O globo, n. 30289, 11/07/2016. País, p. 5

MP contesta mudanças em projeto de abuso de autoridade

Para associação de juízes, proposta visa a intimidar o Judiciário

Por: VINICIUS SASSINE

 

BRASÍLIA - Integrantes das equipes de investigação da Lava-Jato em Brasília identificam um problema central no projeto de lei sobre abuso de autoridade proposto pelo PRESIDENTE DO SENADORENAN CALHEIROS (PMDB-AL): a possibilidade de ações privadas subsidiárias num prazo de 15 dias, ou seja, a permissão para que ações sejam apresentadas por pessoas que alegarem ser vítimas de abuso de autoridade. Propor este tipo de ação, hoje, é uma competência do Ministério Público. O projeto de Renan permite as ações privadas caso o MP nada faça em 15 dias.

Renan é investigado em oito inquéritos da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, chegou a pedir a prisão preventiva do PRESIDENTE DO SENADO, por entender que ele atrapalhava as investigações no exercício do cargo. O ministro Teori Zavascki negou o pedido. Desde então, o senador vem dando sinais de confrontação com Janot. Primeiro, ameaçou aceitar um pedido de impeachment do procurador-geral. Depois, protocolou o projeto que trata de abuso de autoridade.

A especificação sobre ações privadas está nos parágrafos quinto e sexto do artigo 3º. "Será admitida ação privada subsidiária, a ser exercida se a ação pública não for intentada pelo Ministério Público no prazo de 15 dias", diz o texto.

"A ação privada subsidiária será exercida no prazo de seis meses". A proposta terá tramitação terminativa na Comissão de Consolidação da Legislação Federal e Regulamentação da Constituição. O colegiado foi criado por Renan e é presidido pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), também investigado na Lava-Jato. Jucá foi demitido do cargo de ministro do Planejamento do governo interino de Michel Temer por supostamente tentar atrapalhar a operação.

“A ação penal nos casos dos crimes ora tipificados é pública condicionada à representação do ofendido, sendo que, em caso do não ajuizamento da ação no prazo devido pela autoridade competente, conceder-se-á prazo para que o ofendido possa ajuizar a ação penal privada”; justificou Renan no projeto.

PRESIDENTE DO SENADO lembrou ainda "a possibilidade de o ofendido buscar as devidas reparações também nas esferas cível e administrativa”. Para um investigador da Lava-Jato que atua nos inquéritos no STF; os políticos querem, com o projeto, fazer “bullying judicial":

- Esta situação é muito parecida com o que fizeram na Itália (na Operação Mãos Limpas), em que se tentou criminalizar os investigadores.

A Associação dos Juízes Federais (Ajufe) sustentou em nota que o projeto de Renan “parece uma tentativa de intimidação de juízes, desembargadores e ministros do Judiciário na aplicação da lei penal em processos envolvendo criminosos poderosos”. O projeto, que tramitou na Câmara até 2009, prevê punição para servidores da administração pública e integrantes dos Poderes Legislativo, Judiciário e do MP.

O texto proíbe “o uso de algemas ou de outro objeto que tolha a locomoção" quando não houver “resistência à prisão”. O projeto também se propõe a evitar grampos sem autorização judicial.

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