Lava Jato apura propina de R$ 39 mi em obra do pré-sal 

Fausto Macedo, Julia Affonso e Ricardo Brandt

05/07/2016

 

 

Operação Abismo. Em sua 31ª fase, investigação aponta fraudes na licitação de centro de pesquisas da Petrobrás; segundo força-tarefa, desvios financiaram até escola de samba

A Operação Lava Jato avançou ontem sobre obras da Petrobrás relacionadas ao présal. A 31.ª fase da investigação mirou em um esquema de propina na licitação da construção do Centro de Pesquisas (Cenpes) da estatal, na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro.

Segundo a Procuradoria da República e a Polícia Federal, as ações criminosas envolveram diversas empresas e os desvios financiaram até uma escola de samba, um blog e familiares do ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira – principal alvo da Operação Abismo.

Conforme as investigações, o consórcio formado para realizar as obras, o Novo Cenpes, pagou R$ 39 milhões em propinas para a construtora WTorre – suspeita de receber R$ 18 milhões para desistir do certame –, para a Diretoria de Serviços da estatal e para o PT.

Ferreira já havia sido preso provisoriamente semana passada na Operação Custo Brasil, que mirou no ex-ministro petista Paulo Bernardo. A ação teve como base delações premiadas, principalmente do ex-vereador do PT em Americana (SP) Alexandre Romano, o Chambinho.

Segundo a força-tarefa, o ex-tesoureiro “teria recebido valores na condição de agente do Partido dos Trabalhadores”.

Com base também em delação do ex-gerente da Petrobrás Pedro Barusco, a força-tarefa constatou que R$ 16 milhões foram para a Diretoria de Serviços da estatal, sendo que metade deste total foi para o PT. Ferreira ficou com R$ 1 milhão e o restante da propina (R$ 4 milhões) foi dividido entre Barusco e Renato Duque, ex-diretor de Serviços. A investigação apura corrupção, lavagem de dinheiro e fraude a licitação.

Desde 2015, a Lava Jato investiga negócios da Petrobrás relativos ao pré-sal, campos de petróleo descobertos em 2007. As frentes apuram cartel e propina em contratos de estaleiros para construção de plataformas e navios- sonda, em especial via empresa Sete Brasil. São negócios que, diz a força-tarefa, beneficiaram PT e PMDB.

Elos. Para os investigadores, a Abismo tem conexão com outros esquemas de corrupção alvo do Ministério Público Federal, Polícia Federal e Receita Federal nos últimos dias: Turbulência, Custo Brasil, Saqueador e Tabela Periódica.

“Fica muito claro a partir dessas cinco operações todo o grande potencial de desarticulação de grandes organizações criminosas por meio de acordos de colaboração e acordos de leniência”, disse o procurador Roberson Pozzobon, para quem “agentes políticos estão no topo da cadeia alimentar dessas propinas”. “O povo não suporta mais flertar com o crime político e a impunidade.” O juiz federal Sérgio Moro apontou no despacho em que autorizou a Operação Abismo que “a corrupção sistêmica” no Brasil “é produto de uma prática criminosa serial e não um ato isolado no tempo e espaço”.

Outra delação que embasou a Abismo foi a do empresário Ricardo Pernambuco, sócio da Carioca Engenharia. Ele listou quatro obras da Petrobrás em que houve “cobrança de vantagens indevidas”, entre elas a do Cenpes – na qual a Carioca, com participação de 20%, estava consorciada com outras quatro empresas, Construcap, Schahin, Construbase e OAS. Roberto Ribeiro Capobianco, sócio da Construcap CCPS Engenharia e Comércio, foi preso temporariamente na operação de ontem.

Segundo Pernambuco, a cobrança de propina nas obras era feita pelo lobista Mário Góes. O delator disse que Góes afirmava agir em nome de Pedro Barusco e Renato Duque.

No despacho, Moro defendeu as prisões cautelares na Lava Jato e rebateu o que chamou de críticas pontuais às medidas.

“O fato é que, se a corrupção é sistêmica e profunda, impõe-se a prisão preventiva para debelála, sob pena de agravamento progressivo do quadro criminoso”, afirmou. 

CONEXÕES

● A Lava Jato, que chegou à 31ª fase (Abismo) ontem, tem alvos em comum com pelo menos outras quatro operações recentes

Operação Abismo

DEFLAGRADA ONTEM

Apura fraudes de R$ 39 milhões em licitações das obras do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento (Cenpes) da Petrobrás, no Rio. Segundo a força-tarefa, além de combinações no certame, houve pagamento de propina na Diretoria de Serviços da estatal e ao PT. Investigações apontam que o ex-vereador do PT Alexandre Romano, o Chambinho, intermediou propinas para o ex-tesoureiro petista Paulo Ferreira

CITAÇÃO

NA ABISMO/ LAVA JATO

OAS LIDEROU O CONSÓRCIO NOVO CENPES. PAGOU, SEGUNDO DELATOR, R$ 18 MILHÕES PARA A WTORRE DESISTIR DA OBRA

ALVOS

Léo Pinheiro - EX-DIRETOR DA OAS

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

EMPRESA DE PAULO MORATO, ALVO DA TURBULÊNCIA ACHADO MORTO, ERA LIGADA A EMPRESA FANTASMA QUE RECEBEU R$ 19 MILHÕES DA OAS

NA ABISMO/ LAVA JATO

ALVO CENTRAL DA LAVA JATO, DOLEIRO JÁ FOI CONDENADO PELO JUIZ SÉRGIO MORO COMO OPERADOR DE PROPINAS DO ESQUEMA NA PETROBRÁS

ALVOS

Alberto Youssef - DOLEIRO

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

UM DOS PRESOS NA OPERAÇÃO TEM LIGAÇÃO COM UMA EMPRESA QUE RECEBEU DINHEIRO DO ESQUEMA DE LAVAGEM OPERADO PELO DOLEIRO

NA ABISMO/ LAVA JATO

EX-TESOUREIRO FOI ALVO DE MANDADO DE PRISÃO PREVENTIVA ONTEM, NA ABISMO. ELE, NO ENTANTO, FOI PRESO NA CUSTO BRASIL

ALVOS

Paulo Ferreira - EX-TESOUREIRO DO PT

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

FOI DETIDO DURANTE A CUSTO BRASIL, QUE MIROU EM FRAUDES ENVOLVENDO  EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS DE SERVIDORES

NA ABISMO/ LAVA JATO

INVESTIGAÇÕES APONTAM QUE ROMANO INTERMEDIOU PROPINAS SOBRE OBRAS DO CENPES PARA O EX-TESOUREIRO DO PT PAULO FERREIRA

ALVOS

Alexandre Romano - EX-VEREADOR DO PT

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

DELAÇÃO DE ROMANO CITOU OS NOMES DE FERREIRA E DE OUTRO EX-TESOUREIRO PETISTA, JOÃO VACCARI NETO, NO ESQUEMA NO PLANEJAMENTO

NA ABISMO/ LAVA JATO

ROMANO AFIRMOU QUE COMPROU UM CARRO DA MULHER DE VACCARI PARA PAULO FERREIRA. O VALOR DO CARRO SERIA REFERENTE A PROPINA

ALVOS

João Vaccari Neto EX-TESOUREIRO DO PT

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

ALÉM DE PAULO FERREIRA, VACCARI TAMBÉM FOI ALVO DE MANDADO DE PRISÃO DA CUSTO BRASIL. ELE ESTÁ PRESO DESDE 2015

NA ABISMO/ LAVA JATO

APONTADO COMO OPERADOR NO ESQUEMA ALVO DA LAVA JATO, FOI CONDENADO A 9 ANOS DE PRISÃO POR LAVAGEM E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA

ALVOS

Adir Assad - DOLEIRO, APONTADO COMO DONO DE EMPRESAS DE FACHADA

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

DOLEIRO FOI ALVO DE MANDADO DE PRISÃO NA OPERAÇÃO, APONTADO COMO DONO DE EMPRESA DE FACHADA USADA NO ESQUEMA DE LAVAGEM

NA ABISMO/ LAVA JATO

EX-EXECUTIVO DA CAMARGO CORRÊA FOI CONDENADO PELO JUIZ SÉRGIO MORO A 9 ANOS E 6 MESES DE PRISÃO

ALVOS

João Ricardo Auler EX-PRESIDENTE DO CONSELHO DA CAMARGO CORRÊA

CITAÇÃO EM OUTRAS OPERAÇÕES

DELATOR DA LAVA JATO, AULER RELATOU FORMAÇÃO DE CARTEL EM LICITAÇÕES COM A VALEC E PAGAMENTO DE PROPINA NA ESTATAL

OUTRAS OPERAÇÕES

Turbulência

21 DE JUNHO

Investiga a ligação entre o avião que caiu com o então candidato à Presidência Eduardo Campos, em 2014, em Santos (SP), e uma organização especializada em lavagem de dinheiro, que teria movimentado mais de R$ 600 milhões

Custo Brasil

23 DE JUNHO

Apura o pagamento de cerca de R$ 100 milhões em propina referente a contratos de prestação de serviços de informática, entre 2010 e 2015, a funcionários e agentes públicos ligados ao Ministério do Planejamento

Saqueador

30 DE JUNHO

Investiga esquema de lavagem de dinheiro que teria movimentado R$ 370 milhões; empreiteira Delta é apontada como a responsável por chefiar o esquema. Carlinhos Cachoeira também é alvo

Tabela Periódica

30 DE JUNHO

Investiga fraudes nas licitações da Ferrovia Norte-Sul e da Ligação Leste-Oeste. Segundo apurações, foram constatados cartel, lavagem de dinheiro e corrupção em contratos com a Valec Engenharia.