Valor econômico, v. 17, n. 4024, 11/06/2016. Brasil, p. A3

Despesa do governo deve ter novo recorde este ano

Se excluídas 'pedaladas' de 2015, despesa terá alta real de 2,3%.

Por: Ribamar Oliveira

 

As despesas do governo federal neste ano estão mantendo uma trajetória de forte expansão e devem alcançar um novo recorde. A programação orçamentária e financeira definida na semana passada, por meio do decreto 8.784, prevê que o gasto total da União deverá atingir R$ 1,230 trilhão em 2016, contra R$ 1,103 trilhão em 2015, excluído o pagamento das “pedaladas fiscais” realizado no ano passado, relativas a passivos não quitados em exercícios anteriores.

Está projetado, portanto, um aumento nominal de 11,5% do gasto neste ano ou de 2,3% em termos reais, considerando um IPCA médio de 9% entre 2015 e 2016 e de 7,12% neste ano, como prevê o mercado, de acordo com o boletim Focus, editado pelo Banco Central. Em 2015, o governo quitou R$ 55,6 bilhões em passivos que o Tesouro acumulou em exercícios anteriores com bancos estatais federais e com o FGTS, que precisam ser excluídos para que as despesas do ano passado possam ser comparadas com as de 2016.

As despesas que mais crescerão neste ano são justamente as obrigatórias. Os gastos com benefícios previdenciários, por exemplo, passarão de R$ 436,1 bilhões no ano passado para R$ 503,3 bilhões em 2016, de acordo com a programação do decreto. O aumento nominal será de 15,4% e o real, de 5,9%%.

O gasto com os benefícios da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e com a Renda Mensal Vitalícia (RMV) passarão de R$ 42,5 bilhões em 2015 para R$ 49,1 bilhões, com aumento nominal de 15,5% e real de 6%. gasto com o abono salarial e com o seguro desemprego é o que mais crescerá, passando de R$ 47,5 bilhões no ano passado para R$ 59,9 bilhões em 2016, com aumento nominal de 26% e real de 15,7%.

Neste último caso, o crescimento decorre, principalmente, da alteração feita pelo governo na forma de pagamento do abono salarial no ano passado. O governo adiou, para este ano, uma parcela considerável da despesa do abono que era devida em 2015. Foi uma medida, aprovada pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), que ajudou a fechar as contas no ano passado, mas está pressionando o caixa do Tesouro em 2016.

Apenas o gasto com o pagamento de pessoal da União terá uma pequena queda real. Em 2015, a despesa com o pagamento dos servidores ativos e inativos ficou em R$ 238,5 bilhões e, neste ano, deverá ficar em R$ 258,8 bilhões, de acordo com o decreto. Isto representará crescimento nominal de 8,51%, mas queda real de 0,45%.

Essas quatro despesas (Previdência, LOAS/RMV, abono e seguro desemprego e pessoal) representarão 90,6% do gasto obrigatório deste ano, fixado em R$ 967,6 bilhões pelo decreto. Só a despesa com benefícios previdenciários representa 52% do gasto obrigatório.

Por isso, o governo quer fazer a reforma das regras do sistema de Previdência Social para controlar o crescimento da despesa pública. A ideia em debate é estabelecer uma idade mínima para requerer aposentadoria, entre outras medidas. Essa realidade mostra a dificuldade que o governo Michel Temer terá para fixar um teto para o gasto da União a partir de 2017.

A despesa total da União que está no decreto de programação orçamentária e financeira é de R$ 1,248 trilhão. Neste valor, o governo incluiu R$ 18,1 bilhões para “absorção de outros riscos fiscais”, conforme apresentação em slide feita na semana passada pelo ministro interino do Planejamento, Dyogo Oliveira. Segundo explicação do ministro, os R$ 18,1 bilhões são o “resultado líquido” da receita com a repatriação de recursos que os brasileiros enviaram de forma ilegal para o exterior e o custo que a União terá com a renego- ciação das dívidas estaduais.

Esse procedimento contábil provocou duas distorções na programação orçamentária e financeira. A primeira é que a receita prevista no decreto para este ano está subestimada, pois não incluiu a arrecadação que o governo terá com a regularização do dinheiro dos brasileiros no exterior.

A segunda é que incluiu na relação das despesas discricionárias (aquelas que podem ser cortadas pelo governo) o tal “resultado líquido” de R$ 18,1 bilhões. Esse não é um gasto, pois o governo não vai ter despesa primária com a renegociação dos débitos estaduais. Com a moratória que o governo dará, o Tesouro vai deixar de receber, por algum tempo, os pagamentos feitos pelos Estados pela amortização e juros de suas dívidas. Essa é uma receita financeira do Tesouro e não entra no cálculo do resultado primário.

Ao suspender os pagamentos ao Tesouro, os Estados vão usar o dinheiro para cobrir outras despesas, o que reduzirá o resultado primário que terão neste ano. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) prevê que os Estados e municípios deverão fazer um superávit de R$ 6,5 bilhões em 2016. Com a renegociação das dívidas, esse superávit será revertido em um déficit primário perto de R$ 20 bilhões.

A LDO determina que o governo federal compense a frustração da meta dos Estados e municípios, o que será feito com os R$ 18,1 bilhões que a União reservou na sua programação. Na prática, a União absorverá a expansão dos gastos dos Estados.