Maria Silvia e Meirelles afinam discurso no BNDES

 

02/06/2016

Francisco Góes

Robson Sales

Eduardo Campos

 


O governo do presidente interino Michel Temer deixou claro ontem que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) terá recursos suficientes para financiamento, mesmo devolvendo R$ 40 bilhões ao Tesouro este ano. O recado foi dado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, na cerimônia em que a economista Maria Silvia Bastos Marques assumiu a presidência do banco. "Não faltarão recursos ao BNDES para crescer no futuro", disse Meirelles. O ministro compareceu ao evento, na sede do banco, no Rio, a pedido de Maria Silvia para mostrar que existe um alinhamento entre a Fazenda e o banco.

Em breve discurso, Meirelles afirmou que a devolução de recursos ao Tesouro pelo BNDES é parte de um processo de "bom uso do recurso público". Pelos próximos dois anos, o dinheiro que será devolvido ao Tesouro não será necessário para empréstimos pelo banco às companhias, indicou o ministro. "As projeções deixam claro que existem recursos que podem ser melhor utilizados a curto prazo na amortização da dívida pública que custa caro ao país. Mas isso não prejudica, pelo contrário. Ajuda a sanear as finanças públicas, a alterar a trajetória da dívida e a dar mais condições à economia de crescer e ao Tesouro de suportar o BNDES no futuro."

Maria Silva mostrou estar afinada com Meirelles. Em entrevista depois da cerimônia de transmissão do cargo, na qual foi aplaudida de pé por um auditório lotado por cerca de 400 pessoas, a nova presidente do BNDES afirmou: "[A devolução ao Tesouro] não reduz o potencial de empréstimo do BNDES. Ela afirmou que a devolução dos R$ 40 bilhões este ano será feita se houver segurança jurídica. "Haverá consulta aos órgãos jurídicos pelos ministérios do Planejamento e Fazenda. E [com a devolução] não há prejuízo ao banco."

Maria Silvia disse que, se daqui a dois anos o banco não tiver recursos suficientes para emprestar, vai se estar diante de um ótimo problema porque significará que demanda aumentou e a economia está retomando o crescimento. "Aí vamos tomar as atitudes necessárias, inclusive captar no mercado privado [se for necessário]."

Ela afirmou que o banco tem projeções de recebimentos dos desembolsos [empréstimos] que faz aos clientes. "Para 2016, com base nos dados do [primeiro] quadrimestre, e em índices como Basiléia, se chegou aos R$ 40 bilhões [de devolução ao Tesouro] que não impactaria [o banco]. Ela não quis fazer projeções sobre qual deve ser o desembolso do BNDES este ano, que ficará abaixo dos R$ 135,9 bilhões de 2015. Maria Silva afirmou que o importante é a diferença entre o que a instituição empresta e o que entra de pagamentos de financiamentos concedidos.

Ela também falou sobre a retomada das concessões. "É fundamental ter nova leva de concessões, de PPPs [parcerias público privadas] e até privatizações. É é importante ter um marco regulatório definido para que os investimentos deslanchem." No discurso no banco ela enfatizou: "O banco possui notória capacidade como gestor, executor e apoiador de processos de diversas formas de desmobilização de ativos, como os de concessões, parcerias público-privadas e privatizações." Ela anunciou que começou tratativas com o governador do Rio, Francisco Dornelles, para que o BNDES apoie um eventual processo de novas concessões de saneamento no Estado.

Pela manhã, em Brasília, Maria Silvia disse que vai "olhar tudo", repensar políticas, ratings e as posições em renda variável. Maria Silvia também anunciou que está criando uma diretoria de controladoria que vai concentrar as ações de compliance e gestão de risco. Outro ponto destacado por ela é o trabalho em conjunto com outras áreas do governo, diretriz que apareceu também na breve fala do presidente do Banco do Brasil, Paulo Caffarelli, e de outros membros da nova equipe econômica.

Questionada sobre a baixa transparência atribuída ao banco e também se faria uma devassa na instituição, Maria Silvia disse que trabalha com fatos. "Sou uma pessoa técnica, nem sei o que é fazer uma devassa, eu trabalho com controles e estou formando uma diretoria de controladoria que vai ter compliance e gestão de risco, tudo organizado", disse. Ela contou que participou, mesmo antes de assumir o banco, das discussões que levaram à decisão de devolver R$ 100 bilhões aportados no banco ao Tesouro Nacional. Desse montante, explicou a presidente, R$ 40 bilhões que serão devolvidos de imediato foram definidos como excesso de caixa para esse ano em comparação com a previsão de desembolsos e recebimentos. O restante do dinheiro será devolvido dentro dos próximos dois anos e também estão em linha com a expectativa de desembolsos.

De acordo com Maria Silvia, se o ciclo positivo da economia retomar, o banco pode, por exemplo, voltar a captar recursos privados. "O banco sempre captou recursos privados, mercado de capitais debêntures, captações externas. Quando fui diretora do banco há 20 anos, fazíamos captações no exterior", disse. Ela apontou ainda uma característica importante da nova gestão é o trabalho em equipe. A executiva conhece bem o presidente do BB e é "muito amiga" de Pedro Parente, novo presidente da Petrobras. "O ministro Meirelles nos dá suporte o tempo todo. Vamos trabalhar como uma equipe, com um objetivo comum, acho que isso vai facilitar muito para conseguir andar rápido e conseguir o que todos desejam que é a retomada da economia."

 

Valor econômico, v. 17, n. 4017, 02/06/2016. Especial, p. A14