Valor econômico, v. 17, n. 4024, 11/06/2016. Empresas, p. B6

Anac deve manter fim da franquia de bagagem

Relator da agência indica apenas ajustes pontuais em proposta

Por: Daniel Rittner

 

Apesar da polêmica, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) deve fazer somente ajustes4 pontuais na proposta que mexe com direitos e obrigações dos passageiros, alvo de críticas do Ministério Público Federal e de entidades de defesa dos consumidores. As mudanças sugeridas nas condições gerais de transporte aéreo, divulgadas em março, ficaram em audiência pública por quase dois meses e receberam cerca de 1,5 mil contribuições – número jamais visto na história da agência. O recorde anterior pertencia à consulta que discutiu a concessão dos aeroportos do Galeão e de Confins, com 761 participações. Bastante criticada pela proposta de eliminar o direito de franquia da bagagem, a Anac está convencida em levar adiante a medida. “O importante é deixar claro que isso faz parte de um processo gradual e com resultados positivos de desregulamentação da aviação brasileira”, diz o diretor da agência que relata o processo, Ricardo Fenelon. Em 2005, com a lei de criação da Anac, foi estabelecido o sistema de liberdade tarifária nos voos domésticos – antes era fixado um teto para as tarifas. Resultado: em vez de subir, o preço médio da passagem caiu 54% em termos reais na última década. Quatro anos mais tarde, houve extinção dos pisos para passagens internacionais, que limitavam os descontos das empresas. A política anterior visava proteger aéreas nacionais contra um suposto risco de “dumping” nos preços praticados por suas concorrentes estrangeiras. Quando ocorreu a liberalização, o temor não se materializou.

Com a franquia de bagagem, Fenelon também tem expectativa positiva. “Não estamos garantindo em momento nenhum que a passagem ficará mais barata, mas isso abre as portas para uma  diferenciação dos serviços oferecidos pelas empresas”, ressalta. O foco é incentivar o estabelecimento de companhias “low cost” no Brasil. Fenelon exemplifica: hoje o peso médio da peça despachada em voos domésticos são 12 quilos. Segundo ele, ao propor uma desregulamentação, a Anac segue a experiência internacional: Estados Unidos, União Europeia, Canadá, África do Sul e China dão às empresas o direito de cobrar por mala transportada. A proposta original da agência é eliminar a  franquia de bagagem – atualmente de 23 kg – em outubro de 2018 nas viagens dentro do país. Quem embarca só com bagagem de mão acaba dando um subsídio cruzado aos demais passageiros. As aéreas reservam espaço às malas no porão de seus aviões e embutem esse custo nas tarifas.

No caso dos voos internacionais, hoje o limite é de duas peças, com 32 kg cada. A Anac previa tirar gradualmente essa restrição: cairia para duas de 23 kg imediatamente, um volume com o mesmo peso máximo depois de um ano e desregulamentação total dois após a publicação da resolução definitiva. Para evitar confusão dos passageiros, o relator pretende eliminar essa “escadinha” e liberalizar de uma vez só, em um ou dois anos. Outro ajuste que ele admite fazer na proposta inicial é sobre a possibilidade de transferência de titularidade do bilhete. Hoje vedada, essa hipótese seria reconhecida – a critério da empresa – mediante pagamento definido no contrato de transporte aéreo. Fenelon vê risco de surgimento de um “mercado secundário”, ou seja, de “cambistas” que adquiram grandes quantidades de bilhetes em dias de alta demanda para revenda posterior. “Tenho um certo desconforto com a possibilidade de ‘cambismo’ e, por isso, não fechei posição sobre isso.”

As contribuições públicas estão sendo analisadas pela superintendência de serviços aéreos da Anac e, em seguida, haverá avaliação da procuradoria jurídica. O parecer de Fenelon será submetido, possivelmente até outubro, à diretoria colegiada. O superintendente Ricardo Catanant considera que “a sensação inicial de perda de direitos [com a franquia de bagagem] vai se reverter” quando os passageiros perceberem outros aspectos da resolução, como o direito de desistência da compra de passagem até 24 horas depois e indenização imediata em caso de extravio de malas.