Parlamentar defende fim dos imóveis funcionais

 

31/07/2016
Luiz Maklouf Carvalho

 

“Sou contra o apartamento funcional”, disse o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em entrevista ao Estado na semana passada. São imóveis cedidos para cada deputado que não more em Brasília.

Segundo o transparente site da Casa, são 432 residências, a maioria apartamentos de quatro quartos nas superquadras Sul e Norte do Plano Piloto.

“Isso vem desde a criação de Brasília, quando não tinha estrutura para atender à necessidade de moradia”, afirmou. “É muito imóvel, com um grande custo de manutenção, o que hoje não tem mais sentido”, disse.

“É melhor vender tudo, quando o mercado estiver aquecido. Para a Câmara, seria mais produtivo se cada deputado, incorporando ou não o auxílio- moradia (R$ 4.253), pudesse se virar, alugando um apartamento ou morando em hotel.” É o caso de Maia, que sempre morou em hotel, do primeiro a este quinto mandato. Agora, como presidente, passará a morar na casa presidencial de 800 m² e até 42 funcionários à disposição.

Maia não concordou que o auxílio-moradia também deveria ser extinto.

A Casa que o deputado preside, também chamada de Câmara Baixa, tem 513 deputados e 173 mil m² de área construída – só de salas são 3,6 mil –, onde transitam, em média, estimadas 18 mil pessoas por dia. O orçamento, para este ano, é de R$ 5.275.769.027 – R$ 1,5 bilhão vai para a previdência e R$ 3,7 bilhões para a atuação legislativa.

O pessoal da ativa leva R$ 2,5 bilhões. Somando todos, deputados à parte, é um exército de 18.782 funcionários – 3.258 concursados, 1.571 em cargos de natureza especial, 3.181 terceirizados e 10.772 secretários parlamentares.

São os assessores das excelências – que os podem ter entre cinco e 25 deles, cada um. Na média, são 21 por deputado.

Não é um exagero?, perguntese ao presidente que está chegando no pedaço. Primeiro ele fica arriçado: “Do seu ponto de vista, talvez fosse importante não ter nem a Câmara dos Deputados”.

Depois contemporiza: “A vida de um deputado é muito mais difícil do que as pessoas imaginam”. E, por último, acaba concordando que a estrutura atual não é a melhor: “Devia ser uma estrutura parecida com a americana: cada um recebe um orçamento mensal, exerce o mandato da forma que acha mais legítima e depois presta contas. Se a auditoria detectar problemas, ele vai ser pego e perde o mandato rapidamente.

O nosso problema é que são muitas estruturas constituídas e as pessoas não têm coragem de enfrentar os problemas”.

O mais grave desses problemas, aponta, é a verba indenizatória – auxílio-moradia, passagens de avião, aluguel de veículos, entre muitos outros itens – que, na prática, dá aos deputados um outro salário, além dos R$ 33,7 mil brutos que cada um já ganha. “Eu tenho a convicção de que isso (verba indenizatória) deveria ser tratado de uma outra forma”, disse Maia, cutucando o vespeiro da corporação parlamentar que passou a presidir.

“Não tem sentido ter uma estrutura para a prestação de contas de 5 a 6 mil notas fiscais por mês, como acontece.” A verba indenizatória, explicou, foi um casuísmo para substituir o aumento salarial. “Era melhor ter aumentado, o custo seria menor”, afirmou.

 

Alegria. Aos 46 anos, Rodrigo Felinto Ibarra Epitácio Maia, nascido em Santiago do Chile, gêmeo de Daniela Dalila, está vivendo, além da adrenalina do novo poder, a alegria do quarto filho. Rodriguinho, como o chama, está com 8 meses e robustos 4 quilos. Maia pode ajudar em uma troca de fralda, se o resíduo for líquido. Sólido ou pastoso, eca! “Xixi eu tiro de letra, mas cocô eu vomito, passo mal”, contou.

É também por causa do caçula que dona Patrícia Vasconcelos, empresária e enteada do ministro Moreira Franco, do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República, não se mudará de mala e cuia para a mansão que o marido passará a desfrutar, entre outras regalias a que tem direito na nova função. Tem também Maria Antônia, de 10 anos, que está na escola. “Por tão pouco tempo não vale a pena mudar”, disse o deputado.

Seu mandato acaba em fevereiro, sem direito à reeleição.

Os dois filhos foram a resposta do casal a um cartaz nazista no protesto que atrapalhou a luxuosa cerimônia de casamento, em setembro de 2005, na Igreja São Francisco de Paula.

“Não procriem”, dizia. “Pois é”, comenta Maia. Ele tem duas outras filhas de um primeiro casamento – Ana Luiza, de 21 anos, e Beatriz, de 19, há muito morando com os avós paternos, o exprefeito e vereador Cesar Maia (DEM-RJ) e a chilena-brasileira dona Mariangeles.

Maia nasceu chileno – daí o nome de toureiro espanhol – porque Cesar Maia, então de esquerda, e brizolista, lá se refugiou da ditadura pós-Ato Institucional n.º 5, o famigerado. Rodrigo e Daniela Dalila já tinham 3 anos quando a família voltou para o Rio, em 1973, egressa de Portugal, para onde os ventos que derrubaram (e mataram) Salvador Allende a levou. A infância foi feliz, com muita convivência com os avós paternos e muita atividade esportiva.

Praticou remo a sério no Botafogo, seu time, e foi algumas vezes gandula, pagando aos meninos carentes oficialmente escalados para a função.

 

Política. O deputado não se importará ao comentário “nasceu na esquerda e debandou para a direita”. Até pelo contrário.

“Sou da direita mesmo – e nada como este momento histórico que o Brasil está passando para mostrar que eu estou do lado certo”, disse.

No começo, a política não o atraiu. Começou pela bancada do capital financeiro. Primeiro, o banco BMG (1990-1993), depois o banco Icatu (1993-1996) – mais tarde contribuintes de algumas campanhas –, onde aprendeu, especializou-se na área e ganhou algum dinheiro.

Em 1995, Cesar Maia prefeito, a polícia descobriu que o trajeto cotidiano do funcionário do Icatu tinha sido mapeado por bandidos. O receio de um possível sequestro levou o banco a transferi-lo para Nova York. Passou um ano.

Na volta, não muito satisfeito com a área em que passou a atuar, foi puxar remo na campanha de Luiz Paulo Conde (1934- 2015) à sucessão de seu pai.

“Meu pai foi contra, minha mãe é que me incentivou”, disse. Já tinha abandonado, no segundo ano, a faculdade de Economia que tentava levar. Nunca mais tentou de novo. Conde o fez secretário de governo – e o ajudou a se eleger para o primeiro mandato de deputado federal, em 1998, com 96.385 votos.

Está em seu quinto mandato consecutivo. Destacou-se em Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) como a do Banestado e dos Correios. Neste último caso, origem do chamado mensalão, foi o autor do requerimento que convocou à Câmara o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu para explicar o primeiro escândalo envolvendo o PT, no primeiro governo Luiz Inácio Lula da Silva, o caso Waldomiro Diniz.

Antipetista desde sempre – sem prejuízo de boas relações pessoais –, Maia afobou-se, em 2005, ao divulgar na imprensa, sem checagem, uma lista errada de possíveis sacadores do Banco Rural do Brasília Shopping.

Entre os injustamente citados estava o então advogado e deputado petista Sigmaringa Seixas, com quem tinha bom trânsito. Seixas foi um dos prejudicados que pediu a cassação de seu mandato. Outros o levaram ao Conselho de Ética.

Maia desculpou-se e os pedidos foram arquivados. “Eu divulguei, porque achei que a imprensa ia checar”, afirmou.

“Foi ingenuidade minha”, disse, para quem quiser acreditar.

Durante o terceiro mandato, em 2009, Maia teve um escândalo para chamar de seu – a chamada “farra das passagens”. Foi denunciado entre os deputados que levaram parentes e aderentes para passear no exterior com o dinheiro da Câmara dos Deputados.

No primeiro passeio, levou dona Patrícia, a filha e mais uma prima para Nova York. No segundo, levou a mulher para Paris. “Estava errado, mas, na época, havia uma cultura de que se podia usar passagens para parentes. Na vida, a gente tem o direito de errar”, disse. A farra das passagens – da qual só as de uma companhia vieram à luz, imagine-se o resto – acabou em pizza. Serviu, de lá para cá, para que os critérios ficassem mais rígidos e o uso ficasse limitado aos deputados federais.

Um outro mau momento na trajetória política do parlamentar foi sua candidatura a prefeito do Rio, em 2012. Sua vice foi Clarissa Garotinho (PR) – filha de Anthony Garotinho, rival político de Cesar Maia. “Meu pai sempre foi contra, mas eu acreditei que podia somar o que tinha de votos nos dois segmentos; o que consegui, na verdade, foi somar as rejeições”, afirmou. Eduardo Paes (PMDB) foi reeleito com 64,6% dos votos. Maia e Clarissa amargaram 2,94%.

“Foi um erro exclusivamente meu, mas faz parte do jogo”, acrescentou. Hoje, divergindo do pai vereador, o presidente da Câmara está aliado a Paes. Já terçaram armas, e como desde os tempos em que o prefeito Cesar Maia encantou- se com Paes e o fez crescer politicamente. Maia explica a aliança de hoje – que também significa apoiar à prefeitura o candidato de Paes, Pedro Paulo, o que bateu na mulher – a um esperado crescimento do DEM no Rio.

 

Mea culpa

“Sou da direita mesmo – e nada como este momento histórico que o Brasil está passando para mostrar que eu estou do lado certo.”

 

“Estava errado, mas, na época, havia uma cultura de que se podia usar passagens (pagas pela Câmara) para parentes. Na vida, a gente tem o direito de errar.”

Rodrigo Maia

PRESIDENTE DA CÂMARA

 

O Estado de São Paulo, n. 44847, 31/07/2016. Política, p. A6