Delator diz que Cunha ficava com 80% das comissões

 

02/07/2016

Fábio Fabrini
Fabio Serapião

 

O ex-vice presidente da Caixa Econômica Federal Fábio Cleto detalhou nos depoimentos à Procuradoria-Geral da República como eram divididas as supostas propinas cobradas de grandes empresas em troca de aportes de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), gerido pelo banco.

Ele disse aos investigadores da Operação Lava Jato que o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ficava com 80% das comissões. O restante era rateado entre os demais envolvidos, incluindo o próprio delator.

Trechos da delação de Cleto foram antecipados ontem pelo estadão.com.br. O colaborador foi vice-presidente do banco de 2011 até dezembro passado, indicado ao cargo por Cunha.

O delator contou que, após nomeado nas funções, tinha reuniões semanais com o peemedebista, em Brasília, para informar quais grupos buscavam apoio do banco e definir quais seriam os alvos de achaque. Esses encontros eram todas as terças- feiras, por volta das 7h30, primeiro no apartamento funcional do deputado. Depois que ele assumiu a o comando da Câmara, teriam passado a ocorrer na residência oficial do presidente da Casa, no Lago Sul. Para confirmar os encontros, ele indicou à PGR o nome do motorista da Caixa que o levava.

Cleto explicou que, ao tomar conhecimento do valor dos projetos, Cunha apontava quais aportes lhe interessavam e pedia que o vice-presidente da Caixa trabalhasse para viabilizar a aprovação. Nos demais casos, a ordem seria para “melar” as operações.

“Os contatos de Fábio Cleto com as empresas eram estritamente técnicos e não havia abertura para falar de propina. Cabia ao lobista Lúcio Bolonha Funaro, preso ontem na Operação Lava Jato Funaro, e Cunha solicitar e receber vantagem indevida. A divisão dessa tarefa entre Cunha e Funaro dependia da relação com a empresa: o mais próximo solicitava e recebia a propina”, sustentou a PGR perante o Supremo, com base na delação.

O rateio do restante das propinas, segundo as investigações, era feito da seguinte forma: 12% para Funaro, 4% para Alexandre Margotto, apontado como parceiro de negócios de Funaro, e 4% para Cleto.

Conforme o relato de fonte com acesso às investigações, Cleto se comprometeu a devolver R$ 5 milhões que recebeu em propinas.

Ele contou que sua parcela no esquema de corrupção era depositada em contas abertas em nome de offshores, primeiro na Suíça e depois no Uruguai.

Os repasses a Cleto no exterior eram feitos pela Carioca Engenharia, em acordo supostamente feito com Cunha. Executivos da empreiteira já confessaram, em colaborações com a Lava Jato, pagamento de suborno ao peemedebista pela liberação de dinheiro para as obras do Porto Maravilha, no Rio. “As contas foram indicadas por Cleto a Cunha, o qual, conforme destacado, assumira o compromisso de pagar a dívida com Cleto”, afirma a PGR.

Cleto declarou que, na maioria dos casos, Cunha cobrava cerca de 1% do valor a ser repassado às empresas pelo FGTS. Ele informou, no entanto, acreditar que, na prática, “o valor cobrado era maior, para que a divisão fosse mais favorável a Cunha e a Funaro”.

O presidente afastado da Câmara também teria obtido comissão de 1% pela emissão de R$ 250 milhões em debêntures pelo FGTS, pleiteada pela OAS para obras. A OAS não comentou. A Carioca explicou que “está colaborando com as autoridades” e que “não vai se pronunciar sobre fatos específicos.”

 

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Caixa apura aportes para empresas citadas

 

02/07/2016
Murilo Rodrigues Alves

 

A Caixa Econômica Federal abriu sindicância para apurar aportes de R$ 4,2 bilhões feitos com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) a empresas citadas na delação de Fábio Cleto, ex-vicepresidente do banco.

Por meio do fundo de investimento que usa parte da poupança dos trabalhadores para investir em infraestrutura, foram desembolsados R$ 3,2 bilhões em sete operações de financiamento ou participação societária.

A operação de maior valor foi da Eldorado Brasil, que conseguiu R$ 940 milhões para uma fábrica em Três Lagoas, em Mato Grosso. A empresa é do grupo J&F, que também controla a Friboi.

Outro aporte que está sendo investigado é o de R$ 750 milhões à Prumo Logística Global, ex-LLX, que foi vendida por Eike Batista para a americana EIG. Também estão na lista investimentos às companhias Cone (R$ 500 milhões), Brado (R$ 400 milhões), OAS (R$ 250 milhões), ViaRondon (R$ 300 milhões) e Saneatins (via Odebrecht Ambiental, R$ 81 milhões).

Cleto disse também que a propina era cobrada até mesmo de projetos que já tinham sido aprovados pelo comitê. Um membro do comitê de investimento que decide os aportes do fundo não tem poder de sozinho aprovar a injeção de recursos em um projeto, mas podia atrasar os desembolsos com pedidos de vista. A regra mudou em 2015.

Responsável pela gestão do fundo, o vice-presidente de Ativos de Terceiros da Caixa, Marcos Vasconcelos, afirmou que todas as operações só foram aprovadas depois de uma análise criteriosa que envolve uma centena de profissionais do banco estatal e de fora dele. “Estamos avaliando um eventual dano à imagem do dano. Até o momento não houve qualquer prejuízo direto ao FI-FGTS, mas é evidente que um episódio como esse coloca em dúvida todo o processo.”

 

O Estado de São Paulo, n. 44818, 02/07/2016. Política, p. A7