O globo, n. 30286, 08/07/2016. Economia, p. 21

Um rombo de R$ 139 bi

Governo conta com reforço de R$ 55,4 bi nas receitas para cumprir meta fiscal de 2017

Por: MARTHA BECK, BÁRBARA NASCIMENTO, EDUARDO BARRETTO e CATARINA ALENCASTRO

 

O governo vai propor ao Congresso que a meta fiscal de 2017 seja fixada em um déficit primário de R$ 139 bilhões, ou 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Para chegar a esse rombo — bem inferior aos R$ 170,5 bilhões, ou 2,7% do PIB previstos para 2016 —, a equipe econômica espera conseguir um reforço de R$ 55,4 bilhões nas receitas. Esse montante viria tanto da recuperação da arrecadação com a retomada da economia quanto de concessões, outorgas e da venda de ativos. O governo, no entanto, não detalhou essas operações e indicou que, caso necessário, haverá aumento de impostos para fechar a conta.

Segundo o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, não seria adequado falar agora sobre quais são os ativos que a União quer vender e quais as concessões que estão incluídas na meta de 2017, pois ainda é preciso fazer estudos técnicos. Ele explicou também que cerca de R$ 25 bilhões do total de R$ 55,4 bilhões esperados para fechar a meta podem ser obtidos apenas se a arrecadação federal parar de cair.

Meirelles disse que a decisão de elevar a carga tributária será tomada até meados de agosto, quando o Orçamento será enviado ao Congresso. Nesse período, serão detalhadas as demais receitas com leilões de campos de petróleo, concessões de infraestrutura, venda de ativos e abertura de capital de empresas como o IRB e a Caixa Seguradora.

— Não descartamos aumentos pontuais de impostos. Até agosto, vamos definir o que será necessário e se será necessária a elevação de algum tributo, e qual seria o tributo mais favorável do ponto de vista de eficiência da atividade econômica. Não temos, no momento, a definição desse ponto, exatamente porque vamos explorar todas as alternativas de mercado de privatizações e outorgas — afirmou o ministro.

Na proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que será encaminhada, o governo projeta o crescimento do PIB em 1,2% e a inflação em 4,8%. O valor médio do salário mínimo subirá de R$ 880 para R$ 945,50. O rombo de R$ 139 bilhões é do governo central. Para as estatais, a equipe econômica projetou um déficit primário de R$ 3 bilhões, e para estados e municípios, um rombo de R$ 1 bilhão. Assim, o resultado do setor público consolidado foi estimado em R$ 143,1 bilhões, ou 2,1% do PIB.

Meirelles explicou que o governo fixou a nova meta tendo como objetivo um esforço de controle de despesas, considerando, portanto, a aprovação do teto para os gastos públicos (expansão limitada à inflação do ano anterior), e a geração de receitas adicionais. Segundo ele, sem essas ações, o déficit das contas poderia chegar a R$ 270 bilhões. O ministro disse ainda que, se fosse feito um esforço fiscal apenas aplicando o teto para os gastos, o rombo ficaria em R$ 194 bilhões. Ou seja, para melhorar o desempenho das contas públicas, foi preciso apostar na elevação de receitas.

— É um número que representa um compromisso muito forte, uma redução de despesas muito importante, apesar de aumento obrigatório do déficit da Previdência de mais de R$ 30 bilhões. Apesar de tudo isso, temos um esforço muito grande de contenção de despesas e também de aumento de receitas de formas diversas, desde arrecadação de tributos diversos até venda de ativos, outorgas e concessões — disse Meirelles.

 

VITÓRIA PARA MEIRELLES

O ministro garantiu que os estudos iniciais mostram que há segurança razoável de que o governo vai arrecadar os R$ 55,4 bilhões adicionais. Primeiramente, “começa uma reversão importante da tendência da receita da União”, na esteira da incipiente recuperação da atividade econômica. Ele argumentou que estudos preliminares sugerem preços atraentes para ativos e concessões federais, “partindo, evidentemente, do pressuposto político atual”, ressaltou o ministro, em clara referência ao cenário-base do mercado, de afastamento definitivo de Dilma Rousseff.

A meta de 2017 representa uma vitória para Meirelles, que queria mostrar ao mercado financeiro uma evolução do resultado primário em relação a este ano. A ala política do governo defendia um rombo entre R$ 150 bilhões e R$ 160 bilhões. Para o presidente interino, Michel Temer, Meirelles é o ativo mais importante do governo, e não interessava que o ministro saísse como derrotado nessa questão.

O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou que o governo “fará ginástica” para cumprir a meta. Entre as medidas adicionais de ajuste está a revisão de critérios para a concessão de benefícios como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, anunciada pouco antes. “Outras tantas virão”, salientou. Ele reforçou que medidas desagradáveis terão de ser tomadas pelo governo para garantir o esforço fiscal e a geração de receitas:

— O remédio amargo certamente virá, mas ele será tão menos amargo quanto melhor for a resposta da retomada da economia. Em agosto já teremos uma noção mais precisa disso e poderemos ver que o corte, que já passou da carne, chegou no osso, é de tanto.

Segundo Meirelles, deve haver outro déficit em 2018, mas o país já tem condições de registrar superávits primários (economia para pagamento de juros da dívida pública) em 2019. Isso porque, a partir do ano que vem, será revertida a trajetória de dez anos de aumento real (acima da inflação) dos gastos. A equipe econômica espera que o resultado primário do setor público fique positivo em 0,2% do PIB em 2019.

O déficit da Previdência subirá de 2,3% do PIB em 2016 para 2,7% do PIB em 2017. A dívida líquida do setor público foi estimada em 48,3% do PIB, e o endividamento bruto, em 76,6%.

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União recorre a medida provisória para pagar bancos

Recurso para liberar crédito teve aval do TCU, que condenara ação similar do governo Dilma

Por: Martha Beck

 

O governo editou, ontem, uma medida provisória (MP) com crédito extraordinário de R$ 1,2 bilhão, para pagar subsídios devidos ao BNDES e ao Banco do Brasil (no âmbito do Pronaf ) que não foram previstos no Orçamento de 2016. Segundo integrantes da equipe econômica, o repasse diz respeito a equalizações de taxas de juros referentes ao primeiro semestre deste ano e precisava ser feito no início de julho. Caso contrário, o governo poderia ser acusado de repetir as “pedaladas fiscais” (atrasos na transferência de recursos do Tesouro a bancos públicos) da presidente afastada, Dilma Rousseff, e de desrespeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

A edição da MP foi antecedida de uma consulta ao Tribunal de Contas da União (TCU). Ela foi apresentada na semana passada, junto com o pedido para que o TCU avaliasse se seria possível liberar recursos emergenciais para o Rio de Janeiro. O Tribunal, que numa primeira análise das contas de Dilma referentes a 2015 entendeu que uma MP não poderia ser usada para liberar crédito sem urgência, abriu uma exceção para o governo do presidente interino, Michel Temer.

 

ACERTO DE CONTAS SEMESTRAL

No entendimento do TCU, há um contexto excepcional que justifica o uso de MP, uma vez que Dilma foi afastada do cargo e houve uma alteração substancial da equipe econômica. Foi apontada ainda a imprevisibilidade da despesa, uma vez que o governo anterior não adotou as medidas necessárias para garantir os recursos a fim de honrar os desembolsos.

Depois que o TCU condenou a prática das “pedaladas fiscais” — um dos argumentos para o pedido de impeachment de Dilma —, o governo mudou a sistemática de pagamento de subsídios, a fim de agilizá-la. No caso do BNDES, foi eliminada uma carência de 24 meses que havia para que o Tesouro pagasse as subvenções. O acerto das contas passou a ser feito ao final de cada semestre de apuração.

Essa mudança, explicam os técnicos da equipe econômica, foi feita no fim de 2015, depois que o TCU condenou as “pedaladas” e depois de a Lei Orçamentária de 2016 ser encaminhada ao Congresso. Isso provocou um descasamento entre o que estava previsto na lei e o valor que precisa ser quitado agora. (Martha Beck)

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Governo endurece regras para auxílio-doença e aposentadoria por invalidez

Conjunto de medidas tem potencial para reduzir despesas públicas em R$ 7,1 bilhões por ano

 

Meirelles anuncia previsão de déficit e não descarta elevar impostos. Também foram divulgadas novas regras para auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, que poderão gerar economia de R$ 7,1 bilhões O governo anunciou ontem medidas com potencial de reduzir as despesas públicas em R$ 7,1 bilhões por ano. A mais impactante é uma medida provisória (MP) que torna mais rígidas as regras para a concessão do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez. Só essas mudanças têm impacto anual estimado em R$ 6,3 bilhões nos gastos. Entre as ações está, por exemplo, a fixação de um prazo de 120 dias para a suspensão automática do auxílio-doença que tenha sido concedido sem data para acabar. A regra vale inclusive para o benefício dado por meio de decisão judicial.

A ideia é passar um pente-fino nos benefícios concedidos há mais de dois anos, de forma a evitar gastos desnecessários com pessoas que já deveriam ter retornado ao trabalho, mas não o fizeram por falta de perícia. Segundo cálculos da equipe econômica, os benefícios concedidos há mais de dois anos custam, por mês, R$ 4,6 bilhões.

Para incentivar os médicos a realizarem perícias de forma rápida, o governo pagará um bônus de R$ 60 por perícias extras. A gratificação será temporária, por dois anos, e deve custar aos cofres públicos R$ 50 milhões. Segundo o governo, os segurados não precisam correr às agências do INSS para revisar benefícios. Quem recebe os recursos já tem uma data provável de suspensão do pagamento, e ela deve ser respeitada. Para quem não tem essa data, será feita uma convocação pelo próprio INSS.

O governo editará decreto que altera a forma de inscrição para beneficiários da Loas (Lei Orgânica de Assistência Social), que passaria a ser feita por meio do Cadastro Único. O governo espera reduzir as despesas em R$ 800 milhões por ano com a mudança. O governo vai enviar ao Congresso projeto de lei que permite aos servidores estaduais e municipais aderirem à Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), como parte do acordo com os estados para aliviar os caixas regionais. Com isso, aposentadorias que ultrapassam o teto do INSS passam a ser financiadas pela poupança dos servidores. Para aderir ao Funpresp, os estados teriam de realizar aporte de R$ 5 milhões a R$ 10 milhões como adiantamento de pagamentos futuros. (B.N., M.B., E.B. e C.A.)

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