DELATOR DO MENSALÃO E FAMA DE SER ‘EXPLOSIVO’

 
02/07/2016
Josette Goulart
Alexa Salomão

 

O corretor Lúcio Bolonha Funaro ficou conhecido há alguns anos como o delator do mensalão. Lá atrás, quando a delação não era usual, ele já tinha falado. A sua prisão agora acionou o tique-taque do que parece ser uma bombarelógio de revelações capaz de respingar em muita gente.

As relações de Funaro não são poucas. Ele é apontado não só como operador de Eduardo Cunha, mas de todo o PMDB. Teria sido não apenas intermediário de esquemas de empréstimos na Caixa por meio do FI-FGTS, fundo mantido com recursos do FGTS, mas participado da organização do esquema de cobrança de propina com o fundo, segundo conta o ex-vicepresidente da Caixa, Fábio Cleto, em sua delação.

O advogado de Funaro, Daniel Gerber, diz que não teve acesso aos autos do processo de prisão, mas alega a inocência de seu cliente Segundo ele, o contador teria dados para desmontar as acuações.

Gerber também nega que haja qualquer acordo prévio ou negociação para uma delação de Funaro com a Procuradoria-Geral da República. Mas o próprio advogado não descarta a possibilidade.

Em entrevista ao Estado, precavido, declarou: “De antemão, peço desculpas para o caso de mudar de posição daqui a uma semana”.

Funaro foi preso ontem, mas já na segunda-feira falava a interlocutores da possibilidade de a Polícia Federal bater à sua porta.

Dava sinais, segundo pessoas próximas, de que a depender do curso dos acontecimentos poderia repetir a receita do passado e fazer uma delação. O corretor é conhecido por seu temperamento explosivo.

Mensalão. Em meados dos anos 2000, investigações identificaram que Funaro foi destinatário de um cheque da SMPB – então empresa de Marcos Valério – e levado ao processo do mensalão.

A sua delação ajudou a desmantelar o núcleo financeiro do esquema. Em entrevista ao Estado em 2014, disse que fez um empréstimo com Valdemar Costa Neto, um dos condenados no caso, a pedido de um acionista de um grande banco. Costa Neto o teria pago com um cheque administrativo da SMPB. Ressaltou que pediu ao ex-deputado que resolvesse a situação. “Ele não resolveu. Eu resolvi.” Seu acordo de delação previa que não voltasse a cometer crimes.

Na época, ficou conhecido como doleiro, mas afirma que nunca prestou esse tipo de serviço.

Chegou ao ponto de processar jornalistas que lhe atribuíram a função. Funaro diz que era um corretor. Apostava alto na bolsa de valores e fez dinheiro no mercado, atividade que perdeu espaço depois do mensalão.

Seu caso mais rumoroso foi a briga com a família Schahin.

O rompimento de uma barragem, em Rondônia, que estava sob a responsabilidade dos Schahin e deu prejuízos a Funaro, iniciou o atrito.

Em sua delação na Lava Jato, Salim Schahin chegou a acusar o corretor de ter usado o Congresso, por meio de Cunha, para provocar uma CPI em busca de irregularidades do grupo em contratos com a Petrobrás. As irregularidades dos Schahin apareceram na Lava Jato.

Funaro sempre tentou negar publicamente sua relação com Cunha. Mas delatores foram estabelecendo a conexão.

Julio Camargo, ligado à Toyo Setal, por exemplo, apresentou tabela em que Funaro aparece como passageiro de voos fretados que estavam na cota do peemedebista. Empresas de Funaro também foram apontadas como responsáveis pela compra de carros de uso pessoal do deputado afastado.

Funaro foi um dos poucos convidados a fazer parte de almoço em homenagem à eleição de Cunha à presidência da Câmara na casa de Naji Nahas, em fevereiro de 2015.

No seleto grupo estava João Alves Queiroz Filho, o empresário dono da Hypermarcas, conhecido como Júnior.

Uma foto de Júnior com Funaro durante esse almoço circulou esta semana após reportagem do Estado revelar que o corretor havia sido citado em denúncia feita pelo ex-diretor da Hypermarcas Nelson Mello. O executivo diz que Funaro seria um dos intermediários, ao lado do empresário Milton Lyra, de pagar propinas a senadores do PMDB. Mello declarou que fazia tudo sozinho, sem o conhecimento da empresa. Lyra e Funaro negam a acusação.

 

O Estado de São Paulo, n. 44818, 02/07/2016. Política, p. A5