Unidos têm menos capacidade militar, econômica, política e moral para moldar o ambiente internacional do que já tiveram tempos atrás", avaliou recentemente o historiador David M. Kennedy à revista Time.

Assim, a política de "não intervenção" deve continuar pelo menos até novembro do ano que vem. "A questão da guerra sempre foi um problema muito sério para a política americana. Ela é uma arapuca para qualquer presidente, porque tende a torná-lo impopular, e Obama não quer isso", avalia David Fleischer, cientista político americano e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB).

Os EUA também preferiram baixar o tom e não seguir a mesma linha do governo anterior com relação a rivais históricos, como a Rússia e a China. A equipe de Obama tentou manter relações amigáveis com esses dois países e começou um diálogo discreto com a Coreia do Norte. A diplomacia também tem investido nas economias emergentes, como Índia e Brasil, visitado por Obama em março deste ano, para aumentar o foco nas relações bilaterais.