Lula vira réu por tentar obstruir a Lava Jato

Gustavo Aguiar e Fábio Fabrini

30/07/2016

 

 

 

A Justiça Federal em Brasília aceitou denúncia contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senador cassado Delcídio Amaral (sem partido- MS), o banqueiro André Esteves, o pecuarista José Carlos Bumlai e mais três pessoas acusadas de tentar obstruir as investigações da Operação Lava Jato.

É a primeira vez que Lula vira réu em um caso ligado à operação. A acusação se refere à tentativa de evitar a delação premiada do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró mediante pagamento em dinheiro e apoio para fuga do País. O crime de impedir ou embaraçar investigação criminal pode resultar em pena de até oito anos de prisão.

Os outros réus são Diogo Ferreira, ex-assessor de Delcídio, o filho de Bumlai, Maurício, e o advogado de Cerveró à época, Edson Ribeiro. Contra Ribeiro também pesa a acusação de patrocínio infiel (crime cometido por advogado quando trai a confiança do cliente), punível com até três anos de prisão. Esteves, Ferreira e Delcídio também responderão por essa acusação e por exploração de prestígio – por insinuar influência sobre ministros do Supremo Tribunal Federal para obter decisões favoráveis. A pena pode chegar a cinco anos de prisão.

A denúncia foi aceita pelo juiz substituto da 10.ª Vara Federal do Distrito Federal, Ricardo Leite, que também decidiu suspender o sigilo do caso.

Conforme a acusação, a operação para “comprar o silêncio de Cerveró” se deu entre 11 de abril e 25 de setembro de 2015. O ex-presidente, Bumlai e o filho dele teriam viabilizado o pagamento de R$ 250 mil à família do ex-diretor. O objetivo seria evitar que, em delação premiada, ele os envolvesse no esquema de corrupção na estatal.

Para fazer os pagamentos, os três teriam usado Delcídio, Ferreira e Ribeiro como intermediários. A denúncia se baseia nas colaborações de Delcídio e de Ferreira. Em depoimentos à Lava Jato, o senador cassado afirmou ter combinado com Lula as estratégias para bancar despesas de Cerveró. Essas tratativas teriam ocorrido em inúmeras reuniões entre o então parlamentar, que era líder do governo petista, e o ex-presidente.

‘Papel central’. A denúncia foi oferecida pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em maio. Estava inicialmente sob a condução do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF, mas foi remetida para a primeira instância após Delcídio perder o foro privilegiado. Semana passada, o procurador da República em Brasília Ivan Cláudio Marx reiterou a acusação criminal à Justiça.

Segundo Janot, foi possível constatar que o ex-presidente cumpriu “papel central” na trama para tentar comprar o silêncio de Cerveró e “embaraçar” as investigações da Lava Jato.

A Procuradoria-Geral da República relacionou documentos que comprovam encontros e inúmeros telefonemas entre Lula e os outros acusados. Os contatos ocorreram no mesmo período em que, segundo os investigadores, eram programados os pagamentos a Cerveró.

Conforme a Procuradoria, Lula tinha consciência de que uma eventual delação do ex-diretor poderia relacionar seu nome a esquema para que o PT obtivesse R$ 12 milhões, por meio de um empréstimo fictício feito por Bumlai no Banco Schahin. Como forma de quitar a dívida de Bumlai, o Grupo Schahin teria sido contratado, de forma fraudulenta, para operar um navio- sonda da Petrobrás.

As defesas terão 20 dias para apresentar resposta à acusação. Uma eventual prisão de Lula ou dos outros réus só poderá ocorrer se houver condenação em primeira instância e ela for confirmada por instância superior.

A defesa do ex-presidente tentou impedir que a denúncia contra ele fosse analisada pelo juiz Ricardo Leite. O caso chegou a ser conduzido à redistribuição livre, mas, no sorteio, acabou indo parar novamente nas mãos do magistrado.

Leite atuou na Operação Zelotes como juiz substituto. Na época, ele acusou o Ministério Público do DF de agir para poupar o PT nas investigações.

CRONOLOGIA

- 29 de abril

‘Mesada’ Delcídio reafirma, no Conselho de Ética do Senado, que a família de Cerveró recebeu, “por interferência do ex-presidente Lula”, R$ 250 mil de Bumlai (foto).

- 24 de junho

Justiça de Brasília Ministro do STF Teori Zavascki (foto) contraria Janot e envia denúncia à Justiça de Brasília. Para Teori, o caso não tem conexão direta com a Lava Jato.

- 25 de novembro de 2015

Delcídio Amaral é preso Senador é detido após ser gravado tentando obstruir a Lava Jato – Delcídio (foto) queria evitar a delação do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró.

- 3 de março de 2016

Delator cita Lula Em delação, Delcídio diz que partiu de Lula a ordem para ele tentar convencer Cerveró a não implicar José Carlos Bumlai numa eventual colaboração.

- 3 de maio

Denúncia no Supremo Procuradoria denuncia Lula por tentar obstruir a Lava Jato; com a cassação de Delcídio, também acusado, Rodrigo Janot pede o envio da denúncia a Sérgio Moro.

- 21 de julho

Denúncia ratificada Ministério Público no Distrito Federal reitera a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República contra Lula, Delcídio e mais cinco pessoas.

- Ontem

Réu Justiça Federal em Brasília aceita a denúncia – Lula e mais seis viram réus acusados de tentar comprar o silêncio de Cerveró e “embaraçar” as investigações.